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Ricardo Rabelo

Ricardo Rabelo é economista e militante pelo socialismo. Graduado em Ciência Econômicas pela UFMG (1975), também possui especialização em Informática na Educação pela PUC – MINAS (1996). Além disso, possui mestrado em sociologia pela FAFICH UFMG (1983) e doutorado em Comunicação pela UFRJ (2002). Entre 1986 e 2019, foi professor titular de Economia da PUC – MINAS. Foi membro de Corpo Editorial da Revista Economia & Gestão PUC – MINAS.

Coluna

Indonésia: fraude elege ex-carrasco da ditadura Suharto

"A fraude eleitoral foi o ponto culminante de um processo de consolidação do controle total pelas forças burguesas e do imperialismo"

Como analisamos em artigo anterior sobre as eleições na Indonésia em 14 de fevereiro, a sucessão do grande líder popular Jokowi, foi marcada por vários fatores que apontavam a possibilidade de fraude eleitoral em andamento. No caso da Indonésia, até então um país respeitado por ter derrubado o criminoso ditador Suharto e implantado uma democracia aparentemente sólida, é evidente a fraude eleitoral que levou um herdeiro do ditador ao poder. Os resultados eleitorais divulgados recentemente deram 58% dos votos ao antigo carrasco da ditadura Prabowo, acima dos 50% necessários para eleição em primeiro turno. Em todas as quatro eleições presidenciais diretas realizadas desde que o movimento reformista democrático da Indonésia pôs fim à ditadura da Nova Ordem de Suharto, nenhum candidato presidencial obteve maioria absoluta no primeiro turno. 

Qual teria sido a razão de tanto sucesso? Não há dúvida que se tratou de uma bem sucedida operação de guerra híbrida que reuniu o imperialismo norte-americano, o poderoso exército indonésio e a burguesia indonésia. Esta burguesia se formou e ganhou muito dinheiro durante a ditadura militar e continuou unida às Forças Armadas indonésias não só por razões ideológicas, mas por grandes interesses financeiros. 

Em termos concretos, a vitória se deu pela grande utilização da máquina do Estado em seu favor, inclusive com as FFAA fazendo uso de todo tipo de ação para aterrorizar o povo com possíveis resultados da não eleição de Prabowo. A mobilização maciça de fundos estatais de assistência social e o aparato burocrático estatal para apoiar abertamente a campanha de Prabowo-Gibran também foram vistos como fatores impulsionadores

Um fator fundamental foi a enorme campanha de propaganda e manipulação que transformou o antigo carrasco da ditadura em um afável personagem das redes sociais, capaz de fazer dancinhas e ser chamado de “vovô fofinho”. Também pesou o apoio aberto e direto de Jokowi a Prabowo; e a fraqueza eleitoral dos rivais Anies Baswedan (ex-governador de Jacarta) e Ganjar Pranowo (ex-governador de Java Central).

As evidências da fraude

No entanto, nas poucas semanas desde a eleição, surgiram cada vez mais evidências de fraude eleitoral generalizada, sistemática e estruturada. As evidências tornadas públicas mostram um plano sistemático e bem coordenado para influenciar os padrões de votação em todo o país a favor de Prabowo, nas semanas e meses que antecederam a eleição e no registro dos votos.

Como já analisamos anteriormente, o Tribunal Constitucional, cuja presidência era do cunhado de Jokowi, permitiu a participação de candidatos com menos de 40 anos, o que possibilitou que Gibran, filho de Jokowi, se tornasse o vice na chapa de Prabowo.

Houve também a substituição de mais de 50% dos chefes provinciais e distritais eleitos por funcionários públicos conhecidos ligados a Jokowi” nos dois anos anteriores às eleições. Além disso, foram denunciadas as ameaças e coerção de chefes de aldeias locais para mobilizar votos locais para Prabowo-Gibran, e um desvio maciço de fundos estatais de ministérios para direcionar fundos de assistência social aos cidadãos no ano anterior à eleição.

No início de março, Jusuf Kalla, ex-vice-presidente de primeiro mandato de Jokowi e membro da elite político-empresarial, denunciou a fraude eleitoral afirmando que as eleições “foram governadas por minorias, pessoas que podem pagar, pessoas do governo, pessoas com dinheiro” e disse que, se não forem tomadas medidas para desafiar isso, o futuro da Indonésia será sombrio.

Lutas de classe e cooptação

  Quando a ditadura de Suharto caiu, em 1998, uma das reivindicações populares do movimento democrático era a descentralização do poder político e econômico para as regiões locais. Após décadas de controle centralizado dos recursos locais, muitos grupos sociais, como agricultores, pescadores, trabalhadores e estudantes, mobilizaram-se, exigindo que os recursos locais fossem utilizados em benefício das comunidades locais. Estes incluíam demandas por redistribuição de terras e a restauração de terras confiscadas pelo Estado da Nova Ordem.

As exigências de descentralização política incluíram eleições diretas para presidentes de câmara, chefes de distrito e governadores, que entraram em vigor em maio de 2005, após a aprovação da Lei dos Governos Regionais em 2004. A reforma também ocorreu a nível das aldeias, com as comunidades exigindo eleições para eleger novos chefes de aldeia que respondessem melhor às necessidades da comunidade local.

Durante a presidência de Susilo Bambang Yudhoyono (SBY), de 2004 a 2012, o Estado fez inúmeras concessões a ativistas de movimentos sociais, organizações de direitos humanos e grupos setoriais organizados representando trabalhadores e agricultores. Alguns desses ativistas e organizações foram convidados a fazer parcerias com o governo para elaborar leis, fazer recomendações de políticas e financiar programas em nível subdistrital que alegavam garantir o desenvolvimento de baixo para cima, usando abordagens de planejamento participativo.

Na prática, essa aparente democratização do Estado desviou os ativistas das mobilizações populares e da organização de base para o interior do aparelho estatal, não faltando incentivos materiais para esta atuação.

Sabotando a democracia

Ao mesmo tempo, uma poderosa minoria de elites políticas e econômicas vinculadas ao regime ditatorial de Suharto, incluindo Prabowo, conseguiu limitar a participação nas eleições a partidos com acesso a recursos financeiros e burocráticos significativos, tornando virtualmente impossível para pequenos partidos ou candidatos independentes cumprir os requisitos administrativos para participar das eleições. Isso impediu que as organizações locais de base e partidos progressistas e de esquerda de lançar candidatos alternativos aos de partidos burgueses.

Jokowi foi escolhido como candidato presidencial do Partido Democrático de Luta da Indonésia (PDI-P) em 2014. Ele foi o primeiro candidato presidencial não associado diretamente ao regime de Suharto. Ele era um pequeno empresário regional de Java Central, e foi prefeito da cidade de Surakarta e governador da província de Jacarta antes de ser eleito presidente.

A campanha eleitoral de Jokowi mobilizou muitos grupos de intelectuais progressistas, ativistas, estudantes e organizações setoriais em apoio. Em seu primeiro mandato presidencial, muitos ativistas conhecidos receberam cargos em seu gabinete de assessoria, como dirigentes de empresas estatais ou como funcionários ministeriais, levando à cooptação de líderes de movimentos sociais. Em 2014, o partido de Prabowo, Gerindra, juntamente com cinco partidos da coalizão parlamentar vermelho-branco, usaram os momentos finais de sua maioria parlamentar no segundo mandato presidencial da SBY para aprovar a Lei das Eleições Regionais (UU Pilkada). A legislação iria tentar substituir as eleições diretas pela nomeação de líderes regionais.

No entanto, a oposição efetivamente interrompeu esse processo e as eleições diretas em nível distrital foram restabelecidas. Posteriormente, no entanto, uma série de revisões legislativas em 2016 e 2020, bem como um consenso majoritário entre as facções parlamentares burguesas, resultaram no cancelamento das eleições regionais para 2022 e 2023 e abriram a oportunidade para os ministérios do Estado e o Executivo nomearem burocraticamente os chefes regionais.

No final do ano passado, mais de metade dos chefes regionais eram “interinos” nomeados pelo governo central. Os relatórios do Indonesia Corruption Watch mostraram que o padrão de nomeações interinas e a relação estrutural dos nomeados é de deferência às prioridades e interesses do governo central, e não aos constituintes locais e regionais.

Ao nível das aldeias, foi promulgada em 2014 uma nova Lei das Aldeias. Ativistas agrários e defensores do desenvolvimento estiveram envolvidos na elaboração da lei, esperando que isso fizesse avançar a reforma democrática na sociedade rural e beneficiasse as comunidades rurais marginalizadas. No entanto, na prática, a lei burocratizou as estruturas do governo das aldeias, substituindo os líderes eleitos a nível de aldeia por “pessoal” selecionado através de um processo indireto. Além disso, a lei deu poder ao chefe da aldeia para tomar decisões sem consulta e vetar decisões do órgão representativo da aldeia. Essa nova lei das aldeias – que direcionou fundos estatais para os governos das aldeias – tornou os chefes das aldeias vinculados às demandas do governo central.

A aliança burguesa 

No seu segundo período presidencial (2019-2024), Jokowi conseguiu o apoio da maioria dos partidos políticos, distribuindo cargos de gabinete a todos os partidos e garantindo um segundo mandato presidencial sem qualquer oposição parlamentar séria. Esse nível de cooperação entre os partidos burgueses garantiu a aprovação de uma série de leis como a Lei Omnibus de 2020, que determinou a intensificação da exploração de recursos humanos e naturais, removendo salvaguardas ambientais e fornecendo concessões a investidores de capital nacionais e estrangeiros.

Toda essa coesão burguesa possibilitou aumentar a repressão policial contra qualquer movimento popular que lutassem por seus direitos e se manifestassem contra a corrupção e a exploração do governo, que chegou a níveis só semelhantes aos da ditadura da Nova Ordem.

A fraude eleitoral, portanto, foi o ponto culminante de um processo de consolidação do controle total pelas forças burguesas e do imperialismo, através de seus representantes político, sobre as instituições estruturais de poder do Estado. Trata-se, portanto, de uma operação de “regime change” completa.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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