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Juca Simonard

Editor da revista Na Zona do Agrião e redator do Dossiê Causa Operária

Coluna

Expatriação dos craques brasileiros é ataque à cultura nacional

"É preciso uma política que favoreça a permanência dos jogadores jovens no Brasil e estimule a volta dos expatriados ao País"

Reportagem da revista Placar (julho, 2022) mostra um grave problema do futebol nacional. Os jogadores brasileiros saem cada vez mais jovens do País. “O Brasil vê atletas sendo negociados cada vez mais jovens, muitas vezes antes mesmo da estreia no profissional”, diz artigo assinado por Guilherme Azevedo e Leandro Miranda.

De acordo com a matéria, “empresários, olheiros, intermediários e dirigentes concordam que é muito difícil encher os olhos de times grandes (e mesmo médios) dos centros ricos do exterior depois dos 21 anos”. Os motivos seriam que todos os clubes mais ricos “querem comprar atletas que tenham potencial de revenda” e preferem jogadores mais jovens para favorecer a adaptação aos países estrangeiros.

O analista de desempenho Thomaz Freitas afirmou à revista que “contratar um jogador de 23, 24 anos vai custar caro, o atleta demora a se adaptar e, depois, convencer algum clube a pagar uma quantia que amortize o investimento será mais difícil”.

Isto é, para favorecer os grandes clubes imperialistas, as grandes joias do futebol brasileiro têm saído cada vez mais jovens do Brasil. Alguns prodígios são sondados antes mesmo de estrearem no profissional, sendo observados por olheiros internacionais ainda no sub-13 e sub-15.

Saque generalizado do patrimônio nacional

A ida de jogadores cada vez mais jovens para o exterior é apenas parte do aprofundamento do processo de êxodo gigantesco que iniciou na década de 1990 e se aprofundou no início do século XXI. Do ponto de vista amplo, isso é um resultado da chamada globalização que marca o neoliberalismo e a atual ordem mundial, um processo descomunal de saqueamento dos países mais pobres em prol do imperialismo.

No Brasil, o êxodo também foi facilitado com a aprovação da Lei Pelé, de 1998, em pleno governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), o “príncipe” do neoliberalismo brasileiro. A lei, ao aumentar o poder dos empresários em relação aos clubes, facilitou a saída dos jogadores brasileiros para o estrangeiro, favorecendo os setores imperialistas do futebol.

É preciso deixar claro que se trata da típica política de saqueamento do imperialismo nos países pobres. Nesse caso, ao invés de roubar recursos, matérias-primas, como o petróleo, roubam-se jogadores para favorecer os clubes ricos, enquanto os clubes nacionais são prejudicados. Um desproporcional esquema de especulação e enriquecimento fácil às custas do nosso patrimônio cultural.

O Brasil é o país que mais exporta jogadores. É o que mostra um relatório divulgado pelo Centro Internacional de Estudos do Esporte (Cies), sediado na Suíça, em maio deste ano. São 1.219 jogadores atuando no exterior. Aqui, no entanto, vale uma observação interessante. Houve uma queda constante desde o pico, em 2019, quando haviam 1.600 jogadores brasileiros expatriados. O período de descenso bate exatamente com o aprofundamento da crise mundial com a pandemia da COVID-19, que dificultou a vida dos grandes especuladores internacionais do futebol.

Desta forma, chega-se à conclusão que a crise imperialista global tem favorecido a manutenção e o retorno dos jogadores brasileiros ao País. No entanto, o número continua sendo espantoso quando se leva em consideração que antes da “globalização”, os jogadores brasileiros mal saíam do País, principalmente jovens. Em sua maioria, os grandes craques saíam quando já estavam em fim de carreira e já tinham se consagrado. O rei do futebol, Pelé, por exemplo, jogou a vida inteira no Santos e só foi para o New York Cosmos, dos Estados Unidos, aos 35 anos. Zico, grande craque da história do Flamengo, só foi para a Udinese, da Itália, após 30 anos.

Uma monografia de conclusão do curso de bacharelado em Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) escrita por Ciro Americano do Brasil aponta que:

“Nas décadas de 1960 e 1970 eram poucos os jogadores que deixavam o país. Essa saída se tornou mais comum a partir da década de 1980, mas apenas para aqueles que já eram considerados jogadores consagrados. Na década de 1990 se tornou comum essa emigração. Na primeira década do século XXI a saída já se tornou um êxodo. Atualmente já é esperado que qualquer jogador que tenha um mínimo destaque em seu clube seja vendido para um time do exterior.”

E continua:

“O futebol se tornou, nas últimas décadas, um dos negócios mais lucrativos de que se tem notícia no globo. E o Brasil, considerado o país do futebol, tem exportado seus jogadores para abastecer o mercado mundial. E esse tem sido um mercado com boas perspectivas de lucro, bem superiores a de outras modalidades de investimentos.”

Processo nocivo ao futebol nacional

Não há dúvidas de que esse processo é extremamente nocivo ao futebol brasileiro. Primeiro, ele diminui o nível dos campeonatos nacionais. Apesar de o Brasil ser uma máquina de produzir talentos no futebol, e por isso consegue sempre manter o alto nível das competições brasileiras, o nível poderia estar bem acima. Basta imaginar como elas estariam com a participação de Neymar, Vinícius Júnior, Richarlison, Paquetá, entre outros jogadores excelentes.

Segundo, cria uma situação de distanciamento do povo brasileiro com sua Seleção. Nos últimos anos, temos visto em diversas ocasiões jogadores convocados para representar a Canarinho que somente ficaram conhecidos pela maioria dos brasileiros por esta convocação. É o caso do Raphinha, mas também de vários outros.

Isso nos leva a um terceiro ponto: favorece os países estrangeiros em seus interesses econômicos relacionados ao futebol. Naturalmente, a busca pelo consumo do futebol do exterior (suas transmissões, seus produtos etc.) cresce à medida que os melhores jogadores brasileiros estão fora do País. Isso prejudica a economia futebolística nacional. Como já foi mencionado, o futebol brasileiro é autossuficiente e, por isso, os efeitos aqui são reduzidos se comparados com países africanos ou asiáticos – em que boa parte de suas raras joias jogam na Europa e até mesmo em seleções europeias. No entanto, seria de um negacionismo extremo afirmar que não houve um crescimento da influência do futebol europeu no Brasil nos últimos anos. Basta sair às ruas e ver quantas camisas de times do exterior estão sendo usadas (há ainda o caso – raro – do torcedor de time da Europa).

Por último, prejudica a própria qualidade dos jogadores. Os que vão muito cedo para fora podem acabar perdendo seu futebol com características brasileiras. Trocar o futebol bonito que o levou para o exterior por um futebol burocrático. São mais de 1,2 mil jogadores atuando fora em 2022. Não são 1,2 mil gênios como Neymar, Rodrygo e Antony. Muitos desses ficam perdidos pelo continente europeu, jogando em ligas secundárias, sem se desenvolver do jeito necessário. Os gênios da Seleção, na verdade, são a exceção.

Em defesa do patrimônio nacional

Por esses motivos, é preciso uma política que favoreça a permanência dos jogadores jovens no Brasil e estimule a volta dos expatriados ao País. Da mesma forma que um país de capitalismo atrasado precisa de um Estado forte que promova o desenvolvimento econômico e industrial, é preciso de um Estado forte na questão futebolística.

Primeiro, uma política para fortalecer os clubes nacionais, que, prejudicados financeiramente, não têm força para se contrapor ao saque promovido pelos europeus. Segundo, a criação de mecanismos legais para mitigar a evasão dos jogadores para o exterior. E terceiro, o estímulo da base dos times brasileiros, fortalecendo as estruturas nacionais para melhorar ainda mais o nível dos nossos jovens e acelerar seu desenvolvimento.

Essas e outras propostas são fundamentais para barrar a suruba especulativa internacional com o futebol nacional.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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