Paulo Moreira Leite, um dos colunistas do Brasil 247, escreveu recentemente que “Alexandre Moraes constitui uma benvinda novidade em nossa história recente” em razão de entrevista concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em que concluiu, na defesa do punitivismo do STF, que “mais do que nunca, é hora de arregaçar as mangas, investigar os fatos e punir os responsáveis”.
Com a proximidade do 8 de janeiro, em que se completa um ano dos acontecimentos de Brasília (DF), a esquerda pequeno burguesa fica ouriçada para escrever e até mesmo fazer manifestações. A questão Palestina não anima ninguém, embora mais de 30 mil pessoas já tenham sido assassinadas pelo sionismo. Mas a tendência repressiva da esquerda espelhada em Xandão, essa sim, anima a todos, e chovem matérias em defesa do ex-chefe da Polícia Militar de São Paulo.
Afirma, Paulo Moreira Leite, que “à semelhança de tantos levantes militares, seja o golpe de 1964, que derrubou o governo João Goulart e construiu uma ditadura que se manteve por duas décadas, ou tantas revoltas fracassadas, que arranharam o sistema de poder de uma época antes de bater em retirada, deixando uma memória nociva de tumulto, indisciplina militar e ameaça a democracia, a Festa da Selma mantem-se em nossa vida pública como um enigma a ser decifrado e enfrentado”.
O redator pretende equiparar o golpe de 1964 com os acontecimentos de 8 de janeiro de 2023, que não foi uma tentativa de golpe, especialmente em razão de não ter ninguém armado para tomar o poder. Tratou-se apenas de uma demonstração de força da direita, possível apenas com o apoio de setores das Forças Armadas e do aparato repressivo de conjunto, que visava pressionar o governo recém-chegado ao poder. Houve uma invasão de prédios públicos, vandalismo, mas nenhuma ameaça real ao governo ou às instituições. A “democracia” foi preservada, mas a pressão almejada pelos artífices da manifestação surte efeito até hoje no governo petista paralizado e incapaz de mobilizar sua própria base ao exemplo dos supostos golpistas.
“Num depoimento que honra a toga de ministro do STF, Sua Excelência denuncia fatos de gravidade imensa, dos quais teve conhecimento direto, muitas vezes como testemunha ocular, oferecendo uma oportunidade histórica para o país ajustar as contas com o golpismo sórdido que se esconde à sombra”.
Para um texto político, vindo da esquerda, é muito estranho e mesmo vergonhoso o tratamento diplomático oferecido pelo redator à pessoa de Alexandre de Moraes. Não precisava tanto para demonstrar que quem escreve é mais um súdito de Xandão.
O ajuste de contas com o golpismo ou com o bolsonarismo, como propõe o autor da matéria, deve ser feito através da caneta de Moraes. O que significa prender todos que estiveram no ato de 8 de janeiro em Brasília (DF) e distribuir penas escandalosas para gente que não oferece risco a nenhuma outra pessoa, e menos ainda à chamada “democracia”.
O risco à democracia, como dizem redatores ao estilo de Moreira, na realidade é o risco ao STF, à autoridade do judiciário brasileiro, o mais reacionário dos três poderes. É apresentado pela esquerda que a democracia é o STF e vice-versa. Que os ministros do STF são a democracia, e que prédios públicos são a democracia. Isso é falso. O STF é a mais alta corte, e que chancelou todos os golpes que o Brasil sofreu, desde o golpe de 1964 até o de 2016. Seu histórico o coloca como um dos principais problemas a serem enfrentados para se ter um regime democrático. Tanto é assim que apenas o fato de se escrever o que foi escrito neste parágrafo pode ser considerado um ato atentatório contra o regime democrático. Essa é a posição do STF e, em especial, de Xandão.
A posição de Paulo Moreira Leite se soma a tantas outras da esquerda pequeno-burguesa, como é o caso de Florestan Fernandes Júnior, que no mesmo Brasil 247 afirmou, em tom de prece, que “Bolsonaro não tem como escapar das investigações do 08/01”.
“É grande a expectativa para a solenidade que marcará o primeiro ano da derrota da intentona fascista do dia 8 de janeiro de 2023. Recebi de uma fonte em Brasília o alerta para ficar atento ao ato que reunirá os presidentes dos três poderes da república. Na segunda-feira (08/01) às 15 horas no Senado Federal, é dado como certo que informações sobre os bastidores da tentativa golpista serão revelados. Uma verdadeira bomba!”, afirma o redator.
Não existe bomba alguma. O que existe é a completa cegueira da esquerda em encarar o STF como o representante do que há de mais democrático no Brasil e outorgar poderes para a corte fazer o que a esquerda deveria estar fazendo nas ruas, que é denunciar os golpistas e a direita bolsonarista, politicamente.
O plano de colocar as forças repressivas do Estado no encalço de bolsonaristas de pequena monta não servirá para debelar as forças golpistas que depuseram Dilma Rousseff e prenderam o atual presidente da República, Lula, entre elas a própria corte.
Essa medida, de perseguição penal e política, só servirá para aumentar as fileiras das pessoas que estiveram com o bolsonarismo no último período. Não serve para esclarecer o problema, mas somente para aumentar ainda mais os ânimos golpistas.
E as matérias surgem no justo momento em que Alexandre de Moraes presta entrevista para dois órgãos abertamente golpistas, a revista Veja e a Rede Globo. Oras, se existisse algo ou alguém para ser investigado sobre o golpe de Estado que o Brasil sofreu em 2016, seria preciso começar justamente por esses dois veículos de comunicação. Isso sem mencionar a participação do Poder Judiciário, de conjunto, no golpe contra o PT. Ninguém foi responsabilizado por isso.
Agora, em uma medida completamente cosmética, ameaçam publicar “bombas” contra os bolsonaristas, processar e julgar Bolsonaro pelos fatos de 8 de janeiro, sendo que os acusadores de agora (STF, Globo, Veja, etc.) foram os responsáveis diretos pela ascensão do bolsonarismo no país.
O que a esquerda pequeno-burguesa não quer fazer é mobilizar o povo em defesa de suas reivindicações, empurrar o governo federal para a esquerda; esclarecer, por meio da agitação e propaganda, qual é o programa da direita e qual é o programa da esquerda, o programa de luta do povo. Em troca disso, preferem a bajulação aos ministros do STF e a defesa de uma política repressiva, de prisão e censura, sendo que estes que prendem e censuram, até ontem, estavam defendendo a prisão ilegal de Lula.
