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Marcelo Marcelino

Membro Auditoria Cidadã da Dívida Pública (ACD) nacional, sociólogo, economista e cientista político, pesquisador do Núcleo de Estudos Paranaenses – análise sociológica das famílias históricas da classe dominante do Brasil e membro do Partido da Causa Operária – Curitiba.

Banco Central

Os presidentes do BC: Paulo Lira, mais um agente da ditadura

O imperialismo do mercado financeiro investe pesadamente nos seus representantes em conluio com a ditadura na década de 1970

DA SÉRIE “OS PRESIDENTES DO BANCO CENTRAL DO BRASIL” APRESENTAMOS MAIS UM DOS REPRESENTANTES DO IMPERIALISMO E DA CLASSE DOMINANTE BRASILEIRA NA DITADURA

O Banco Central na administração Lira, um ator político e tecnocrático já conhecido de longa data pelo então presidente Geisel devido a imbricações familiares e de amizade próximas teve a incumbência de algumas mudanças e transformações que dizem respeito a necessária condução da política econômica adotada pelo novo governo. O Plano Nacional de Desenvolvimento I (PND I) de 1969 na entrada do governo Médici teve a responsabilidade de reerguer a cambaleante economia brasileira, sobretudo em relação a gestão mais restritiva da política econômica entre o governo Castelo Branco e Costa e Silva, onde o excessivo controle inflacionário e a reorganização do sistema financeiro nacional trouxe vantagens para a liberalização do capital e arrocho salarial para os trabalhadores com o resultado previsível de recessão econômica, com ainda mais concentração de renda.

O PND I foi o responsável pelo início da retomada do crescimento econômico com um aporte de recursos notável advindos do exterior para obras de infraestrutura, o financiamento de programas que incentivavam as exportações de produtos agrícolas no centro oeste, o aumento do financiamento do capital de giro das empresas do setor de bebidas, alimentos e mesmo o setor de petroquímica acabaram por promover o crescimento econômico, além de subsídios e incentivos fiscais para as empresas. Tudo isso combinado com a manutenção de um alto grau de concentração em um modelo de política econômica que tinha como estratégia a entrada de empresas estrangeiras e a superexploração do trabalho como alicerce da acumulação capitalista. 

A gestão de Ernani Galvêas à frente do Banco Central no período do governo Médici teve um papel bastante relevante quanto a política econômica adotada nessa administração. A entrada de capitais externos em grande volume possibilitou garantir os investimentos necessários para a expansão do setor produtivo e ao mesmo tempo delegou o papel de saneamento do mercado financeiro ao próprio Banco Central que garantiu o aumento da concentração bancária do período sob orientação do processo de monopolização do capital financeiro como exigência da acumulação e reprodução do capital na fase do imperialismo como podemos compreender a seguir:

Nesse contexto do imperialismo os países subservientes aos ditames do capital como o Brasil adotaram uma política de adequação e adaptação as exigências da economia política internacional e também as necessidades de rearranjo da estrutura produtiva em conformação a monopolização bancária típica das contradições existentes no seio do próprio capitalismo e ao mesmo tempo da economia brasileira. De um lado a transição da acumulação do setor produtivo para o financeiro em nível mundial e de outro a necessidade de completar a infraestrutura econômica brasileira como necessidade da construção das bases do desenvolvimento. 

Um trecho importante do depoimento do presidente do Banco Central do período Ernani Galvêas é importante recuperar para compreendermos o papel do BCB no processo de concentração bancária do período. O processo de fusão e aquisição dos bancos e das financeiras nacionais e a tentativa de fechamento de alguns bancos estaduais se tornou uma política econômica delineada através do Banco Central no período da gestão de Galvêas. A fase do denominado “milagre econômico” brasileiro no período da gestão governamental de Médici também perde fôlego já em 1973 e na transição para o governo Geisel esse foi o maior desafio.

Na presidência de Paulo Lira o BCB passa por um momento de reconfiguração enquanto instituição, onde a sua gestão, assim como a de Ernani Galvêas irá perdurar durante toda a gestão governamental. Esse relevante ator tecnocrático irá assumir essa cadeira com a legitimidade conferida as suas relações de proximidade com o então presidente Geisel, como já mencionamos, e toda a política econômica do governo será absorvida nos pontos centrais de incumbência pelo BCB, acompanhando também as transformações na economia política internacional. 

No começo do governo Geisel a referida lei 6.024 de 1974 que dava plenos poderes ao Banco Central entra em vigor na prática como forma de garantir a execução de uma política que começou no governo anterior de saneamento do sistema financeiro nacional. Na verdade, se trata de uma política de concentração de mercado apoiado pela nova ordem mundial de acordo com os ditames do imperialismo no início do processo de liberalização e desregulamentação financeira global como o “ponta pé inicial” do neoliberalismo. A economia global entrava em uma nova fase que cabe destacar à guisa de compreensão do contexto econômico político mundial. Essa crise pode ser explicada à priori pela perda de capacidade ou esgotamento de um padrão de acumulação e reprodução do capital alicerçado no modelo fordista de produção e na economia política keynesiana desde o pós segunda guerra, onde o equilíbrio do padrão monetário de Bretton Woods (ouro-dólar 1944-71) e as políticas dirigistas e intervencionistas de Estado chegaram ao esgotamento, como sendo um final de ciclo de expansão, que desembocou entre o final da década de 1960 e o início de 1970. 

Esse era o cenário mundial quando o governo Geisel assumiu, assim como o presidente do Banco Central Paulo Lira. É nesse contexto que o Banco Central através da lei 6.024 de 1974 passa a concentrar mais poderes de uma instituição tecnocrática estratégica. Após o fim do acordo de Bretton Woods em 1971 e o primeiro grande choque do petróleo de 1973 a recessão mundial chegou no ápice em meados da década como consequência de uma série de fatores combinados. Ao mesmo tempo as exigências do reconfigurado sistema financeiro internacional capitaneado pelos EUA exigia adequações na organização do sistema financeiro nacional enquanto a política econômica lastreada pelo PND II bancada ainda por uma avalanche de acordos e empréstimos internacionais deslanchava. 

As obras faraônicas da construção da usina hidrelétrica de Itaipu e das usinas nucleares de Angra I, II e III como projeto, assim como outros empreendimentos procurava dar continuidade ao vigoroso crescimento econômico do início da década de 1970. A recessão econômica mundial e a perda de dinamismo da economia brasileira a despeito dos investimentos em obras públicas e demais programas de infraestrutura se fazia presente pela própria crise estrutural do capitalismo no interior da ordem global.

Porém, isso não aconteceu ou não foi possível devido a uma série de incongruências em relação a adequação a nova configuração do capitalismo global estrangulado pelo esgotamento do modelo de acumulação, que já dava sinais do término de ciclo expansionista no final da década de 1960. Uma interpretação relevante para esse cansaço do modelo de crescimento proposto pela via tradicional de impulsionamento de expansão econômica podemos encontrar em alguns autores citados pelo próprio Carneiro.

Concomitante a tentativa do governo Geisel de recriar as condições favoráveis a retomada do ciclo de expansão; que no final da sua gestão desembocaria numa enorme frustração em termos de resultados econômicos positivos no que tange aos seus objetivos de crescimento o Banco Central expandia suas atribuições e o seu poder de fortalecimento ao criar órgãos consultivos e comissões diretivas paralelas ao funcionamento do BCB. 

Segundo a Coleção História Contada do Banco Central do Brasil VII. (2019, p. 101):

A criação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) foi uma decisão do governo ou uma exigência do crescimento do mercado? A criação da CVM foi produto de uma visão do próprio Banco Central. O Banco Central estava de acordo e colaborou muito porque não podia fazer tudo, já tinha uma pletora de obrigações. Historicamente, era um organismo cheio de atribuições e de funções muito fora, digamos assim, de um modelo clássico de banco central. Nossa ideia era realmente que a parte de mercado de capitais saísse do Banco Central e ficasse em um organismo separado. A CVM foi concebida dentro daquela visão da Security Exchange Commission (SEC) norte-americana, com a função de supervisionar e disciplinar o mercado de capitais, as aplicações e tudo o mais. E o Banco Central colaborou muito em termos de pessoal, em termos de estudos. Tivemos uma colaboração muito estreita com Roberto Teixeira da Costa, que foi o homem da CVM.

Identificamos nessa passagem da entrevista do Paulo Lira a contínua influência estratégica do modelo de organização da comissão aos moldes do sistema financeiro dos EUA com a incumbência de supervisionar e disciplinar o mercado de capitais. A força do imperialismo capitaneado pelos EUA no setor financeiro em termos de organização e imposição da dependência externa era cada vez maior, assim como a própria depreciação dos valores das comodities de maneira forçada somado ao segundo choque do petróleo de 1979 empurrou o Brasil para as garras de um excessivo endividamento externo. 

O II PND de Geisel foi uma tentativa como já dissemos de escapar da excessiva dependência externa em termos da necessidade da tomada de empréstimos internacionais como ocorreu no caso do PND I e também dos investimentos do capital privado que já haviam se esgotado. Os investimentos do setor público foram os principais responsáveis por ainda manterem taxas de crescimento mais robustas na economia brasileira a despeito da crise internacional e enquanto o Banco Central se adaptava as exigências de um sistema financeiro internacional cada vez mais integrado. 

Essa passagem com dados bastante esclarecedores das deteriorações dos termos de troca do Brasil em relação aos países centrais imperialistas, assim como um aumento brutal da dívida externa provocados pelas políticas de rebaixamento dos valores das comodities dos países periféricos combinado com o aumento dos juros no mercado financeiro internacional fizeram eclodir a hiperinflação no começo da década de 1980 e a recessão econômica. Diante desse cenário econômico que o Brasil entra em uma transição governamental do governo Geisel para o de João Figueiredo, assim como ocorre na passagem de Paulo Lira para novamente Ernani Galvêas no Banco Central. 

A trajetória de Paulo Lira não se encerra na presidência do Banco Central, já que todos os atores tecnocráticos continuam suas carreiras em outros subcampos econômicos e financeiros tanto no setor público quanto no privado. A partir disso, cabe destacar algumas incursões de Paulo Lira ao longo da sua densa biografia documentada. 

Segundo o acervo biográfico do CPDOC-FGV http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/paulo-hortensio-pereira-lira

Governador-suplente do Brasil no conselho de governadores do FMI, por força do exercício da presidência do Banco Central, em março de 1979, ao findar o governo Geisel, passou o cargo a Carlos Brandão.

Entre 1979 e 1981 foi diretor financeiro de uma empresa do setor de fibras têxteis, em São Paulo. Posteriormente, tornou-se membro de diversos conselhos de administração ou consultivos de empresas privadas, atividades às quais se dedicou até 1999.

Membro do Conselho Nacional de Comércio Exterior, do conselho técnico do Instituto de Pesquisa Econômico-Social Aplicada (Ipea), do Conselho Monetário Internacional, do Conselho Monetário Nacional e do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), exerceu ainda as funções de consultor da Confederação Nacional da Indústria (CNI), de suplente do ministro da Fazenda no chamado Comitê dos Vinte, constituído para estudar a reforma do sistema monetário internacional, e de economista sênior do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Banco Mundial), participando da assessoria econômica do presidente dessa entidade em Washington.

FONTES: CORRESP. BANCO CENTRAL; INF. BIOG.; Jornal do Brasil (20/3/74); Moeda e Finanças.

Acrescentamos à carreira de Paulo Lira o documento do acervo biográfico do CPDOPC-FGV que completa a trajetória do presidente do BCB com a sua atuação bastante robusta também no setor privado corroborando com a nossa tese de que os atores políticos e tecnocráticos do campo econômico e financeiro a partir das instituições tecnocráticas estratégicas do Estado no período do desenvolvimentismo brasileiro de meados do século XX conquistam e acumulam “capitais” e expandem as suas carreiras por intermédio inclusive das relações de reciprocidade lapidadas pelas afinidades e proximidades de amizade e parentesco nos circuitos políticos e profissionais. 

Logo após deixar a presidência do Banco Central ainda atuou como diretor financeiro de uma empresa do setor de fibras têxteis em São Paulo e ainda se tornou membro de diversos conselhos administrativos e consultorias em várias empresas privadas até o final da década de 1990. 

Sintetizando a relação de instituições que atuou como conselheiro e consultor:

a)Membro do Conselho Nacional de Comércio Exterior; b) membro do conselho técnico do Instituto de Pesquisa Econômico-Social Aplicada (IPEA); c) membro do Conselho Monetário Internacional; d) Membro do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro); e) consultor da Confederação Nacional da Indústria (CNI); f) foi suplente do ministro da Fazenda o chamado Comitê dos Vinte (constituído para estudar a reforma do sistema monetário internacional); g) economista sênior do Banco Mundial responsável pela assessoria econômica do presidente dessa entidade em Washington. 

Elencamos os cargos e funções do ator político e tecnocrático Paulo Lira e podemos constatar que os “capitais” acumulados do presidente do Banco Central vão além de um indivíduo pertencente a elite política e tecnocrática. Na soma desses atributos de enorme relevância e poder devemos incluir os capitais familiares herdados desde a origem a partir da estatura política e econômica de seu pai, que já trazia consigo “capitais” de distinção econômica, política e social desde a Paraíba passando pelo Rio de Janeiro. Para essas considerações aqui levantadas chamamos a atenção para uma passagem que consideramos elementar no momento de apresentarmos a descrição desses atores, mesmo se recorrermos como fizemos as entrevistas do CPDOC-FGV que serviram de base para o livro em vários volumes das Histórias Contadas do Banco Central do Brasil em parceria com o próprio BCB e recorrendo também ao arquivo documental do CPDOC-FGV no seu site na internet. Portanto, de acordo com Bourdieu (2004; p. 153): Os grupos que se devem construir para objetivar as posições que eles ocupam escondem essas posições, e então, por exemplo, o capítulo do La distiction consagrado às frações da classe dominante é lido como uma descrição dos diferentes estilos de vida dessas frações, em vez de serem ali posições nos espaços das posições de poder – que chamo de campo de poder. 

O que podemos analisar sociologicamente dessas entrevistas e das biografias, mesmo que resumidas desses atores diz muito quem são esses atores políticos e tecnocráticos que passaram pela presidência do Banco Central em algum estágio de suas carreiras profissionais e políticas e como iremos ver logo adiante a partir do próximo presidente do BCB que não podemos dissociar o político do técnico quando se trata de altos postos na administração pública, nas grandes empresas e instituições estratégicas de Estado e também grandes corporações privadas nacionais e estrangeiras, em especial em cargos de enorme envergadura como esses apresentados por esses indivíduos pertencentes às elites tecnocráticas estratégicas e também as frações da classe dominante.

Reparem que esses indivíduos cumprem um papel estratégico nas empresas estratégicas do Estado brasileiro, estabelecendo uma ponte entre interesses do imperialismo em conluio com a burguesia nacional do alto escalão ou nas frações da classe dominante da prateleira do andar mais alto. O capital financeiro nesse momento passa a ser a engrenagem de acumulação e reprodução do capital em grande escala e esses atores tecnocráticos tornam-se também sujeitos milionários na “cena do crime da burguesia” lesa pátria e povo, já que a sua riqueza individual e da classe dominante e do imperialismo dependem desses mecanismos de transferência de riquezas as custas do país e da fome de milhões de brasileiros desde muto tempo.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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