O filme alemão Nada de Novo no Front (Im Westen nichts Neues, 2022), dirigido por Edward Berger, foi premiado, no último domingo, com o Oscar de de melhor filme estrangeiro pela Academia de Cinema dos Estados Unidos.
O prêmio coloca o filme em evidência e nos convida a tecer alguns comentários sobre sua abordagem de um tema histórico: a I Guerra Mundial. O filme é bom, mas apresenta contradições típicas do nosso momento histórico, que são o foco deste texto.
Trata-se da refilmagem de um clássico alemão de 1930, de mesmo nome, e que ganhou uma versão para a TV britânica em 1979. Uma análise comparativa das três versões à luz da conjuntura histórica de suas produções seria bem interessante e prometo fazer em um outro momento.
No enredo, o jovem estudante alemão Paul Bäumer (Felix Kammerer) alista-se no exército imperial, junto com colegas, para combater os inimigos da pátria na I Guerra Mundial. Estão movidos por um desejo superficial de luta atiçado por um discurso ainda mais superficial de nacionalismo.
Ao longo das mais de duas horas de duração, a partir das experiências de Bäumer, somos levados a conhecer as atrocidades de uma guerra cujo campo de batalha eram as trincheiras nas fronteiras entre a Alemanha e a França. A inocência do protagonista vai se tornando agonia e desespero.
Na última batalha, o filme consegue a proeza de nos fazer sentir completo horror de ver o personagem, mais uma vez, ser obrigado a participar de uma carnificina.
Há algo de Vá e Veja, filme russo de Elem Klimov, sobre a invasão dos nazistas na Bielorrússia, na abordagem que o diretor Eward Berger dá à jornada de Baümer. Nos dois filmes, acompanhamos o horror pelos olhos dos protagonistas.
Mas, ao contrário do filme russo, que é consciênte de sua intenção política na representação de um fato histórico, a versão atual de Nada de novo no front revela um posicionamento muito menos crítico.
O filme busca passar uma mensagem de pacifismo a partir da inocência do personagem. Mais, evidencia que a guerra é uma escolha de políticos corruptos, gananciosos e desumanos, que não hesitam em sacrificar sua juventude para obter vantagens monetárias. Há ainda a figura do general fanático, que se tornará o nazista em poucos anos, e das tentativas desesperadas da social-democracia em evitar o pior.
Aqui está a grande contradição do filme. Ao visitar o passado alemão nesses termos, Berger denuncia a estupidez das guerras, mas esquece de fazer uma crítica ao imperialismo e às guerras coloniais daquele momento histórico.
Ao escolher o político corrupto como culpado, poupa as contradições capitalistas que levaram à guerra, o sistema capitalista como um todo e, mais do que isso, as burguesias alemã e europeia daquele momento e do atual.
Três milhões de soldados, a imensa maioria de trabalhadores, morreram só nas trincheiras nos cinco anos de guerra, aponta a legenda no final do filme. Chegamos a 2022 sem aprender nada? Como Paul Baümer? Infelizmente, parece que sim.
Na representação contemporânea do conflito, novamente, a luta de classes teima em ficar escondida.
Uma vez, um professor meu comentou que com o término da guerra, os soldados alemães voltaram para casa e a social-democracia da República de Weimer fez com que todos devolvessem as armas. A social-democracia, com anuência do Partido Comunista Alemão, fez isso em um momento em que a Revolução Bolchevique já era realidade na Rússia.
A luta dos trabalhadores alemães estava forte. Tudo indicava que a Alemanha seria a próxima. E precisava ser. Mas Rosa Luxemburgo foi assassinada em 1919.
E o resto é história.