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Antônio Vicente Pietroforte

Professor Titular da USP (Universidade de São Paulo). Possui graduação em Letras pela Universidade de São Paulo (1989), mestrado em Linguística pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo (2001).

Língua portuguesa

O substantivo

Os substantivos não implicam simplesmente relações entre palavras e coisas.

Poema visual

Desde o início desta coluna sobre língua portuguesa, tratamos da definição de “sujeito”, contudo, focalizando nossa atenção tanto no “sujeito gramatical” quanto no “sujeito da enunciação”, terminamos por não definir a que classe de palavras tal “sujeito” pertence. O “sujeito” das orações é sempre “substantivo” ou “pronome”; assim, no texto de hoje, começaremos a estudar o “substantivo”.

Em sua “Nova gramática do Português contemporâneo”, Celso Cunha e Lindley Cintra definem “substantivo” sendo “a palavra com que designamos ou nomeamos os seres em geral” (1985:171). No “Novo dicionário básico da língua portuguesa Folha/Aurélio”, “designar” significa “dar a conhecer, nomear, indicar” e “nomear” significa “criar, instituir, designar”. Dessa maneira, o “substantivo” nomeia um “ser”; cabendo indagar, portanto, qual a definição de “ser”.

No mesmo dicionário, “ser” significa “existir”, fazendo do “substantivo” a classe de palavras nomeadora das coisas existentes. Contudo, essas definições são insatisfatórias, pois nelas a língua ainda é concebida enquanto mera nomenclatura das coisas do mundo. O que seriam, porém, tais coisas do mundo? Antes de ser questão filosófica, para nós interessa entender as coisas do mundo do ponto de vista linguístico.

Evidentemente, a existência das coisas do mundo, do qual os seres humanos participam, é fato incontestável, e é fato tais coisas serem designadas por meio das palavras das línguas; a questão, entretanto, torna-se saber por que meios as línguas fazem isso.

Segundo o senso comum, existem coisas no mundo e as palavras simplesmente as nomeiam. Dessa maneira, há crenças na existência do mundo material e objetivo independentemente do homem e a crença nas palavras nomearem esse mundo objetivo. Por decorrência, soma-se a tais concepções outra crença, isto é, a de nos dicionários registrarem-se objetivamente as relações entre esses “nomes” e aquelas “coisa do mundo”

Contrariamente, a linguística moderna propõe novas explicações para as relações entre palavras e coisas. Embora exista o mundo, a língua não tem a função de nomeá-lo simplesmente; ao nomearmos o mundo por meio da língua, somos levados a interpretá-los segundo os critérios de classificação próprios da língua utilizada. Melhor dizendo, as palavras não são simples referências às coisas do mundo; elas são, isto sim, conceitos com vistas a descrever e explicar o mundo.

Não existem palavras neutras; todo vocabulário implica os valores da sociedade que o utiliza. A palavra “vaca”, por exemplo, significa “a fêmea do touro”; tal informação biológica parece objetiva, mas somente porque nossa sociedade valoriza o discurso científico com conotações de objetividade. Para algumas culturas, vacas não passam de animais fornecedores de carne, leite, couro etc.; essas conotações pertencem, em língua portuguesa, ao conceito expresso por meio da palavra “vaca”. Tais sociedades, semelhantemente à nossa, estão longe de divinizar a vaca e transformá-la em animal sagrado, feito na Índia Antiga; lá, certamente, no conceito de vaca há concepções de sacralidade ausentes em língua portuguesa.

No dicionário “Folha/Aurélio”, curiosamente, há outra definição de “vaca”: “no jogo do bicho, o 25º grupo, que abrange as dezenas 97, 98, 99 e 00, e corresponde ao número 25”. Esse conceito é específico da cultura brasileira, não há algo semelhante nas traduções francesas ou inglesas da mesma palavra.

Os dicionários, portanto, são feitos por seres humanos pertencentes a determinada sociedade; quando dicionários são elaborados, tais volumes traduzem, na definição de cada palavra, os conceitos do mundo concebidos pelos dicionaristas em nome de tal sociedade. O “substantivo” é, portanto, um conceito por meio do qual são construídas visões de mundo; além de nomear coisas, por meio do substantivo são traduzidas concepções sociais.

(as ilustrações desta coluna são poemas visuais de Fernando Aguiar)

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