Recentemente, em discurso de pré-campanha, o Presidente Biden afirmou que a economia chinesa é uma bomba relógio. Para ele, a China está em “apuros” porque seu crescimento diminuiu e ela tem a “maior taxa de desemprego”. Ele também criticou a Iniciativa do Cinturão e Rota, como o “endividamento e laço”, devido aos altos níveis de empréstimos a economias em desenvolvimento associados ao programa global de investimentos. “A China estava crescendo a 8% ao ano para manter o mesmo patamar, que agora é perto de 2% ao ano” “Eles estão em uma posição em que o número de pessoas em idade de aposentadoria é maior do que o número de pessoas em idade de trabalho” O Presidente da maior potência imperialista do planeta errou e muito em suas avaliações e previsões, mostrando que, além de má-fé, suas afirmações carecem de um mínimo de informação sobre o que ele próprio elegeu como seu maior inimigo. Mas o pior foi quando afirmou que “isto não é bom porque quando as pessoas ruins têm problemas, elas fazem coisas ruins.” Ao que parece, Joe Biden atribuiu ao inimigo as características essenciais do imperialismo norte-americano que, em função de seus problemas, sempre fez as piores atrocidades que um país pode fazer com o outro em toda a história da humanidade. São pessoas más.
A trajetória recente da economia chinesa
A evolução anualizada do PIB chinês no primeiro semestre de 2023 foi de 4,5% no 1º. Trimestre e de 6,3% no segundo trimestre. Apesar disso, o crescimento no 2º.trimestre, foi de apenas 0,8%, desacelerando acentuadamente de 2,2% no primeiro trimestre de 2023, considerando a base trimestral. Uma medida confiável da atividade econômica, o Índice de Pesquisa de Gerentes de Compras de julho, caiu para 51,1 em julho de 2023, de 52,3 no mês anterior (50 é o limite entre expansão e contração). Este foi o valor mais baixo desde dezembro de 2022. A atividade manufatureira foi contraída pelo quarto mês consecutivo.
Por outro lado, a rápida recuperação do setor de serviços, o crescimento positivo dos investimentos em infraestrutura, a evolução do comércio exterior para produtos de maior valor agregado e o crescimento do varejo de bens de consumo de 8,2% impulsionaram fortemente o crescimento da economia chinesa. A economia enfrenta pressões econômicas externas expressivas na agressiva atuação das potências ocidentais contra a China, o que resulta em menor crescimento do comércio exterior, fruto também da redução da demanda desses países pelo baixo crescimento que vem apresentando. Há também problemas relativos a um arrefecimento da demanda interna ainda fraca, e também a redução do crescimento do investimento chinês. O crescimento chinês é muito superior ao da economia dos EUA e da UE, cujo desempenho pode ser classificado como de uma tendência à estagnação.
De acordo com o FMI, o crescimento em 2023 deve ser de 1,3% para as economias ocidentais, contra 5,2% para a China. Segundo o FMI, a China é a economia que mais colabora para o crescimento mundial, representando um terço de todo o crescimento econômico mundial até 2023. Os economistas preveem para o segundo trimestre um crescimento anualizado de apenas 1%, bem abaixo do crescimento chinês.
Enquanto as famílias no Ocidente estão sofrendo a maior queda nos padrões de vida desde a Grande Depressão, já que os salários não conseguem acompanhar a alta inflação, na China ocorre o oposto. O crescimento real do salário na China foi de 3,7% em 2022, com previsão de 3,8% para 2023. Enquanto a inflação foi de 0,0% na China, ela foi de 3,00% nos EUA, 6,40% na Alemanha, 5,60 na França e 8,70% no Reino Unido
Essa estabilidade de preços na China permite desenvolver políticas expansivas de consumo privado sem o risco de desencadear um processo inflacionário como o que ocorreu no Ocidente. Este ano, o FMI prevê que a China cresça 5,3%, enquanto as economias capitalistas avançadas apenas atingirão 1,5%, com a zona euro a crescer apenas 0,9% e a Alemanha e a Suécia em pura recessão.
A evolução do setor externo
A guerra comercial desencadeada pelos EUA com o apoio da União Europeia e do Japão contra a China visa bloquear o crescimento chinês, provocando a falência da sua economia, para evitar a ultrapassagem da economia chinesa sobre a americana. E dois tipos de estratégias estão sendo usados. Por um lado, a cadeia produtiva internacional está fraturada nas áreas em que a China é deficiente como é caso de semicondutores ou chips e, por outro lado, busca-se estrangular suas exportações com todo tipo de obstáculo. No período de janeiro a junho de 2023, as exportações para os EUA decresceram 12,0% e para o resto do mundo cresceram 6,34%, já as importações caíram 0,21%
No primeiro trimestre de 2023, as exportações da China cresceram 8,40% e as importações ficaram estáveis, enquanto no segundo trimestre houve um arrefecimento do comércio exterior, gerando uma redução tanto nas exportações quanto nas importações em torno de pouco mais de um e um meio por cento. O resultado do semestre é um crescimento das exportações de 3,70% e uma leve redução das importações, com destaque para a redução das exportações para os principais países ocidentais (principalmente os EUA) que é compensada pelo maior volume exportado para o restante do mundo.
É cedo para avaliar se essa desaceleração do comércio exterior no segundo trimestre continuará nos próximos meses. A OMC prevê que a taxa de crescimento do comércio global de cargas será de 1,7% em 2023, inferior à média de 2,6% dos últimos 12 anos. Não há dúvida de que o efeito da desaceleração econômica no Ocidente e a guerra comercial dos EUA continuarão pressionando as exportações.
Por outro lado, deve-se notar que o setor externo da China está passando por uma melhora estrutural significativa, com produtos de alto valor agregado ocupando cada vez mais espaço nas exportações. As exportações de baterias solares, baterias de íons de lítio e veículos elétricos impulsionaram o capítulo de produtos de máquinas, que aumentou 6,3% em relação ao ano anterior e agora representa 58,2% das exportações totais do país. A China já é o maior exportador de carros do mundo este ano, depois de derrubar o Japão no início do ano. Parece que a política de dissociação dos EUA e da Europa contra a China está colhendo apenas resultados decrescentes que são compensados pelo crescimento do comércio exterior chinês com o resto do mundo.
A crise do mercado imobiliário
O Financial Times alega “a má supervisão do mercado imobiliário levou a um boom insustentável de empréstimos, enquanto os impedimentos políticos prejudicaram as empresas privadas“. A partir daí divulgam-se versões de que haveria um colapso do mercado imobiliário na China, pois as mega empresas imobiliárias acabariam falindo, pois as altas dívidas não poderiam ser saldadas com a vendas dos imóveis em construção.
Recentemente, a Evergrande, uma gigante do mercado imobiliário, pediu proteção contra a bancarrota nos EUA, alegando estar passando por uma reestruturação, o que a protege de ser processada pelos credores ou de ter seus bens congelados nos EUA. O seu passivo chegou a mais de 300 bilhões de dólares. O regulador de segurança notificou-a de que está sendo investigada.
Outra grande empresa de construção do país, a Country Garden, deixou de fazer o pagamento de empréstimos, tendo 192 bilhões de dólares de dívida. Ela foi a empresa imobiliária que bateu recordes de venda no ano passado na China, mas agora os preços dos imóveis estão em queda. A empresa tinha mais de 3.000 obras em construção na China no final de 2022, desenvolvendo cerca de quatro vezes mais projetos do que Evergrande. O setor imobiliário da China, que corresponde a um quarto da economia do país, está, portanto, novamente em crise.
Essa crise é, como afirma a mídia ocidental, resultado da ineficiência do Estado em regular o mercado? A real questão é, ao contrário, a ineficiência do capital privado em produzir de forma adequada para um mercado imobiliário que é muito dinâmico. O erro das autoridades chinesas tem sido colocar o atendimento de uma necessidade humana básica, a moradia, nas mãos do setor privado. A habitação só pode ser oferecida de forma a garantir sua oferta em grande quantidade e a preços razoáveis, através do investimento público direto, evitando a especulação, o aumento dos preços da moradia e o aumento da desigualdade. Na verdade, a maior razão para o aumento da desigualdade na China nas últimas duas décadas é patente, haja visto o surgimento de muitos bilionários, mas a desigualdade gerada pela má distribuição dos imóveis também tem gerado muita insatisfação. A atual direção do Partido Comunista tem se colocado como a campeã do rumo certo do “socialismo com características chinesas”, mas sabe-se que a realidade não é tão rósea assim.
Desde que se abandonou a orientação pela economia planificada da era de Mao Tse Tung e se abriu caminho para o retorno ao capitalismo, as chamadas “reformas econômicas”, a burocracia chinesa enfrenta grandes contradições entre as tendências anárquicas do capitalismo e o suprimento nas necessidades básicas da população. Desde o final da década de 1990, os clamores pela retomada dos princípios socialistas e em favor de um modelo de crescimento mais sustentável, reduzindo sua dependência de exportações e investimentos em ativos fixos, como a construção de infraestrutura, tentaram ser seguidos pela burocracia, apesar da terrível opção autoritária simbolizada pelo massacre das manifestações da Praça Celestial em 1989. Isso levou a algumas políticas reformistas e redistributivas sob o governo de Hu Jintao e Wen Jiabao de 2003 a 2013, como a Nova Lei do Contrato de Trabalho, a abolição do imposto agrícola e o redirecionamento do investimento do governo para as regiões rurais do interior. Mas o peso dos interesses existentes tanto da burguesia chinesa como das empresas estatais, e dos governos locais que prosperam em contratos de construção e os empréstimos bancários estatais que alimentam esses projetos impediu que estas tendências reformistas prosperassem. Apesar da sempre silenciada resistência da classe operária, dos camponeses e da classe média, a burocracia optou pelo caminho da dinâmica do mercado capitalista. As conquistas mínimas na redução da desigualdade no período Hu-Wen foram devidamente revertidas após meados da década de 2010. Está claro que agenda de ‘prosperidade comum’ de Xi não significa nem de longe um retorno ao igualitarismo da era Mao, ou mesmo uma restauração do assistencialismo reformista. A tendência principal é a afirmação do papel do Estado no estímulo ao capital: aumentando sua presença nos setores tecnológico e imobiliário e atribuindo ao empreendedorismo privado sua identificação com os interesses mais amplos da nação.
O partido Comunista tem se preparado para as repercussões sociais e políticas dessa terrível situação. Nos discursos políticos oficiais, ‘segurança’ tornou-se a palavra mais pronunciada, eclipsando a palavra ‘economia’. A atual liderança acredita que pode sobreviver a uma crise econômica apertando seu controle sobre a sociedade, erradicando facções autônomas da burguesia e assumindo uma postura mais assertiva no cenário internacional em meio à crescente tensão geopolítica, mesmo que tais movimentos sirvam para agravar seus problemas de desenvolvimento. Isso ajuda a explicar a abolição dos limites do período de mandato presidencial em 2018, a centralização do poder nas mãos de Xi, o esforço implacável para erradicar as facções do Partido em nome do combate à corrupção, a construção de um estado de vigilância crescente e a mudança dos pilares da legitimidade do estado: para além dos efeitos do crescimento econômico e em direção ao fervor nacionalista. O atual enfraquecimento da economia e o endurecimento do autoritarismo não são tendências facilmente reversíveis. Eles são, de fato, o resultado lógico do desenvolvimento desigual e da acumulação de capital da China nas últimas quatro décadas.
No setor imobiliário este caminho se revela profundamente. Os líderes chineses, aconselhados por seus banqueiros e economistas educados no Ocidente, optaram pelo modelo rentista-capitalista, que agora se voltou contra eles. O governo foi forçado a agir. Em primeiro lugar, com sua política de ‘três linhas vermelhas’, introduzida em 2020, o governo visava limitar os empréstimos aos empresários e, em última análise, reduzir seu acesso ao financiamento. O governo começou a resgatar alguns empreendimentos e assumir diretamente aqueles mais problemáticos . Mas enormes dívidas permanecem com os governos locais, responsáveis por fornecer terras a esses empreendedores e levantar fundos. A dívida do governo local disparou e o perigo da insolvência é grande.
A dívida dos governos locais situa-se agora em cerca de 25% do PIB, mas se adicionarmos os títulos de financiamento estabelecidos pelos governos locais, a dívida total dos governos locais está próxima de 60% do PIB. Ela se ampliou pelo uso muito amplo dos LGFVs, ou veículo de financiamento do governo local. Funciona na forma de uma empresa de investimento que toma dinheiro emprestado para financiar o desenvolvimento imobiliário e outros projetos de infraestrutura local Pior ainda, diante de critérios de crédito mais rígidos para habitação, as LGFVs voltaram-se para os mercados offshore e levantaram um recorde de US$ 39,5 bilhões em títulos em dólares.
Tudo agora se resume em fornecer crédito mais fácil para os empresários, o slogan de Xi de “casas para morar” foi abandonado. O governo agora fala em ajudar o setor capitalista. Altos funcionários do partido e do estado publicaram em conjunto um plano de 31 pontos para fortalecer a economia privada e melhorar o ambiente de negócios. Várias agências governamentais também traçaram recentemente metas para aumentar os gastos dos consumidores com carros e eletrodomésticos, embora nenhum subsídio direto para as famílias tenha sido divulgado. O caminho escolhido parece ser o de favorecer as empresas privadas
Tudo isso está de acordo com o Financial Times e outros, que avaliam que “empresários e empresas estabelecidas precisam de estabilidade e clareza regulatória do governo. Uma maior liberalização da política monetária pelo banco central da China poderia ajudar. Pequim também terá que reestruturar sua dívida do governo local ; uma opção poderia ser a venda de ativos estatais para empresas privadas. Os recursos ajudariam as autoridades locais a evitar uma crise de dívida”. Em outras palavras, a resposta não é a propriedade pública do setor imobiliário e a aquisição de empresas imobiliárias endividadas, mas um resgate e depois a venda de ativos estatais para pagar por isso – isto é, privatização, não nacionalização.
O desafio do futuro da economia chinesa
A China parece estar bem preparada para o futuro através de sua aposta na ciência e tecnologia. Sete universidades chinesas estão classificadas entre as 100 melhores do mundo, com Tsinghua e Pequim entre as 20 melhores. Tsinghua é considerada a principal universidade de ciência da computação do mundo, enquanto Pequim ocupa o nono lugar. Da mesma forma, nove universidades chinesas estão entre as 50 melhores do mundo em matemática. Em contraste, nenhuma universidade indiana, incluindo os celebrados Institutos Indianos de Tecnologia, está classificada entre as 100 melhores do mundo.
A China ainda tem grandes oportunidades de investimento em infraestrutura em suas províncias do interior. O desafio é converter a poupança doméstica em investimento nacional, alocando o capital para usos mais produtivos. Isso significa que o Estado deve direcionar o investimento e não deixar que essa capacidade de decisão seja entregue ao setor capitalista.
Na verdade, o setor capitalista na China não está tendo o desenvolvimento esperado. A participação do setor privado nas 100 maiores empresas listadas da China em valor de mercado caiu de um pico de 55% em meados de 2021 para 39% em junho deste ano, perto de seus níveis mais baixos em mais de três anos, de acordo com um relatório publicado pelo Peterson Institute for International Economics, ou PIIE, com sede em Washington, DC
O investimento do setor privado caiu 0,2% no primeiro semestre de 2023 em relação ao ano anterior, a primeira contração desde o início da coleta oficial de dados em 2005, com exceção de 2020, quando a economia entrou em bloqueio devido à pandemia. Em contrapartida, os investimentos das empresas estatais cresceram 8,1% no mesmo período. Dessa forma, não é uma mudança para uma economia de mercado liderada pelo consumidor que a China precisa para colocar sua economia em movimento novamente, mas um investimento público planejado em habitação, tecnologia e manufatura.
O problema do emprego da Juventude
Um grande problema tem se colocado para o futuro da China: os altos níveis de desemprego na faixa de 19 a 24 anos. Em abril, o desemprego alcançou 20,4%, marcando o pior índice desde o início da divulgação pelo órgão governamental em 2018. A situação continuou a deteriorar-se nos meses seguintes, com taxas de 20,8% em maio e 21,3% em junho. Em julho, o governo interrompeu a publicação desses dados, alegando que é preciso separar do índice a parte dos jovens que procuram continuar estudando e não estão ainda procurando emprego.
Este ano, 11,6 milhões de estudantes se formaram em universidades chinesas, um recorde. Uma nota recente do banco de investimentos norte-americano Goldman Sachs estima que isso pode se traduzir em um aumento da taxa de desemprego juvenil entre 3 e 4 pontos percentuais. Isso significa que um quarto dos jovens chineses pode ficar desempregado neste verão. A fraca recuperação da economia é parcialmente culpada. Em períodos de maiores dificuldades econômicas, os primeiros atingidos pelo desemprego são muitas vezes os jovens. E isso parece ser confirmado pelos números globais das pesquisas de desemprego urbano, com elevação do desemprego nas zonas urbanas de 5,2 por cento em junho para 5,3% em julho.
No entanto, os dados estatísticos apontam que dos 96 milhões de pessoas entre 16 e 24 anos, apenas 33 milhões têm a possibilidade de reinserção no mercado de trabalho, e mais de 26 milhões encontraram um emprego. Ainda assim, em termos absolutos, a população desempregada nesta faixa etária duplicou desde antes da pandemia em 2019.
Entre as inúmeras causas dessa acentuada deterioração, os analistas destacam as dificuldades do setor privado, que hoje representa 80% dos empregos urbanos do país e 90% da geração de empregos.
A partir de 1998 as reformas de abertura da economia determinou o fechamento das empresas estatais, o que provocou mais de 26 milhões de demitidos, a que se somam mais de dez milhões de trabalhadores despedidos por empresas coletivas. Isto se traduziu em uma taxa de desemprego de cerca de 15,6% do total da população ativa. O governo chinês lançou vários programas de treinamento e reemprego, promovendo o desenvolvimento da economia privada. A partir dos anos 2000, o setor privado tornou-se o principal empregador, contribuindo para a criação de cerca de 50 milhões de empregos para absorver não só os demitidos por estatais e empresas coletivas, mas também os milhões de camponeses que se mudaram para a cidade.
Desde 2020, assistimos a uma nova vaga de desemprego juvenil, precipitada por uma conjuntura econômica internacional particular (pandemia de Covid-19, aumento das tensões entre a China e os Estados Unidos, guerra na Ucrânia, etc.). Esta nova crise cíclica do emprego ocorre num momento em que a população urbana nunca foi tão grande (6 vezes mais do que em 1978 e quase 3 vezes mais do que em 1998), enquanto, ao mesmo tempo, o número de trabalhadores urbanos diminui – pela primeira vez desde 1962 – de 467,73 para 459,31 milhões entre 2021 e 2022.
Desafios da economia chinesa
O que tem permitido um avanço sistemático da economia chinesa tem sido a estrutura do setor estatal da economia, que, ao contrário da propaganda do imperialismo, é o setor que garante o desenvolvimento industrial e tecnológico do país. E impede que seu dinamismo seja interrompido pelas crises do capitalismo internacional e da acumulação de capital interna. Outro fator importante desse processo é o estrito controle que o governo tem sobre o setor financeiro, que se acopla ao dinamismo do setor estatal como um todo, impedindo que se desenvolva um processo de financeirização da economia, como ocorre nos países imperialistas. Isto chegou a acontecer no período do primeiro governo Xi, de 2012 a 2017. A estrutura atual do sistema financeiro, que envolve um poder absoluto do partido sobre suas instituições, parece ser exageradamente controladora. Mas é atualmente a única forma de evitar a repetição dos acontecimentos do período anterior, em que o capital financeiro se desenvolveu com uma audácia que arriscava derrotar o próprio Estado chinês.
De acordo com o ranking Global 2000 da revista Forbes, a maior empresa de capital aberto por ativos no mundo atualmente é o Banco Industrial e Comercial da China (ICBC), um banco estatal chinês. O ICBC é seguido no ranking por outro banco estatal chinês (Banco Agrícola da China), depois por outro (Banco de Construção da China) e depois por outro (Banco da China). Em quinto lugar está o JPMorgan Chase, de Wall Street. É bem conhecido que o setor bancário na China – o maior do mundo até o momento – encontra-se majoritariamente sob controle do governo. E, no entanto, desde a ascensão de Xi Jinping à liderança do país, em 2012, o Partido Comunista da China (PCCh) tem agido como se sua autoridade sobre as altas finanças ainda fosse insuficiente. Desde 2017, em particular, uma revolução vinda de cima tomou conta do setor financeiro da China, resultando em uma série de expurgos, prisões, a ocasional pena de morte, retificação implacável dos segmentos mais duvidosos dos mercados de capitais e – o que é mais significativo – a reordenação institucional no topo, transferindo a liderança operacional sobre o setor financeiro dos órgãos governamentais para o Comitê Central do PC Chinês.
O vigor com o qual Pequim disciplinou as finanças nos últimos seis anos era previsível. Essa mudança política foi sinalizada por uma reunião de estudos do Politburo sobre “salvaguardar a segurança financeira nacional” em abril de 2017, que antecipou uma Conferência Nacional de Trabalho Financeiro convocada em julho do mesmo ano. Em ambos os eventos, Xi Jinping enfatizou o imperativo de lidar com o risco financeiro, declarando que “a segurança financeira é uma parte importante da segurança nacional”. Com relação ao papel específico do PCCh nas finanças, ele pediu o “fortalecimento da liderança do partido sobre o serviço financeiro” e a “manutenção da liderança centralizada e unificada do Comitê Central”. Desde então, esses ditames cuidadosamente medidos têm sido examinados em grupos de estudo de quadros e reiterados inúmeras vezes na mídia oficial.
Em nível institucional, a conferência de 2017 decidiu criar uma Comissão de Estabilidade Financeira e Desenvolvimento (FSDC) subordinada ao Conselho de Estado (governo central da China). Instalada no Banco Central, mas não subordinada a ele, a FSDC foi encarregada do “projetamento de alto nível em questões financeiras, uma frase intimamente associada à era Xi. Acima de tudo, o objetivo era orquestrar de forma mais eficaz o trabalho das agências reguladoras financeiras e do Banco Central, cuja ação descoordenada teria agravado a crise do mercado de ações de 2015. O vice-premiê Liu He, braço direito de Xi em assuntos econômicos na época, dirigiu a FSDC de 2018 até sua dissolução, em 2023.
As contradições porque passa a economia chinesa revelam sua característica básica de uma economia pujante, mas que não pode ocultar mais seu caráter capitalista. O que garante essa pujança é a existência de um setor estatal que se contradiz e se impõe ao setor capitalista, impede a financeirização da economia, controlando politicamente seus bilionários. Trata-se de um equilíbrio imperfeito e contraditório, que, por outro lado, se assenta sobre o domínio também da classe operária, impedindo o desenvolvimento de sua consciência e combatividade. Não se trata de uma bomba relógio como quer Biden, mas é um gigante que tem uma economia explosiva que só pode se desenvolver plenamente se um processo efetivamente revolucionário eliminar completa e definitivamente o poder econômico da burguesia.