Neste sábado, 4 de fevereiro, a vereadora do PT, Maria Tereza Capra, vereadora de Miguel do Oeste, no estado de Santa Catarina, teve seu mandato cassado com a justificativa de que ela teria, segundo aqueles que aprovaram a cassação, quebrado o decoro parlamentar.
A decisão teve clara ligação com a postagem da vereadora em suas redes sociais, na qual Maria Tereza denunciava uma saudação nazista feita por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro na porta do quartel do Exército do Município, após o ex-presidente ter sido derrotado nas eleições.
A vereadora cassada deu uma entrevista ao portal de notícias CartaCapital, apontou a injustiça dos demais parlamentares da Câmara de sua cidade e afirmou que o gesto nazista não deve ser banalizado.
Ela disse: “Recebi [a decisão] com muita indignação e com sentimento de injustiça”, reforçou. E acrescentou: “Embora eu soubesse, pelo comportamento dos vereadores, qual seria o voto deles. É uma Câmara bolsonarista. Dos 13 vereadores, 11 são declaradamente bolsonaristas”
Ela também afirmou continuar lutando pela recuperação de seu mandato e na luta contra esse processo repressor e de cunho golpista.
“Estou trabalhando para recuperar o mandato. Já estamos estudando as medidas cabíveis”, acrescentou Maria Tereza à reportagem. [No processo], nós entramos com toda a possibilidade de defesa para que eles [os vereadores] compreendessem, mas não teve jeito”.
A publicação nas redes sociais com a denúncia fez com que Maria passasse a ser alvo de ataques e ameaças, de tal maneira que ela precisou deixar São Miguel do Oeste, além de passar a receber escolta da PF. O ministro dos Direitos Humanos de Lula, Silvio Almeida, decidiu incluir nesta quarta-feira a vereadora no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH).
A ex-vereadora afirmou que a cassação decorre de uma perseguição política, tendo em vista que, com a vitória do Presidente Lula, ela poderia se candidatar a prefeita no ano que vem. “A minha manifestação no Instagram foi apenas a ‘bala de prata’ para eles”, disse a vereadora que denunciou os gestos nazistas.
O irônico de toda a situação é que Maria Tereza foi acusada pela Comissão de Inquérito do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar de “propagar notícias falsas e atribuir aos cidadãos de Santa Catarina e ao Município de São Miguel do Oeste o crime de fazer saudação nazista e ser berço de célula neonazista”. A situação expões os perigos do ‘controle da verdade’ por parte de instituições estatais supostamente democráticas e o atropelamento do princípio de que todo poder emana do povo, tendo em vista que o voto popular foi desrespeitado, ferindo a soberania do povo de ter seu representante ocupando um espaço na câmara dos vereadores.
Todos os vereadores presentes votaram contra a vereadora. A votação ocorreu em sessão extraordinária e teve início na noite de sexta-feira, dia 3, e terminou cerca de 3h da manhã. Foram 10 votos pela condenação da vereadora, e um vereador tucano, Cris Zanatta, se absteve por não estar presente na sessão.
O evento, no qual as saudações nazistas foram feitas por uma multidão de apoiadores do ex-Presidente Bolsonaro, ocorreu no dia 2 de novembro, depois do segundo turno. Na gravação, pode ser vista a execução do hino nacional enquanto os manifestantes estendem seus braços direitos com a palma da mão virada para baixo. Uma clara referência aos gestos de “sieg Heil” feitos pelos nazistas em cumprimento a oficiais ou homenagem ao “Füher”, Adolf Hitler.
“Além de tudo, esses manifestantes ainda fizeram uma saudação nazista. Erguer a mão naquela posição, isso é repetir algum dos momentos mais dramáticos, eu diria o pior drama que a população mundial viveu”, disse a vereadora em seu texto do Instagram.
O Ministério Público de Santa Catarina interpretou que não se tratava de um caso de apologia ao nazismo. Segundo o órgão, a investigação foi feita de forma célere e prioritária. Vale lembrar que Santa Catarina é um dos Estados com maior número de células nazistas no Brasil. A antropóloga Adriana Dias, doutora pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisadora do tema, monitora, há 18 anos, movimentos de células extremistas de direita no país e acredita que Santa Catarina só perca para São Paulo em número de células neonazistas.
De acordo com Adriana Dias, o Estado tem atualmente 85 células neonazistas organizadas em ação. Em junho, seu estudo indicava serem 69 — ou seja, em quatro meses houve um crescimento de 23%.
A denúncia se apresenta, na realidade, como motivada estritamente por motivos políticos. Por denunciar a direita, Maria Tereza sofreu uma retaliação, perseguida politicamente por seu posicionamento. A denúncia não tem absolutamente nada a ver com fake news, e, mesmo que tivesse, a permissão de uma cassação por uma publicação nas redes sociais da vereadora sob pretexto de ser uma mentira é extremamente antidemocrático.
O que isso nos revela é o tratamento que a burguesia vai dar ao PT daqui para frente, com políticas que boa parte da esquerda se engana em apoiar, acreditando que as instituições estatais tenham a capacidade para punir os golpistas e proteger o trabalhador do “fascismo”. Os fascistas estão no Estado repressivo, que age em interesse da burguesia. O fortalecimento da possibilidade do Estado de transgredir o voto democrático, censurar, cassar ou qualquer coisa do tipo, é um retrocesso para o interesse da classe trabalhadora, pois é o pobre trabalhador que realmente sofre com as consequências da lei sob o capitalismo.
Os artifícios criados para o combate de notícias falsas – fake news – serão o pau para bater em Chico que vão bateu em Francisco. A esquerda será a verdadeira afetada, assim como será afetada com a aprovação de mais medidas repressivas e pautadas na censura.
Isso demonstra, também, que uma parcela grande da direita é bolsonarista, que os bolsonaristas estão liderando a oposição ao PT, e já estão indo para cima. Podemos observar isso analisando os votos contra a vereadora, todos os partidos da direita votaram por sua cassação, mostrando a composição real e alinhamento da direita supostamente civilizada. Cai por terra a crença de que o judiciário pode parar o fascismo, e cairá em breve a vã crença em uma aliança com a “direita democrática” da qual a esquerda pequeno-burguesa tanto fala. A direita e a burguesia agora se alinham ao bolsonarismo e aos generais, os quais são aqueles que montarão o bloco contra o governo do PT e a favor do golpe.
Em nota, a bancada do PT na Câmara dos Deputados repudiou a decisão dos vereadores.
“Trata-se de uma arbitrariedade e de clara perseguição política”, declarou ela. “Há evidências de parcialidade dos vereadores que conduziram o caso, bem como de falhas e vícios do processo. É inadmissível que tais fatos ocorram num momento em que o Brasil luta para resgatar a democracia e o Estado de Direito”.