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Caso Nikolas Ferreira

Casagrande defende derrubar no “tapetão” deputado mais votado

Na falta de argumentos, comentarista pede ao Estado a censura e cassação

No último dia 11, o comentarista e colunista de futebol, Walter Casagrande Jr. aventurou-se a dar seu pitaco sobre política, publicando o artigo “Discurso transfóbico de Nikolas Ferreira jamais será liberdade de expressão”.

O próprio título da coluna já revela o nível da discussão que está sendo proposta. Um discurso qualquer, seja com qual adjetivo podemos qualificá-lo, é apenas um discurso, concordemos com ele ou não. A liberdade de expressão é apenas o direito de se fazer esse discurso. Se não há esse direito, há censura.

O que Casagrande quer dizer de um jeito atabalhoado é que o discurso de Nikolas Ferreira tem que ser censurado. Que o deputado não deve ter o direito de fazer seu “discurso transfóbico”, como diz o colunista da UOL/Folha de S. Paulo.

O problema é que as pessoas não querem chamar as coisas pelo seu nome: censura. Como Casagrande não quer abrir o jogo, talvez nem para ele mesmo, inventou uma frase que não faz sentido.

Colocada a discussão no seu devido lugar, vamos aos argumentos:

“Qual o limite para um deputado se pronunciar na Câmara dos Deputados?”, pergunta Casagrande. A resposta é bem fácil: não deve haver limite. A função primordial de um deputado, no Parlamento, por isso esse nome, é falar, ou seja, defender aquilo que bem entender. Quem votou num deputado votou para ele representar suas ideias políticas.

Por isso não deve haver limite nenhum. Embora a chamada “democracia” brasileira seja um remendo, justamente porque o regime político no Brasil não respeita os direitos democráticos essenciais do povo, um deputado deveria ser um pleno representante daqueles que o elegeram.

Casagrande continua afirmando que Nikolas Ferreira “vai para o lado oposto da democracia, da igualdade de gênero e do respeito às diferenças”. Isso até poderia ser verdade, embora nesse caso não seja. Mas também não daria para esperar nada muito diferente de um bolsonarista. O problema é que, independentemente das ideias que defende, isso não significa que ele não deva falar o que pensa no parlamento.

A liberdade de expressão é um direito democrático fundamental e se é assim deve valer para todos, inclusive para um discurso abertamente anti-democrático, a defesa de uma ditadura, por exemplo.

Em nome da democracia, Casagrande quer retirar o direito democrático de um deputado falar o que quiser. Muito irônico. Podemos ter certeza que censurar Nikolas Ferreira é muito mais próximo de uma ditadura do que o discurso do deputado bolsonarista.

Pior ainda, Casagrande quer que o deputado seja cassado por aquilo que ele falou. Ao problema da censura se agrega o da cassação. Ou seja, quer jogar no lixo os votos daqueles que elegeram Nikolas Ferreira. No tapetão.

Aqui é preciso explicar mais uma vez a diferença entre “democracia” e direitos democráticos. A primeira é a defesa de um regime político burguês que não tem nada de democrático, é a defesa de determinadas instituições desse regime, na maioria delas anti-democráticas. A luta pelos direitos democráticos é a luta para garantir que toda a população tenha direitos políticos e sociais fundamentais.

“Crime é crime, em qualquer local. Aliás, esse deputado nocivo à sociedade brasileira foi o mais votado nas últimas eleições, e tenho certeza que as pessoas não votaram nesse sujeito para isso.”

Casagrande quer o deputado mais votado nas últimas eleições cassado por uma decisão de meia dúzia de pessoas. Para justificar sua opinião essa sim antidemocrática, Casagrande se elege como porta-voz dos eleitores de Nikolas Ferreira: “não votaram nele para isso”. Como Casagrande tem certeza disso? Ele não sabe de nada!

Mais ainda, diferente do que diz Casagrande, boa parte da população brasileira, enganada ou não, em diferentes níveis, concorda com Nikolas Ferreira e por isso votou nele. No fundo, o que Casagrande quer fazer é retirar o direito de representação dessa parcela da população.

Cerca de 30% da população brasileira é evangélica. É óbvio que uma parte desses 30% acredita de alguma forma no que disse Nikolas Ferreira.

O problema não é reprimir todo mundo que emitir uma opinião reacionária, até mesmo porque isso seria inviável. O correto é travar uma luta política para convencer a população de ideias diferentes, de que a população LGBT, por exemplo, tem direitos como qualquer outra. Reprimir uma opinião reacionária, como quer Casagrande, que está apenas repetindo a ideia de um setor da burguesia, vai aprofundar essa opinião, não extingui-la. Pior ainda, vão se aprofundar entre os evangélicos e vão se espalhar para outros setores da população. Nikolas Ferreira, assim como outros bolsonaristas que estão sendo perseguidos, está ganhando legitimidade perante a população. Essa é a consequência da política de censura e repressão.

Esses movimentos identitários que, como Casagrande, querem censurar todo mundo que pensa diferente, mostra que não tem embasamento para debater ideias, por isso querem recorrer ao Estado para calar os outros. Não há argumentos, é tudo na base da força, usando a força do Estado burguês.

Como Casagrande escreve para um jornal da burguesia e está defendendo o que setores poderosos da burguesia defendem, ele se julga poderoso, ele quer a cassação, a censura e a repressão.

Proibir não impede ninguém de pensar nada. Se isso funcionasse, a ditadura militar teria sido eterna e perto da ditadura militar, os censuradores atuais não são de nada.

Falando sobre a liberdade de imprensa, Marx explica que se se proíbe alguém de falar alguma coisa, é preciso perguntar: quem vai proibir? Logicamente que serão os poderosos, as instituições do Estado burguês, que são poderosas. No fim das contas, os censurados serão os mais fracos.

Casagrande quer censurar o deputado. Mas vejamos onde isso pode parar. Uma parte do que foi falado pelo deputado coincide, por exemplo, com o que alguns movimentos feministas estão falando. Há um setor das feministas que não concorda com a ideia de que basta um homem dizer que é mulher que ele se transforma de fato em mulher e deve ser tratado exatamente como tal. Essa é uma opinião, concordemos ou não. Vamos reprimir também essas feministas que pensam assim?

As mulheres são metade da população, vamos impedir que elas falem, por exemplo: “olha, o trans não é mulher, é homem, essa ideia é machismo”. Vamos reprimir o movimento feminista que defende isso?

Segundo Casagrande e todos os que defendem a censura e a cassação de Nikolas Ferreira, não pode haver discussão a favor ou contra nada. Não pode haver opiniões divergentes, pois haveria assuntos que são dogmas.

É interessante que entre os próprios identitários, há a ideia de que haveria um “machismo estrutural”. Como fica isso? Quer dizer que se for em nome de que não se pode ser “transfóbico” pode-se ser machista? O que é ser transfóbico, afinal? Emitir uma opinião? Se for isso, deveríamos adotar um sistema que ninguém poderia falar nada, já que qualquer coisa é potencialmente ofensiva a outra pessoa.

O identitarismo é uma ideologia sem consistência, baseada em privilégios individuais ou de pequenos grupos. Tanto é assim que o mais reacionário da fala de Nikolas Ferreira não foi criticado.

O deputado diz que a mulher tem que ser dona de casa e viver para a família. Onde estão os defensores das mulheres para denunciar essa ideia, profundamente reacionária, que quer as mulheres como verdadeiras escravas domésticas? Muita histeria por conta da “transfobia” e pouca ou nenhuma palavra sobre isso. Essa ideia retrógrada, por exemplo, também deveria ser proibida? Na nossa opinião, não. Mas chama a atenção que os censuradores não tenham se preocupado com esse problema que diz respeito a algo muito material da vida das mulheres.

* Artigo modificado pela última vez às 16h08

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