Duas semanas se passaram desde o roubo do carro. Nós voltamos ao trabalho como de costume. Maga deixava o mercado na mesa. Joaquina guardava as encomendas. Eu deitava no sofá. E todos acompanhávamos o jornal de ontem de um canal pirata da tv. Nada de mais para uma vida a seis, cuja maior idade se igualava a quarenta e a menor, dezesseis. Mas nessa história, o significado maior está nas entrelinhas dos acontecimentos.
Ao mesmo tempo, em que éramos seis, um de nós valia por dois. Sua vida paralela que ainda será abordada nessa história é o elemento principal da minha narrativa.
Miguel saiu tarde em uma noite fria. Não levava casaco. Nada disse para nenhum de nós. Mas aquele era o dia do roubo. Um treino para uma prática que seria cotidiana. Deixou a casa em um de seus mistérios.
— Eu, mais dois do nosso grupo fizemos o trabalho naquele dia. Foi mal feito, por novatos. Por isso fui levado.
Isso foi o que me disse quase vinte anos depois. Nada falava sobre o seu grupo. Mas sabíamos que saia tarde para chegar cedo algumas vezes por semana. Algo que passaria despercebido se não fosse seu sumiço por mais de três anos.
Hoje sou velha. Passei pela vida ganhando nada mais que algumas reflexões. Era de se pensar que eu seria o principal dessa história. Mas pouco sei sobre a vida. Fui uma pessoa comum em todos os momentos importantes. Jamais me destaquei nos trabalhos claros ou escuros.
Miguel, por sua vez, fez muito mais. Sua ação na vida destacou-se como um exemplo para a casa. Descobrimos aos poucos o motivo do seu desaparecimento meses depois. Algumas pessoas estranhas passaram a rondar a casa. Fomos interrogados sobre seus trabalhos. Uma situação que deixou a mais nova de nós, Maga, desconfiada sobre a segunda vida de Miguel.
Mais tarde descobrimos. A forma foi peculiar. Veio ao conhecimento de todos um novo modo de seguir a vida. Ninguém estava convencido, mas fomos infectados pelo mistério.