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Bloqueio dos EUA

Bloqueio contra a Venezuela é mais grave entre as mulheres

As sanções impostas pelos EUA contra a Venezuela, que começaram a ser aplicadas em 2014, agravaram a crise econômica no país e contribuíram para piorar as condições de vida

  • Brasil de Fato

As sanções impostas pelos EUA contra a Venezuela, que começaram a ser aplicadas em 2014, agravaram a crise econômica no país e contribuíram para piorar as condições de vida da população. Os impactos do bloqueio, no entanto, foram sentidos de maneira mais grave pelas mulheres, segundo pesquisadoras.

Entre 2016 e 2019, Washington ampliou significativamente seu pacote de sanções contra Caracas e atacou diretamente a indústria energética venezuelana, principal fonte de recursos do país. O bloqueio contra a PDVSA, que praticamente impediu qualquer transação internacional da estatal petroleira, gerou um efeito cascata em quase todos os outros setores da economia.

Embora o governo tenha priorizado a área social nos orçamentos ao longo dos últimos anos e conseguido manter, com dificuldades, os mecanismos de auxílios financeiros, a queda dos ingressos reduziu drasticamente a capacidade de novos investimentos em programas sociais e serviços públicos.

“As receitas da PDVSA ou do Estado, produtos da venda do petróleo, diminuíram em cerca de 95%”, explica a socióloga venezuelana Ana Gabriela Salazar da ONG de direitos humanos Sures, que conduz estudos sobre os impactos do bloqueio nas condições de vida da população.

Ao Brasil de Fato, a pesquisadora destaca que o impacto das sanções nas políticas públicas tiveram maior incidência entre as mulheres, pois “fazemos parte de grupo em maior condição de vulnerabilidade, não somente por sermos mulher, mas também porque o sistema mundo e a sociedade global assim estão conformados”.

Além disso, a crise agravada pelas sanções deu origem a uma espiral inflacionária que resultou em baixa produtividade interna, perda de capacidade de importação e, consequentemente, um quadro de escassez de produtos básicos que impactou diretamente a vida das mulheres.

Apesar dos casos de escassez já não serem mais registrados no país, os anos de inflação elevada e o processo de dolarização informal geraram distorções cambiais que impactam diariamente os trabalhadores venezuelanos que têm seus salários constantemente desvalorizados.

Segundo a última Pesquisa Nacional sobre Condições de Vida, publicada pela Universidade Católica Andrés Bello (UCAB) em novembro do ano passado, 50,5% da população da Venezuela vive em condição de pobreza multidimensional. O indicador não mede apenas a pobreza relacionada à renda, mas também outros fatores como acesso à moradia, educação, emprego e serviços.

Suzany González, coordenadora do Centro de Estudos de Direitos Sexuais e Reprodutivos (CEDESEX) da Venezuela, explica que os impactos negativos das sanções na economia aumentaram a vulnerabilidade da mulher venezuelana, fenômeno classificado pela pesquisadora como “feminização da pobreza”.

“Como ocorre em outras partes do mundo, resultado da feminização da pobreza que o patriarcado gera, as medidas coercitivas empobreceram a população e, dentro da população empobrecida, as mulheres sofrem mais”, diz ao Brasil de Fato.

Segundo González, o fato de as mulheres serem predominantemente cuidadoras de crianças, adolescentes ou de pessoas idosas, também acarretou em uma deterioração nas condições laborais das venezuelanas.

“Ocorrem fenômenos como a dupla ou tripla jornada, porque as mulheres tiveram que buscar dois, três ou quatro trabalhos, em sua maioria precários e informais, para poder custear algumas de suas necessidades mais básicas, o que, claro, recrudesce as desigualdades por razões de gênero”, explica.

Saúde das mulheres

O setor da saúde foi um dos que mais sofreram as consequências do bloqueio, o que afetou diretamente a vida das mulheres. As dificuldades de acesso a métodos anticoncepcionais, assim como a outros medicamentos e exames ginecológicos, compõem o quadro da vulnerabilidade feminina na Venezuela.

A alta nos preços, a degradação dos salários e a recusa de várias empresas estrangeiras em fazer negócios com a Venezuela dificultou o acesso da população a itens e serviços básicos.

Segundo a ONG venezuelana Gênero com Classe, a dificuldade em obter esses produtos resultou em aumentos de casos de gravidez indesejada e infecções por doenças sexualmente transmissíveis.

“O acesso aos medicamentos antes do bloqueio acontecia em grande escala”, explica Ana Gabriela Salazar. “Qualquer mulher que não precisasse que os medicamentos anticoncepcionais fossem providos pelo Estado poderia consegui-lo por sua conta, sem que isso representasse um custo muito elevado”, diz.

De acordo com a Gênero com Classe, em 2012 a Venezuela havia alcançado acesso universal a métodos anticoncepcionais, já que o Estado cobria cerca de 23% da população através de programas de planejamento familiar e quem não era beneficiado tinha condições financeiras de comprar os itens em farmácias subsidiadas ou, até mesmo, por conta própria.

“Isso mudou totalmente a partir de 2014. A crise dos medicamentos anticoncepcionais foi muito sentida e é algo muito grave”, explica a pesquisadora da Sures.

Casos de mortalidade materna também aumentaram no país durante os anos de bloqueio. Segundo dados do Fundo de População da ONU, a taxa no país é de 120 mortes a cada 100 mil nascidos vivos, uma das mais altas da região. A Argentina, por exemplo, possui uma taxa de 74 a cada 100 mil nascidos vivos, e a Colômbia, 66,7 mortes a cada 100 mil nascidos vivos.

Legalizar o aborto na Venezuela

Todo o cenário de risco às mulheres gestantes e à população feminina em idade fértil deveria impulsionar o debate sobre a legalização do aborto, diz Suzany González. O atual Código Penal venezuelano prevê uma pena de seis meses a dois anos de prisão para a mulher que realizar um aborto. A prática só é permitida em caso de risco para a vida da gestante.

O CEDESEX e outros movimentos populares feministas elaboraram um projeto de lei sobre direitos sexuais e reprodutivos que pretende garantir o direito à educação sexual e o acesso ao aborto seguro, legal e gratuito. Além disso, os coletivos estão em contato com grupos de parlamentares da Assembleia Nacional para levar o projeto à discussão, mas, segundo González, falta “vontade política”.

“Imaginemos um contexto onde existem as medidas coercitivas dos EUA e outras limitações que o Estado venezuelano possui, além da crise educativa fruto da pandemia que torna mais difícil uma educação sexual; há também a crise no sistema de saúde e, além disso, temos o aborto completamente penalizado e, por isso, ocorre o que estamos vendo: altos índices de mortalidade materna e de gravidez não desejada entre crianças e adolescentes”, afirma.

Segundo o CEDESEX, hemorragias, infecções e abortos inseguros são as principais causas de mortalidade materna na Venezuela. Suzany González, no entanto, destaca que, “como o aborto está penalizado, muitos casos estão registrados como hemorragias ou infecções, porque assim os médicos evitam problemas”.

“Imaginemos, então, quantas mortalidades maternas os abortos clandestinos causam, sem contar aquelas mulheres que ficam com problemas graves de saúde”, diz.

A pesquisadora ainda garante que os movimentos e coletivos feministas do país estão empenhados em seguir pedindo o fim das sanções e, ao mesmo tempo, cobrando do Legislativo, de maioria governista, uma mudança na legislação que garanta o respeito aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.

“Existe um contexto muito crítico sobre o tema dos direitos sexuais e reprodutivos que nós sentimos nos feminismos autônomos e entre as companheiras nos feminismos populares, atentas à realidade das mulheres nas comunidades. Esse feminismo autônomo tem um enfoque político, mas também entende que deve exigir do Estado, pois nos preocupa muito que o aborto não esteja no debate político do país no mais alto nível”, afirma.

* A matéria não expressa necessariamente a opinião desse jornal

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