Faz 20 anos que os Estados Unidos da América adicionaram mais um crime na sua lista praticamente infinita. Em 13 de dezembro de 2003, 600 militares estadunidenses, componentes da força de ocupação do Iraque, realizavam a captura do líder iraquiano Saddam Hussein de uma casa no vilarejo de ad-Dawr, 140 km ao norte da capital iraquiana, Bagdá. Transcorriam então 269 dias da invasão sofrida pelo país árabe.
Na época, esta ação foi apresentada com a captura de um criminoso. Na verdade, Saddam Hussein estava procurando organizar a resistência ao golpe de Estado que sofreu com a invasão de uma coalizão de cinco países liderados pelos EUA.
Uma invasão criminosa, feita sob a alegação mentirosa de que era preciso destruir supostas armas de destruição em massa que o “ditador do mal” possuía. Uma mentira deslavada veemente defendida pelo general Colin Powell, por sua vez, um exemplo da utilidade real dos identitários. A única arma de destruição em massa que existia era a ocupação dos EUA.
Antes da invasão de 2003, em uma tentativa de derrubar o governo de Hussein sem realizar uma efetiva intervenção, o Iraque era submetido a um rígido regime de sanções econômicas aprovado pelo Conselho de Segurança da ONU, e duas zonas de exclusão aéreas, uma a norte e outra ao sul, ambas, à revelia de qualquer aprovação da ONU, portanto, do direito internacional. Frequentemente, bombardeios norte-americanos e britânicos cruzavam os céus do país, realizando ataques aéreos.
O bloqueio realizado pelos EUA ao Iraque, só na época do governo Bill Clinton (1993-2001), teria provocado a morte de mais de 500 mil crianças com menos de cinco anos, uma tragédia bastante aceitável para a falecida ex-secretária de Estado daquele governo Madeleine Albright (19372022).
Após a derrota do exército regular, a resistência iraquiana, principalmente o partido de Hussein, o Baath, adotou a estratégia da insurgência, com atentados suicidas a bomba e emboscadas. Por isso os EUA iniciaram uma caçada mortífera a fim de desbaratá-la.
Em julho de 2003, os invasores realizaram um cerco contra a cidade de Mosul, ao redor da casa onde se encontravam dois filhos de Hussein, Uday e Qusay Hussein, e um neto de apenas 14 anos, Mustafa e seu guarda-costa. Os quatro iraquianos enfrentavam um cerco feito por aproximadamente 250 soldados dos EUA, uma ação com quatro horas de duração onde os norte-americanos revelaram-se incapazes de capturá-los vivos. Praticamente, uma operação da PM nos morros do Rio de Janeiro.
Embora tenha servido ao imperialismo em um determinado período, Saddam Hussein nacionalizou vários setores da economia, em especial a exploração do petróleo e aproveitando-se da alta dos preços, estabeleceu vários programas de bem-estar social. Implementou uma campanha de erradicação do analfabetismo, além de estimular a educação obrigatória e gratuita, incluindo as universidades, além de garantir saúde gratuita para a população e distribuir subsídios para os agricultores.
O esforço para erradicação da alfabetização valeu o prêmio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura em 1982. Algo que pode surpreender os identitários, o governo de Hussein seguia uma linha secular para superar as divergências religiosas entre sunitas, xiitas e curdos.
Segundo o artigo do sítio PeaceWoman, de 19 de março de 2013, antes da “libertação norte-americana”, as mulheres eram parte integrante da economia iraquiana e ocupavam altos cargos nos setores privados e públicos com direitos como “a igualdade de remuneração, seis meses de licença maternidade remunerada e proteção contra assédio sexual”.
Estas conquistas foram completamente destruídas a partir da invasão de 2003, uma vez que a constituição iraquiana promulgada em 2005 estabelece que ela não pode contrariar o Islã.
O ataque a soberania iraquiana se aprofundou com a captura de Hussein, pois ele se rendeu ao ser encontrado. Deveria ter sido tratado como prisioneiro de guerra, mas as imagens divulgadas naquela ocasião não só o humilhavam, mas também ao povo iraquiano.
Após de três anos de cativeiro, em 30 de dezembro de 2006, Saddam Hussein foi enforcado após um julgamento por tribunal montado pelo governo provisório composto por aliados iraquianos dos EUA que possuíam em torno de 150 mil militares para combater a insurgência.
Atualmente a economia iraquiana é quase toda privatizada. A ocupação norte-americana possibilitou a implementação de um extenso programa neoliberal e a venda de todas as empresas e o controle dos recursos econômicos para estrangeiros e principalmente empresas estadunidenses e seus aliados.
Logo em 2003 foi determinado que o Banco Central Iraquiano ficaria independente do governo. Em 2022 a dívida pública estatal iraquiana em US$ 114,39 bilhões de dólares, o que representa 43,3% do PIB do país atrasado. Oficialmente a taxa de desemprego estaria em 16%, o dobro de 2002.
Passados 20 anos da captura de Saddam Hussein, com a justificativa de defender a humanidade, os EUA e a Europa demonstraram, na prática, que nenhuma tirania consegue ser pior do que a do imperialismo.