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Uma suspeita "indignação"

Qual a natureza das manifestações após a morte de Moïse?

O que pedem os supostos justiceiros do jovem congolês?

A dita “invasão” de uma igreja em Curitiba pelo desconhecido Coletivo Núcleo Periférico, ocorrida na segunda-feira (7) durante uma manifestação de protesto contra a morte do congolês Moïse Kabagambe, repercutiu em todo o País, despertando críticas e elogios. A posição deste Diário, que pode ser vista em matérias como “O jogo identitário: divisionismo e diversionismo” e “Ação simbólica, fachada para quem não quer fazer nada”, é clara: trata-se de uma política reacionária, que nada tem a ver com a esquerda.

Entre vários debates interessantes sobre a tática e o programa da esquerda frente à luta contra a extrema-direita, o Estado e o regime golpista em geral, o caso também pôs em evidência um ponto que merece a máxima atenção: qual o conteúdo dos atos de “protesto” contra a morte do congolês Moïse Kabagambe?

O próprio caso curitibano já ajuda bastante a esclarecer o problema. Vejamos a declaração de uma das pessoas apontadas pela Folha de S.Paulo como liderança da ação:

Aí gerou uma discussão, um debate, porque é a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de São Benedito. Uma igreja construída pelos pretos e para os pretos, em 1737, durante a escravidão, porque os pretos não podiam entrar em outras igrejas, reservadas aos brancos na cidade de Curitiba. Essa igreja tem um poder simbólico, uma representatividade, é imbuída de um sentido histórico.

A preocupação dos setores envolvidos na manifestação é, portanto, com a “luta simbólica” contra aquilo que representaria a opressão do negro. Uma “luta”, portanto, abstrata — e, finalmente, inútil. Esse tipo de “luta”, que não passa de uma ação de propaganda, tem como base a ideologia identitária, segundo a qual a libertação dos oprimidos não viria de sua luta contra seus opressores, mas sim de mudanças culturais, de costumes e — pasmem — de opiniões.

E para que serve substituir uma luta real, como a do negro oprimido pela polícia que pede o fim da polícia, por uma “luta simbólica”, como a do manifestante contra a história da construção de uma igreja? Só pode servir ao próprio opressor, pois manterá o seu poderio inquestionado.

Esse é o caso, inclusive, do próprio caso Moïse Kabagambe. O prefeito do Rio de Janeiro, o golpista Eduardo Paes (DEM), contra quem toda a esquerda deveria estar lutando, não foi alvo de um único cartaz daqueles que protestavam contra sua morte. Ao culpar a “sociedade”, o “racismo estrutural”, a “xenofobia” e demais abstrações, acabaram permitindo que um amigo da repressão e dos ataques aos direitos trabalhistas e democráticos dos negros saísse “por cima” e ainda fizesse demagogia com a família e com os supostos ativistas, construindo um “memorial” para Moïse Kabagambe.

Por que os identitários escolheram a morte de Moïse Kabagambe para sua demagogia?

Assassinado no dia 24 de janeiro a pauladas, o congolês Moïse Kabagambe foi vítima de um crime brutal. Até onde se sabe, o rapaz foi a um quiosque de praia onde prestava serviço, sem um vínculo empregatício direto, e, ao cobrar o pagamento que lhe era devido, foi surpreendido pela ação do dono do estabelecimento e mais duas pessoas. O linchamento foi filmado e divulgado compulsivamente nas redes sociais.

A morte de um homem comum, que sofre como o povo brasileiro sofre, de uma forma tão bárbara e injusta, causa comoção. O que chama a atenção, no entanto, é: por que a comoção com esse caso em específico? Por que as chacinas diárias que acontecem nas favelas e são causadas pela Polícia Militar não desaguam em manifestações como as que se viu na última semana? Em termos de mortos pela polícia, teríamos mais de 6 mil motivos, de acordo com os dados oficiais, para sairmos às ruas em 2020…

A comoção nacional pela morte do congolês, portanto, nada tem a ver com o verdadeiro sentimento do povo. É uma comoção que está sendo estimulada pela própria burguesia para tentar influenciar o movimento negro. Isto é, uma vez que há uma revolta crescente contra as autoridades públicas diante da situação criminosa a qual os negros são submetidos, a burguesia apresenta, assim, um caso em que o povo pode se revoltar sem lhe causar grandes danos: o caso de um negro que não foi morto diretamente pelas mãos do Estado.

É possível apontar causas políticas para a morte de Moïse Kabagambe. A humilhação de cobrar um pagamento que não recebeu, por exemplo, pode ser colocada na conta da reforma trabalhista e de todas as barbaridades que a direita golpista fez contra a CLT no último período. A brutalidade de agredir uma pessoa indefesa em público, por sua vez, pode ser colocada na conta da campanha reacionária e fascistoide que a burguesia fez para impulsionar o golpe de Estado, apoiando linchamentos e fazendo a famigerada propaganda do “bandido bom é bandido morto”. Há quem diga, inclusive, que um dos assassinos de Moïse Kabagambe seria um ex-policial militar, o que reforçaria a tese de que a Polícia Militar é uma corporação mafiosa, que nada tem a ver com a luta “contra a criminalidade”. No entanto, como não há o envolvimento direto do Estado e como a burguesia e os identitários fazem questão de esconder qualquer indício nesse sentido, o caso se apresenta como uma manobra em potencial.

Com a campanha da imprensa burguesa — e há muita campanha —, o caso acabará aparecendo como um crime “da sociedade racista”, e não dos verdadeiros inimigos do povo negro. Para ver que a burguesia está investindo em peso em tal campanha, basta ver o comportamento de órgãos como O Globo, a Folha de S.Paulo, o Estado de S. Paulo e até mesmo a revista Veja. Esses mesmos veículos, propagandistas número um do golpe de Estado e da destruição das condições de vida da população, que noticiam como “troca de tiros” os assassinatos causados pela polícia nas favelas e que apoiaram integralmente o Projeto Anticrime do ex-ministro Sergio Moro, se mostram solidários aos protestos.

E o investimento não é à toa. É uma tentativa de corromper, de cooptar a esquerda para seus interesses. Uma esquerda que sai às ruas achando que o melhor a se fazer é denunciar a “xenofobia” na ONU, criticar o “racismo estrutural” e dizer que “vidas negras importam” vai ser incapaz de lutar por reivindicações concretas. Não sairá às ruas pedindo o fim da Polícia Militar, o livre vestibular, a restituição dos direitos trabalhistas, o fim do sistema prisional etc.

Essa cooptação tem precedentes. Nos Estados Unidos, a burguesia não conseguiu agir como hoje faz no Brasil, de maneira preventiva. Colocou sua operação em marcha quando a crise já havia estourado. Lá, milhares de pessoas saíram às ruas em manifestações violentas pedindo o fim da polícia. Os protestos de fato preocupavam o regime, pois chegaram ao ponto de atear fogo em delegacias e de ameaçar a invasão da Casa Branca.

Para controlar o movimento, a burguesia então lançou mão de uma campanha identitária furiosa, desviando o foco dos protestos para a derrubada de estátuas (ou seja, protestos simbólicos, contra nada concreto, como no caso da invasão da Igreja). A derrubada das estátuas, junto com chavões como “vidas negras importam”, que não dizem nada de concreto, foram apoiadas pelas figuras mais direitistas do regime e ajudaram na eleição de um homem do aparato de guerra do imperialismo, Joe Biden, à presidência da República, com uma vice negra ─ Kamala Harris ─ que faz parte do grotesco e racista aparato de repressão norte-americano.

O que os organizadores das manifestações após a morte de Moïse Kabagambe tentam fazer é uma cópia barata e malfeita do que aconteceu nos Estados Unidos. Tentam se antecipar à revolta que está latente contra todo o regime e já procuram abafar a fúria do povo. Já indicam que de nada adiantará se voltar contra a direita: a mudança deve ser “simbólica”. Nos Estados Unidos, o efeito causado foi o de desmobilizar um movimento poderoso. De mandar para casa os mais combativos, aqueles que queriam justiça com as próprias mãos. No Brasil, querem desarticular um movimento que está maduro, mas que ainda não tomou forma. Querem impedir que saiam de casa os mais combativos, mostrando a eles que não vale a pena protestar, pois tudo o que a esquerda está disposta a fazer é uma bela de uma farofada.

Esse vínculo entre Brasil e Estados Unidos não deve ser visto como um mero acaso. Os mesmos que desmobilizaram a revolta nos Estados Unidos são os que querem impedir a revolta no Brasil. São os capitalistas, os banqueiros, os tubarões que roubam toda a população e mantêm seu poder na base do chicote. E por isso, estão dispostos a tudo para repetir a operação em todos os países do mundo.

No Brasil, é de se notar que as mesmas organizações que se dizem expressão do movimento negro, são, todas elas, diretamente ligadas à burguesia imperialista norte-americana. São grupos como a Coalizão Negra por Direitos, que são diretamente financiadas por Organizações Não-Governamentais (ONGs) que, por sua vez, são alimentadas pelo Departamento de Estado norte-americano, ou por bancos como o Itaú. São grupos financeiramente — e, portanto, intrinsecamente — ligados ao imperialismo e deveriam responder à esquerda por suas ações profundamente desmobilizadoras.

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