Muita gente acompanha a cobertura que a imprensa burguesa faz das ações militares russas na Ucrânia e fica sem entender por que ainda não apareceram as onipresentes tropas norte-americanas para resolver a situação. Afinal, não é incomum nessa imprensa a exaltação ao poderio bélico em conflitos onde os norte-americanos são caracterizados como “agentes da democracia” contra algum “ditador” mundo afora. Ora, se o que está ocorrendo na Ucrânia é um avanço do “mal”, por que os Estados Unidos apenas punem economicamente os “malvados” russos?
Assim como na derrota no Afeganistão diante do Talibã, a atuação dos Estados Unidos diante dos acontecimentos na Ucrânia sinaliza aos povos do mundo que seu carrasco está enfraquecido. A crise histórica do capitalismo, por mais que seja empurrada para os países atrasados, ainda assim respinga na população do país mais desenvolvido do planeta. Envolver sua população num esforço de guerra longe das suas fronteiras seria mais um fator de desestabilização do regime político norte-americano.
As recentes derrotas das tropas imperialistas no Iraque e no Afeganistão custaram milhares de vidas de cidadãos norte-americanos. Muito menos do que os iraquianos e afegãos massacrados durante e após as invasões, porém mortes que repercutem com grande intensidade dentro da população dos Estados Unidos. É seguro presumir que diante das Forças Armadas da Rússia, que reúnem algo em torno de um milhão de soldados na ativa e dois milhões na reserva, as baixas norte-americanas e europeias seriam muito maiores do que nas aventuras imperialistas no Oriente Médio neste século.
O imperialismo sabe também que não vale à pena desencadear uma guerra pela Ucrânia. Até porque essa guerra teria desdobramentos perigosíssimos, podendo se tornar mundial. E, como vimos tanto na I quanto na II guerra, seu desfecho significou uma crise abissal do regime imperialismo, com revoluções na Europa e no mundo todo. Naquela época, o sistema imperialista era mais forte do que hoje, portanto não é difícil de imaginar uma crise revolucionária ainda mais aguda após uma possível III guerra mundial. O imperialismo sabe disso e calcula muito bem seus passos para evitar uma situação semelhante, que poderia levar à ruína final do sistema.
A alternativa que temos observado, por fora da cobertura “oficial” da guerra, é o massivo envio de mercenários. Não se tratam de cidadãos comuns, jovens convocados para servir ao seu país, são soldados de aluguel, contratados por empresas privadas de segurança para fazer parte do serviço sujo contra as populações agredidas. Não por acaso, o governo russo já avisou em alto e bom tom que esses mercenários não serão tratados como combatentes legítimos, recomendando fortemente que não vão para a Ucrânia.
O uso dessa estratégia nas últimas décadas já é em si um sinal dessa fragilidade política que atinge os países imperialistas, pois se estivessem com a casa arrumada poderiam dispor de mais alguns milhares de vidas da sua população para terminar de encurralar militarmente a Rússia. Os mercenários têm em geral um bom nível de treinamento militar prévio, porém trazem consigo um custo econômico extra e uma disponibilidade menor em relação à população recrutável.
Por fim, cabe destacar que nem as sanções econômicas estão sendo fáceis de impor, pois não prejudicam apenas os russos. Até mesmo os países imperialistas europeus, que comem na mão do imperialismo norte-americano, têm aderido a contragosto às sanções pois vão gastar muito mais para importar matérias primas energéticas de outras fontes que não a Rússia. Países atrasados também terão que incluir mais prejuízos econômicos nas suas próprias crises internas para ajudar um imperialismo enfraquecido a esmagar um parceiro econômico do tamanho da Rússia.