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Antônio Vicente Pietroforte

Professor Titular da USP (Universidade de São Paulo). Possui graduação em Letras pela Universidade de São Paulo (1989), mestrado em Linguística pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo (2001).

Literatura brasileira

O neorrealismo na literatura brasileira contemporânea

A literatura engajada ainda persiste na poesia brasileira contemporânea

capas

Em meio às interpretações do termo, vale a pena definir o que se entende por neorrealismo antes de recorrer ao conceito; em linhas gerais, contrariamente ao realismo, de viés burguês e positivista, o neorrealismo tem inspiração marxista, portanto, nele são tematizadas as causas operárias contra a ditadura dos valores burgueses. Não se pretende a partir disso separar escritores em reacionários e revolucionários, as relações entre literatura e política nunca são simplistas, todavia, mediante o estudo dos temas tratados em verso e prosa, é possível analisar as variadas políticas da literatura.

Nos países explorados pelo imperialismo – a etapa superior do capitalismo, segundo Lênin –, há contradições insuperáveis entre três instâncias sociais: (1) a economia agrária baseada no latifúndio e na mão de obra camponesa; (2) a burguesia nacional baseada na exploração do proletariado nacional e em busca da industrialização; (3) a burguesia imperialista baseada na exploração das burguesias nacionais e do proletariado mundial. Assim, por serem exploradas pelo imperialismo, as burguesias nacionais nunca conseguem terminar as revoluções burguesas nos países atrasados, sempre divididos entre a indústria e o latifúndio, incapazes de concorrer contra os monopólios dos bancos internacionais e da burguesia multinacional. Ora, nesse estado de industrialização precária e incompleta, acentuam-se as contradições sociais do proletariado, cujas causas expressam-se em sindicatos, partidos políticos etc. e na arte literária dos autores engajados. Dessa forma, por ser país explorado pelo imperialismo internacional, há no Brasil um neorrealismo permanente, pois não são superadas as contradições políticas entre a burguesia, o campesinato e o proletariado; elas sequer são resolvidas embora, durante alguns breves períodos de políticas reformistas, haja a falsa impressão da literatura política no Brasil estar superada em função de outros temas.

Por tudo isso, poetas brasileiros contemporâneos ainda jovens, por exemplo Bellé Jr. e Bruno Molinero, fazem poesia social. Bellé Jr., no livro “Trato de levante”, 2014, narra uma ocupação de terra em que relações amorosas ganham novos sentidos durante o movimento político, entremeando-se trechos em prosa e em poesia, entre eles, estes versos:

o poeta que amo é comunista
não tenho dúvidas sobre meu coração anarquista
e assim seguimos de versos dados

apertamos o caudilho e disparo
meu pássaro negro vara a tempestade
num desespero libertário de vida
e de morte

rima no poente sangue de nosso povo sulamericano
as tintas sílabas em teu vermelho de oceano
rebelde que nunca se rende
não sei se somos
ou nos tornamos

tua poesia tem densidade de cobre
verve vulcânica aflora na altura dos andes
pura lava de copihue
que lavra
a brava terra mapuche

Enquanto Bellé Jr. dá voz ao campesinato e às comunidades nativas da América do Sul, Bruno Molinero, no livro de poemas “Alarido”, 2015, verte em poesia as impressões do proletariado em suas desventuras, simulando vários narradores, todos eles operários; eis o poema “Salete, 66, centro de atenção psicossocial álcool e drogas III”, quem assume a voz:

como estão os répteis?
sacodem as inexoráveis
escamosas
patas pela sala?
e os demais tortos
insondáveis
sempre deitados
nas saliências sinuosas
ainda seguem
salutares
inoxidáveis?
os répteis da somália
onde estão?
bocas cheias de cáries
e gengivas incipientes
segregados
dos novos répteis da sarjeta?
e os toscos ascos
santificados
pelas sementes do sussurro
do socorro
do insano
sentados com os velhos
répteis sintomáticos
sibilantes de sovina
e soltos pelos cantos
onde estão?

silêncio
os répteis sopram
segredos

Os livros do Bellé Jr. e do Bruno Molinero são encontrados na Editora Patuá: https://www.editorapatua.com.br/

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*As opiniões dos colunistas não refletem, necessariamente, as deste Diário.

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