O inquérito das assim chamadas “fake news” tem por base o questionamento de Bolsonaro acerca da lisura do processo eleitoral. O atual presidente tem levantado suspeitas sobre a segurança das urnas eletrônicas, o que, segundo especialistas em tecnologia, não é nenhum absurdo, como se pode ler em matéria publicada há um ano pela insuspeita Folha de São Paulo.
Segundo a reportagem, apenas três países do mundo usam urnas eletrônicas sem comprovante impresso, a saber, o Brasil, o Butão e Bangladesh. Longe de acreditar que essas três nações detenham as mais desenvolvidas tecnologias, os especialistas são unânimes em reconhecer que, sim, a urna eletrônica é fraudável – essa é praticamente uma obviedade. Ao mesmo tempo, é claro, nenhum deles afirma que tenha havido fraude nesses três países, o que, aliás, não lhes cabe.
Mesmo assim, a imprensa faz uso reiteradamente de uma construção frasal um tanto capciosa. Jornais sempre afirmam que Bolsonaro suspeita das urnas eletrônicas “sem provas”. Ora, até onde se sabe, não é preciso ter provas para levantar suspeita sobre o que quer que seja. A suspeita é justamente a desconfiança, em geral baseada em indícios, mas nunca em provas. Se provas houvesse, passaríamos da suspeita para a certeza.
Segundo o entendimento do TSE e do STF, ao pôr em dúvida a inviolabilidade da urna eletrônica, sugerindo que teria havido fraude na eleição de 2018, Bolsonaro produz “fake News” e atenta contra o Estado de Direito. Sabemos que Bolsonaro venceu a eleição, mas, segundo ele, a vitória deveria ter ocorrido no primeiro turno. Bem, jamais saberemos se ele tem razão, mas tudo não passa de conjectura. Qual seria o crime?
Os tribunais brasileiros afiançam, igualmente “sem provas”, que as urnas são confiáveis e que estariam imunes à fraude. Somos, afinal, um dos três países do mundo que adotam esse sistema sem um comprovante. Esse fato, em si, já seria suficiente para nos deixar com a pulga atrás da orelha. Mais encafifados ainda ficamos diante da defesa apaixonada do sistema empreendida pelos ministros do TSE e do STF, com os quais faz coro a imprensa (inclusive a dita “progressista”, que se limita a se contrapor a tudo o que venha do espantalho Bolsonaro).
Bolsonaro afirma que o STF tirou Lula da prisão para favorecer sua eleição em 2022 mediante fraude. Nesse ponto, a análise do presidente parece muito ingênua. Devemos lembrar que o STF foi o responsável pela prisão de Lula e pela aparência jurídica do golpe de Estado que destituiu Dilma Rousseff. A corte, a mesma que manda para a cadeia um desesperado que subtraiu um frasco de xampu de um supermercado, está a serviço da burguesia – e esta, se não quer Bolsonaro, ainda menos quer Lula. Resta saber o que virá pela frente.
Enquanto isso, o discurso da moderação, um dos lugares-comuns da retórica, é propalado aos quatro ventos. Criminalizam-se os extremos, as posições radicais, todos aqueles que afrontam o status quo, como se o desenho das instituições fosse uma criação sagrada, que só blasfemos ousassem questionar. Ao atrevimento destes, volta-se a ira divina dos magistrados, que, embora se portem como reis, proclamam a defesa da “democracia”, esquecendo-se de que a democracia é o governo do povo. Por que o povo não teria o direito de questionar o efetivo funcionamento das instituições que deveriam protegê-lo?
Fato é que o STF demonstra ter medo de uma rebelião popular “incitada” seja pelo “gabinete do ódio” de Bolsonaro, seja pelo Partido da Causa Operária. Dessa forma, atua para calar a voz daqueles que, de uma forma ou de outra, questionam o sistema.
É bastante curioso esse meio de autodefesa, sobretudo quando consideramos que, para criar o “apoio popular” ao golpe de 2016, a imprensa como um todo, à maneira de uma grande orquestra, demonizou de todas as maneiras, diuturnamente, o Partido dos Trabalhadores. Pode-se dizer que “incitou” a população a acreditar no processo-farsa levado adiante por um juiz desonesto que, tão logo Bolsonaro se elegeu, largou a carreira para virar seu ministro.
Infelizmente, as instituições “democráticas” chafurdaram no golpismo e hoje lançam mão do autoritarismo para tentar salvar o que restou da sua credibilidade. Se continuarem nesse caminho, em pouco tempo não restará nada, independentemente de tentarem calar a verdadeira esquerda do País.
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