Há cinco dias da eleição para a presidência da Câmara Federal dos Deputados, na medida em que a disputa entre o candidato de Bolsonaro, Artur Lira (PP-PB) e o de Rodrigo Maia, Baleia Rossi (MDB-SP) se acirra, a situação da esquerda é cada vez pior. Isto porque a esquerda parlamentar, após adotar a posição fisiológica – de entrar num bloco com DEM, PSDB e MDB para apoiar Baleia Rossi – e ter se desmoralizado bastante, ainda corre o risco de ficar sem os cargos.
Segundo a própria imprensa burguesa, em matéria publicada na Folha de SP. na segunda 25, Artur Lira (PP) reuniu 11 partidos (PSL,PL, PP, PSD, Republicanos, PTB, PROS, PSC, Podemos, Avante, Patriota), que somados possuem 259 deputados. Já Baleia Rossi (MDB), que é o candidato da frente ampla, da aliança da direita golpista com a esquerda parlamentar, também reuniu 11 partidos (MDB, PSDB, DEM, PT, PCdoB, PDT, PSB, Solidariedade, Cidadania, PV, Rede), que somados possuem 238 parlamentares.
Mas a conta não é tão simples, pois parlamentares de um mesmo partido, como o caso do PSL, que tem a maior bancada, não irão todos apoiar Lira, uma parte deles já disseram que apoiarão o adversário. Por outro lado, Baleia Rossi também não terá apoio de todos os deputados do DEM, de Rodrigo Maia, e de vários outros partidos. O governador fascista de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), disse que sua bancada não votará num candidato dum bloco com PT e PCdoB. Por outro lado, parlamentares do PT que foram contra o apoio à direita golpista e que defenderam uma candidatura própria, provavelmente não votarão em Baleia Rossi também.
Isso implica que a esquerda, neste momento, além da desmoralização de ter fechado apoio a Baleia Rossi, ainda corre o risco de ter feito isso à toa, dada a possibilidade do candidato de Bolsonaro vencer. Esta situação ilustra porque nesta disputa entre dois setores do bloco golpista, a esquerda deveria ter apostado na luta contra os dois, explorando suas contradições internas. Mas sem perspectiva de luta alguma, a esquerda definiu apoiar os pais de Bolsonaro.
Toma lá, dá cá
As eleições da Câmara, que envolvem a cadeira de sucessão da presidência da República e o controle da pauta do Parlamento, é uma disputa complexa, que envolve uma das maiores máquinas burocráticas do País. Os interesses são dos mais variados, a maioria deles desconhecidos da população, e possuem níveis de fisiologismo, chantagem e manipulações absurdos. A disputa de cargos em estatais, liberação de verbas para obras, caixa de campanha futuras, é algo que deixaria qualquer cidadão comum constrangido. Como denunciou o próprio golpista Baleia Rossi, homem de Temer, o governo Bolsonaro, para pressionar ode deputados em favor de Lira, cortou cargos comissionados dos deputados que sinalizaram apoio a Baleia.
É neste antro de prostituição política, que a direita tradicional, o principal setor da burguesia no Congresso, o chamado centrão, viu-se na necessidade de se enfrentar com o candidato de Bolsonaro, um setor menor da burguesia: o baixo clero do centrão junto com a extrema direita. A diferença, no entanto, é que enquanto o centrão é um conjunto de políticos falidos, sem mais nenhuma base social, sem capital popular, os bolsonaristas tem alguma base social que lhe garantiu uma iniciativa dentro desta disputa.
Para combater o candidato de Bolsonaro, desta forma, a direita golpista precisou utilizar um capital político que não tem. Aí a necessidade usar a esquerda, que ainda tem alguma ligação com a população, como o caso do próprio PT, para fazer frente ao bolsonarismo.
O problema da direita, neste sentido, era criar um “bicho papão”, o “mal maior”, para criar um clima de pânico, de histeria, em que a esquerda seria chantageada a apoiar o bloco oposto (DEM, PSDB, MDB, PSL…), votando num candidato que não tem apoio popular nenhum, como o caso de Baleia Rossi. Foi assim que a direita fez um grande esforço para que o PT entrasse no bloco, até porque os votos do partido, que é a 2ª maior bancada (52 deputados) eram peça chave para fazer o centrão chegar no segundo turno.
No entanto, essa manipulação da frente ampla oculta o fato de que o regime político é o centrão, não Bolsonaro, que eles que de fato sustentam. De 2013 a 2016, período de preparação do golpe de 2016, Bolsonaro era apenas um deputado do Rio de Janeiro ligado às milícias do estado e que compunha o baixo clero da Câmara federal. Neste momento, o PSDB, de Aécio Neves, o MDB de Temer e Baleia Rossi, o DEM de Rodrigo Maia e Ronaldo Caiado lideravam uma campanha nacional histérica do “combate à corrupção”, que tinha como único objetivo desmoralizar o governo Dilma, o PT e a esquerda, para criar o clima para o golpe de Estado. Em 2014, nas eleições presidenciais, tentaram derrubar Dilma (PT) e impor Aécio Neves (PSDB) através da fraude eleitoral, mas não conseguiram, por pouco. No entanto, não se contentaram e mantiveram a campanha reacionária, que preparou o ambiente para o golpe de Estado de 2016.
Em seguida, este mesmo centrão apoiou a ascensão de Temer (MDB) e a ofensiva de seu governo, do programa da “Ponte para o Futuro”, contra os trabalhadores. O que inaugurou uma era de ajuste fiscal sem precedentes, congelando os investimento públicos, sobretudo em Saúde e Educação, por 20 anos e aprovando a reforma trabalhista, que destruiu a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).
Não por acaso, o governo golpista de Temer se tornou, até então, o mais impopular da história e o PT, que havia sido derrubado pelo golpe, à revelia do objetivo dos golpistas, fortaleceu-se como oposição. A população passou a pedir a volta do ex-presidente Lula, vendo-o como o opositor natural do regime golpista. Para resolver o este problema, não teve outro jeito, o centrão precisou tirar Lula da jogada a qualquer custo e teve que apoiar Bolsonaro, na falta de apoio popular da direita golpista.
Por isso, para combater Bolsonaro não se deve fortalecer a direita golpista/centrão, ou seja, aqueles que o colocaram no poder e contra quem o movimento contra o golpe lutou o tempo todo, especialmente de 2013 para cá. Fortalecer a direita, independente do pretexto, é fortalecer o regime golpista.
Nos Estados Unidos, por exemplo, ao colocar em xeque o regime político através da mobilização, expressa pela extrema direita, abalou-se o coração do regime, que é o bipartidarismo (Democratas e Republicanos), gerando uma crise que ameaçou quebrar a estrutura que sustenta o regime. Daí a direita tradicional, expressa por Biden, ter se oposto violentamente aos protestos liderados por Trump. Nos EUA, apoiar Biden contra Trump, é fortalecer o regime imperialista norte-americano, o maior opressor dos povos no mundo todo.
No Brasil, portanto, o apoio da esquerda à direita golpista implica ressuscitar um setor burguês que não tem onde se apoiar. A esquerda não deveria participar desse esquema para reciclar esses partidos. A tendência é que o centro não se recomponha e que a polarização se intensifique. É na crise do regime que a esquerda deve se basear, pois entre Bolsonaro e os pais de Bolsonaro, não há saída para a população. Se a esquerda se amarrar a esses partidos moribundos, vai cair junto com eles.