"Punição exemplar"

Feministas em defesa de Isa Penna ou do Major Olímpio?

Política carcerária da esquerda pequeno-burguesa identitária coincide com a da extrema-direita fascista

No início do mês de março, o Conselho de Ética da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aprovou a proposta de suspensão de Fernando Cury (Cidadania) por 119 dias. O deputado, representante do esgoto que é a direita nacional, apalpou, em público, as partes íntimas da deputada estadual Isa Penna (PSOL) sem o seu consentimento. Desde que veio à tona, o episódio ganhou enorme repercussão.

Foi com base neste caso que a e escritora Beatriz Bracher, membro de uma família de banqueiros ligados ao Itaú, decidiu financiar a campanha Por Uma Punição Exemplar, cujo sítio (porumapunicaoexemplar.com.br) permite o envio de mensagens para pressionar os deputados da Alesp pela cassação do deputado Fernando Cury. Junto com Bracher, fazem parte da campanha a gestora cultural Mari Stockler, o advogado Rafael Poço e Maísa Diniz, cofundadora do Vote Nelas, programa que supostamente serviria para incentivar a participação das mulheres na política.

A campanha de Beatriz Bracher segue uma tendência cada vez mais comum na imprensa capitalista e entre a esquerda pequeno-burguesa de tipo identitária, que é o uso de uma suposta “defesa da mulher” para justificar o aumento da repressão do Estado. Essa política, contudo, não tem absolutamente coisa alguma de progressista: visa fortalecer o aparato de repressão e empurra a esquerda, na prática, para uma frente única com a extrema-direita fascista.

A palavra de ordem de “punição exemplar” está na boca de cada um dos fascistas que sentem saudades da ditadura militar. Para citar apenas um exemplo do presidente ilegítimo Jair Bolsonaro, basta lembrar o que ele disse sobre o presídio de Pedrinhas, no Maranhão:

“a única coisa boa do Maranhão é o presídio de Pedrinhas. É só você não estuprar, não sequestrar, não praticar latrocínio que tu não vai para lá. Vai dar vida boa para aqueles canalhas? (…) Quando eu falo em pena de morte é que uma minoria de marginais aterroriza a maioria de pessoas decentes”.

Se a pena de morte ou o encarceramento em um presídio onde as pessoas são tratadas como animais não é uma “punição exemplar”, o que mais seria então? Embora Bolsonaro seja mais sincero nos seus objetivos, a mentalidade por trás da campanha de Beatriz Bracher é a mesma: os “bandidos” devem ser punidos duramente para que não haja mais crime.

No caso de Bolsonaro, a punição exemplar seria para defender os “pais de família”. No entanto, a mesma “defesa da mulher” que Beatriz Bracher faz uso também serviu de recurso para a extrema-direita. Quando o jogador de futebol Robinho estava sendo acusado de estupro, a ministra Damares Alves, do governo Bolsonaro, declarou:

“cadeia, imediatamente. Eu não tenho outra palavra para falar. Ainda cabe recurso, mas os vazamentos dos áudios, gente, querem mais o quê? Cadeia. Nenhum estuprador pode ser aplaudido. O cara quer voltar para o campo para posar como herói”.

Qual seria, então, o motivo de a extrema-direita e um movimento supostamente feminista estarem defendendo a mesma política? Seria que, tanto Damares Alves como Beatriz Bracher não acreditam que os crimes são um problema social, resultado da barbárie que é a sociedade capitalista. Damares e Bracher não concebem o mundo como dividido entre uma classe de parasitas que roubam tudo que o povo deveria ter e uma massa de despossuídos que vive uma vida desesperadoramente sofrida, mas sim entre “mocinhos” e “bandidos”.

O “mocinho” seria aquele que tem uma conduta de acordo com os preceitos morais estabelecidos pela classe dominante: aquele que não se revolta contra a miséria, que se contenta calado com as arbitrariedades da polícia, que tem quatro empregos em vez de roubar etc. Embora seja um critério abstrato, subjetivo, a moralidade corresponde, para a extrema-direita, a uma questão material: a classe média, que não é referência intelectual para ninguém, consegue ocultar boa parte de seus crimes através de sua posição privilegiada na sociedade. Por isso, o discurso da “punição exemplar”, embora seja bastante hipócrita, serve para que a pequena burguesia conservadora crie condições para reprimir aquela que tem como maior inimiga: a classe operária.

Já a esquerda pequeno-burguesa que defende esse tipo de política está cometendo um verdadeiro suicídio político. A esquerda deveria prezar pela defesa dos oprimidos. No entanto, se tem como programa a repressão daqueles que, por motivos materiais muito claros, acabam cometendo algum ilícito, a esquerda pequeno-burguesa tem como princípio entregar, nas mãos do Estado, todas as armas para atacar quem ela deveria defender. Sem falar que a maioria daqueles que acabam indo parar no sistema prisional não são culpados de crime algum…

A defesa da repressão generalizada contra o povo acaba sendo um pouco disfarçada porque a escritora não está defendendo a punição a um trabalhador, mas sim a um deputado direitista impopular. No entanto, está aí um erro grave. Não é possível pedir punição para um único indivíduo. Afinal, quando alguém, como Beatriz Bracher pede para que Fernando Cury seja punido, está pedindo, na verdade, para que o Estado o puna. E o Estado, por sua vez, cada vez que pune um indivíduo, ganha condições para punir qualquer pessoa que estiver envolvida em um caso semelhante. A diferença é que Cury, como um membro da burguesia, não deverá ser triturado pelo sistema penal. Mas os milhões de trabalhadores que sejam acusados do mesmo crime não poderão sequer pagar um advogado e serão, eles sim, vítimas de uma punição exemplar.

A esquerda pequeno-burguesa que segue o caminho apontado por Beatriz Bracher — isto é, o caminho preparado pelo Itaú — está, portanto, abraçando o programa da repressão. Se, por exemplo, os parlamentares do PSOL aproveitarem o caso para aprovar um projeto de lei, como tanto gostam, para que os acusados de assédio sexual sejam punidos exemplarmente, eles não estarão defendendo sua colega Isa Penna. Não só Fernando Cury não será o maior atingido, como, concretamente, a deputada nada tem a ganhar com uma punição exemplar. Somente quem tem a ganhar é o fascismo, que aproveita essas capitulações da esquerda para avançar no regime. Se tal lei avançasse, ela, para ser coerente com seu conteúdo, não deveria se chamar Lei Isa Penna, mas sim, para homenagear um direitista recém-falecido, a Lei Major Olímpio…

 

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