Um pedido de realização de aborto feito à justiça do Rio Grande do Sul foi negado. A adolescente, menor de idade, e sua irmã mais nova, de 13 anos, estavam sofrendo abusos sexuais de um rapaz e a mais velha das irmãs acabou engravidando.
O relato diz que as meninas não contaram para os pais pois estavam sendo ameaçadas pelo estuprador. Eles só ficaram sabendo no momento da gravidez.
No final, a autorização para o aborto não foi concedida à garota por “falta de provas”. Os argumentos eram que ela não tinha realizado um Boletim de Ocorrência — atitude completamente normal para quem está sendo ameaçado — e não estava agindo “de acordo” com as pessoas que passam por essa situação, ou seja, no olhar do juiz, ela não estava falando com incomodação ou com medo.
Algumas mensagens foram trocadas com a vítima e o estuprador, o que seria uma prova de que eles supostamente seriam próximos, o que indica que o caso foi mais um “descuido” do que uma violência. A mensagem se trata da jovem falando sobre métodos contraceptivos e alegando que não irá comprar vacinas pois as acha muito caras. Essa última colocação também faria parte de um comportamento “anormal” da vítima, uma vez que uma vítima “normal” iria atrás de todos os métodos possíveis.
O direito foi negado também por conta da demagogia tradicional da direita de “direito a vida” e de sobreposição da vida do feto em relação a vida da mulher. Em suma, proteger um feto não desenvolvido é mais importante do que proteger a vida de adolescentes abusadas e de uma família pobre que não terá condições de criar mais uma criança.
O caso evidencia a conduta direitista do judiciário que, em suas justificativas, afirmou que: Tirante o fato de ser uma gestação imprevista e indesejada para a sedizente vítima, a interrupção da gravidez não se justifica de forma alguma, pois o aborto é, em si mesmo, um fato dramático e implica condenar à morte quem não teve culpa de ser gerado, e cujos direitos merecem a especial proteção do Estado.
Por entender assim, penso que a autorização para o aborto traria para a recorrente danos psicológicos irreversíveis, além de constituir verdadeira e extrema violência a um ser em desenvolvimento e que, lamentavelmente, já está a sentir a marca da rejeição materna.
Lembro, por fim, que o filho, ainda que esteja no ventre da mãe e dela se nutra, tem uma vida própria, não sendo um objeto sobre o qual possa ela dispor livremente. Nem mesmo a possível violência que possa ter sofrido a sedizente vítima justifica essa nova violência que ela pretende praticar contra o feto, pois o atentado à vida é incomensuravelmente mais grave que o atentado que possa ter sofrido à sua liberdade sexual.
Ou seja, o relator consegue entender e prever melhor o que a garota vai sentir do que a própria garota que tomou a decisão de fazer um aborto. Além disso, ele frisa que a vida daquele feto tem mais importância do que o fato da garota ter sido abusada.
Muitas mulheres ainda morrem em decorrência de abortos clandestinos, que são os métodos disponíveis para a população pobre que não tem condições de criar um filho ou preferem não colocá-lo no mundo ao invés de fazer aquela criança crescer passando fome e sem poder estudar.
O Estado burguês não educa as mulheres, sobretudo as mais pobres, sobre o assunto, além de praticamente negar qualquer ajuda que facilitaria a criação dessas crianças, como creches públicas, moradia, saúde e alimentação, fazendo com que elas dependam da sorte.
Por isso, é preciso exigir que o aborto seja público e irrestrito, fazendo com que a mulher consiga decidir sobre o que fazer com o próprio corpo e não dependa do judiciário golpista para poder tomar um atitude.