Em meio a crise sanitária da pandemia do Covid-19 no Brasil, o desemprego bate recordes históricos, salários são congelados ou reduzidos, e o governo reduziu pela metade o valor auxílio emergencial das poucas parcelas que ainda pretende pagar. A população brasileira terá de enfrentar essa crise histórica com a inflação oficial elevadíssima e uma estimativa do Banco Mundial (BM) de queda no Produto Interno Bruto (PIB) 5,4%.
Para a trabalhadora doméstica, Quitéria da Silva Santos. “Isso é uma injustiça e um descaso porque o salário não aumenta, o auxílio diminuiu, os preços só sobem e somos obrigados a comer menos e mal para podermos sobreviver”.
Segundo o boletim econômico semanal do Banco Central (BC) “Focus”, publicado nesta terça feira-feira dia 03 de novembro, a previsão do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de até 3,02% para o restante de 2020 e de até 3,11% para 2021. O avanço de 0,94% foi a maior alta no IPCA para o mês de outubro dos últimos 25 anos, uma vez e meia o aumento oficial do IPCA em setembro que foi 0,64%, o maior para o mês desde 2003.
Metade da variação no IPCA foi devido ao aumento nos alimentos, entre janeiro e outubro de houve um aumento nos alimentos em geral de 9,75%. Se considerar apenas os itens comprados em supermercados para consumo em domicílio, o avanço em 2020 foi de 12,69%.
“A gente vai na feira numa semana e na outra o valor já subiu, e não são centavos não, é mais de um real. Os produtos que custavam três reais passaram para quatro, de quatro passa pra cinco e vai subindo desesperadamente. E quem é assalariado? O que tem o salário no mesmo valor, sem reajuste, não tem condição de se alimentar da mesma forma que se alimentava”, afirma Quitéria.
“Antes já estava difícil, quando a gente estava recebendo auxílio de R$600, e agora que diminuiu está muito mais difícil. Os alimentos que a gente considera saudáveis para certa idade, como brócolis e couve-flor, não podemos comprar e estamos vivendo mais com batata doce e ovo. E tem pessoas que nem estão conseguindo comer” complementar Quitéria.
A tendência de alta nos preço dos alimentos teve seu lastro principalmente em dois fatores, primeiro a demanda externa que tende a se manter. Segundo a taxa de câmbio, que nos níveis atuais é mais rentável a exportação, reduzindo a oferta doméstica.
O aumento do IPCA com maior contribuição dos alimentos, acarreta um maior impacto inflacionário nas famílias de menor renda. Na realidade quanto menor a renda da família, maior será a porcentagem dos rendimentos gastos com alimento e maior será a inflação de fato para essa família. Esse é o caso do dependentes do auxílio emergencial, trabalhadores informais e desempregados que viram sua renda ser diminuída drasticamente.
“Sem trabalho e com R$ 300 de auxílio não tem como comprar quase nada no mercado e ainda tenho que pagar o aluguel. Ninguém consegue comer mais nem frango, agora só ovo e olhe lá. Está tudo um absurdo e a gente ainda sem poder trabalhar. Tá bem complicado”, afirma a diarista Maria Domingas Araújo Santos.
Para Maria Andréia do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea): “Essas famílias vão ter que ir ao mercado de trabalho para complementar essa renda, ou realmente vão ter que fazer um ajuste (no consumo). Vão ter que deixar de lado outras coisas que estão consumindo para manter os alimentos em casa. Em algumas famílias isso é possível fazer, e outras vão passar necessidades”.
Os exemplos são amplos e toda a classe trabalhadora está sentido na pele a corrosão de seus salários pela a inflação, através do aumento dos preços de alimentos e aluguéis.