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A Batalha de Argel e Queimada!

Gillo Pontecorvo, mestre do cinema político

São 101 anos do nascimento de Gillo Pontecorvo, diretor italiano que discutiu em suas obras o colonialismo e o imperialismo e as formas de combatê-los

O cineasta italiano Gillo Pontecorvo é responsável por dois dos filmes mais políticos de todos os tempos: “Queimada” de 1969 e “A Batalha de Argel” de 1966. São filmes que discutem o papel do colonialismo e do imperialismo em países pobres e oprimidos e como suas populações reagiram a eles. Pontecorvo foi um homem de muitos talentos, fotógrafo, músico e jornalista, além de ativo homem político. Como cineasta foi influenciado pelo seu compatriota Roberto Rossellini e pelo russo Sergei Eisenstein. Foi um cineasta de poucas obras. Ele costumava dizer que só fazia um filme quando estava completamente apaixonado por um projeto e após uma extensa pesquisa.

Família burguesa

Gillo Pontecorvo nasceu em Pisa, Itália, em 19 de novembro de 1919. Gillo era o filho de um rico homem de negócios judeu, dono de três fábricas que empregavam mais de 1000 pessoas. Alguns de seus irmãos se tornaram importantes cientistas: Bruno Pontecorvo foi um físico nuclear famoso internacionalmente, Guido Pontecorvo era geneticista e Polì Pontecorvo, um engenheiro que trabalhava com radares na Segunda Guerra Mundial.

O próprio Gillo Pontecorvo também tinha interesse na ciência, entrando no curso de química da Universidade de Pisa, mas desistiu após apenas duas provas. Foi nessa época que tomou contato com a política, conhecendo professores e estudantes marxistas e militantes de frentes antifascistas.

Em 1938 o governo fascista de Mussolini decretou as leis raciais, uma série de leis que impunham a discriminação racial na Itália, dirigida especialmente contra os judeus italianos e habitantes nativos das colônias. Com o crescente sentimento antissemita Gillo resolve se mudar para Paris, onde seu irmão Bruno já vivia. Lá ele frequenta o meio dos exilados políticos italianos e o mundo cultural francês e começa a trabalhar como correspondente para algumas revistas e como instrutor de tênis.

Quando Paris cai sob o domínio dos nazistas Gillo e sua futura esposa, Henrietta, fogem para St. Tropez onde ele sobrevive das aulas de tênis. Lá conhece o músico René Leibowitz, que também vive exilado e começa a aprender a tocar o piano.

Começa a se envolver com o mundo do cinema e realiza alguns documentários curta metragem. Torna-se assistente do cineasta holandês Joris Ivens, um conhecido marxista que já havia dirigido filmes como “Rain” (1929), “The Bridge” (1928) e “Borinage” (1934). Gillo também trabalhou com o diretor francês Yves Allégret, famoso pelos seus filmes noir.

Em 1941 Gillo Pontecorvo se filia clandestinamente ao Partido Comunista Italiano e viaja para o norte da Itália para organizar a luta dos partisanos, os antifascistas italianos. Lá ele adota o pseudônimo de Barnaba e se torna o líder da Resistência no Piemonte e na Lombardia de 1943 a 1945.

Volta a Paris em 1945 e lá conhece artistas como Igor Stravinsky, Jean-Paul Sartre e Pablo Picasso, que lhe trazem novas ideias políticas e perspectivas.

Pontecorvo fica profundamente impressionado com o filme “Paisà” de Roberto Rossellini, um clássico do movimento neo realista do cinema italiano. Isso o motiva a comprar uma câmera 16mm e faz uma série de documentários de temática social como “Missione Timiriazev” (1953), “Porta Portese” (1954) e “Pane e Zolfo” (1959). Em 1947 ele se tornou diretor assistente de Aldo Vergano, além de também participar como ator no filme “O Sol Nasce de Novo”.

Pontecorvo rompeu seus laços com o Partido Comunista em 1956 após a intervenção soviética que esmagou a Revolução na Hungria. Ele nunca mais se associou a um partido, mas permaneceu fiel aos ideais marxistas.

O primeiro filme longa-metragem dirigido por Pontecorvo é “La Grande Strada Azzurra” (A Grande Estrada Azul), lançado em 1957, que conta a dura vida de um pescador pobre que vive numa pequena ilha na costa italiana.

Em 1959 faz o filme “Kapò”, um drama que aborda o tema do holocausto. Foi indicado ao prêmio Oscar de melhor filme estrangeiro. No ano seguinte faz outros dois documentários enquanto pesquisa o tema para o seu próximo longa-metragem. Ele examina pelo menos 33 projetos antes de se decidir. O projeto escolhido é o tema do filme mais importante de sua carreira, “A Batalha da Argel”.

A Batalha de Argel

O projeto que Pontecorvo escolheu tratava da guerra de independência da Argélia. “A Batalha de Argel” foi lançado em setembro de 1966, causando uma enorme controvérsia na França, sendo proibida sua exibição no país por cinco anos. Foi altamente aplaudido em todos outros países, recebendo inúmeros prêmios, inclusivo sendo indicado para vários Oscar.

O filme reconstitui os eventos que ocorreram na capital da Argélia, Argel, entre novembro de 1954 e dezembro de 1957, na guerra que os argelinos travaram para se livrar da ocupação colonialista francesa no país. Havia conflitos constantes entre os nativos insurretos e os pied-noirs (franceses nascidos na Argélia), com muitos atos de violência de ambos os lados. Por isso a França enviou tropas paramilitares, lideradas pelo General Massu e o Coronel Bigeard para confrontar a FLN, a Frente de Libertação Nacional. Para este fim os imperialistas franceses fazem uso aberto da tortura, prisões e assassinatos, enquanto a FLN faz uma guerra de guerrilha, como bombardeios em locais públicos.

O fim do filme mostra os franceses proclamando sua vitória, vencendo a Batalha de Argel, mas no final eles acabam perdendo a Guerra da Argélia. Pontecorvo usou apenas um ator profissional para seu filme, o restante era todo de argelinos, incluindo um verdadeiro comandante veterano da FLN, Saadi Yacef, que fez o papel do líder da FLN El-hadi Jafar.

Em 2003 o Pentágono fez uma exibição de “A Batalha de Argel” como exemplo a ser estudado pelos militares em casos similares como a ocupação americana do Iraque. Uma propaganda da exibição dizia: “como ganhar uma batalha contra o terrorismo e perder a guerra de ideias. Crianças atirando em soldados a queima roupa. Mulheres plantando bombas em cafés. Logo, toda a população árabe cresce em um fervor louco. Soa familiar? Os franceses têm um plano. Eles têm sucesso taticamente, mas falham estrategicamente. Para entender o porquê, vá a uma rara exibição deste filme.”

“A Batalha de Argel” foi filmado em preto e branco, dando a impressão de ser um documentário, tal o grau de realidade das cenas. Os cinemas americanos precisaram colocar um aviso de que não havia nenhuma cena de documentário ou noticiário no filme. A dramaticidade do filme foi realçada pela trilha sonora, escrita em conjunto por Pontecorvo com o maestro Ennio Morricone.

Queimada!

O próximo filme de Pontecorvo foi “Queimada!”, outro importante clássico do cinema político. Foi lançado em 1969, estrelado por Marlon Brando, que faz o papel de um agente provocador britânico. Os eventos do filme foram inspirados pela Revolução Haitiana que levou ao fim da escravidão e à independência do Haiti, além de eventos no Brasil, São Domingos, Jamaica e Cuba. “Queimada!” é um retrato acabado da época do estabelecimento do capitalismo e do livre comércio, que só podem existir com o fim da escravidão e implantação das novas relações de trabalho.

“Queimada!” é um drama que se passa em uma ilha fictícia no Caribe chamada Queimada, que segundo o filme recebeu este nome porque os colonizadores portugueses colocaram fogo na ilha para vencer a resistência dos habitantes locais.

Inicialmente o roteiro pretendia falar sobre o colonialismo espanhol em uma ilha do Caribe, mas este plano teve que ser alterado e Queimada se tornou uma colônia portuguesa.

O filme se passa em duas épocas distintas, começando em 1844. O império britânico envia o agente William Walker para Queimada, uma colônia portuguesa. O Reino Unido quer acabar com o monopólio português de açúcar na ilha para substituí-la pela exploração pela fictícia Companhia Real de Açúcar das Antilhas. O papel de Walker é organizar um levante dos escravos contra o regime português, que os britânicos planejam substituir por um governo dominado por brancos mais flexíveis.

Quando Walker chega a Queimada conhece José Dolores, um carregador de malas, que ele incita a liderar a revolta dos escravos. A revolta é bem-sucedida, mas a falta de informação e cultura de José Dolores, agora no poder, conduz à paralisação da máquina administrativa e econômica do estado. Com isso Dolores entrega o poder para a burguesia da ilha, representada por Teddy Sanchez. Dez anos depois Walker é contratado novamente para resolver os problemas em Queimada. Dolores, descontente com os rumos tomados pelo governo dominado pelos interesses britânicos lidera uma nova rebelião. Walker e as forças britânicas sufocam a rebelião e capturam Dolores, que é enforcado.

Mais uma vez a música do filme foi feita por Ennio Morricone, que criou uma trilha extremamente original onde ritmos africanos são combinados com cantos gregorianos.

Operação Ogro e últimos filmes

O filme seguinte de Pontecorvo veio apenas dez anos depois. “Ogro” (no original, “Operación Ogro”) é um drama baseado em fatos reais ocorridos na Espanha nos anos 70, com Gian Maria Volonté no papel principal.

“Ogro” descreve o ataque, conhecido como “Operación Ogro”, feito por quatro membros do grupo separatista basco ETA no dia 20 de dezembro de 1973 contra Luis Carrero Blanco, conhecido como Ogro. O grupo planejou o sequestro de Ogro para exigir a libertação de 150 prisioneiros políticos bascos. Quando Ogro se torna o Primeiro Ministro da Espanha sob o regime ditatorial de Franco os planos mudam e o grupo resolve colocar uma bomba sob o carro em que viaja Ogro, matando-o instantaneamente.

Daqui em diante Pontecorvo faz filmes apenas esporadicamente, apenas documentários. Ao longo dos anos ele considerou vários projetos, mas nenhum saiu do papel. Um dos projetos era “I Tempi Della Fine” (o tempo do fim do mundo), na qual Jesus Cristo seria retratado como um revolucionário marxista. Outro projeto seria sobre os conflitos sociopolíticos na Nicarágua.

Gillo Pontecorvo faleceu em 12 de outubro de 2006 aos 86 anos na Policlínica Gemelli em Roma por problemas cardíacos. Ele deixou três filhos, sendo que Marco Pontecorvo seguiu os passos do pai e também se tornou um cineasta.

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