A Alta Autoridade de Saúde (HAS), organização científica ligada ao governo francês, decidiu estender o prazo de sete para nove semanas para os procedimentos de aborto feitos em casa. Os procedimentos são feitos com receita de medicamentos para o aborto e também analgésicos que são ministrados pelas próprias mulheres em casa. A medida emergencial foi a solução encontrada para o problema das burocracias encontradas pelas mulheres nesta época de pandemia para realizarem o aborto em hospitais públicos.
A medida emergencial evidencia vários problemas. Primeiro, que o sistema de saúde francês está sofrendo as consequências de anos de neoliberalismo, onde o sucateamento e a falta de investimentos impedem que o governo francês consiga absorver toda a demanda de saúde diante da pandemia, dedicando todo o sistema única e exclusivamente para os casos de coronavírus, deixando de lado questões essenciais de saúde pública como o aborto. Segundo, as mulheres francesas estão sendo colocadas em perigo ao terem que realizar os procedimentos em casa sem o acompanhamento de um médico, muitas vezes tendo que realizarem os procedimentos sozinhas devido a quarentena, o que eleva ainda mais o risco de saúde em caso de complicações.
Além disso, as mulheres ainda estão encontrando dificuldades para conseguirem suas receitas para comprarem os medicamentos e realizarem o aborto, o que levou a HAS a autorizar que receitas sejam prescritas em teleconsulta, pois até mesmo em consultórios particulares as mulheres estão perdendo o prazo de sete semanas para pegarem a receita e realizar o procedimento.
Esse é mais um episódio em que a vida das mulheres não está sendo respeitada. O aborto não é um procedimento simples que pode ser realizado sem o acompanhamento médico, muitas vezes as mulheres que realizam seus abortos em casa precisam de um acompanhamento após o procedimento ou até mesmo chegam a ter complicações pois podem ter ministrado o remédio de forma errada ou não terem conseguido tomar todos os cuidados prescritos.
O aborto é uma questão essencial da saúde pública no mundo, e deve continuar sendo um direito garantido para as mulheres até mesmo em tempos de pandemia, afinal as mulheres não devem pagar pela falta de competência de gestão da saúde e as consequências de políticas neoliberais que só prejudicam o sistema de saúde disponibilizado para as trabalhadoras. O direito ao aborto deve ser uma responsabilidade do Estado e o mesmo deve garantir o procedimento e o acompanhamento em clínicas públicas, com todo o aparato necessário, para que as mulheres não tenham suas vidas expostas ao perigo ao realizarem o procedimento sem um acompanhamento médico.