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PM assassina

Entrevista exclusiva: mãe denuncia assassinato de seu filho pela PM

Lukas foi espancado até a morte por PMs na virada do ano de 2018 para 2019, na Zona Norte de Sorocaba

Na virada do ano de 2018 para 2019, o rapaz de 23 anos, Lukas, foi espancado até a morte pela PM da Zona Norte de Sorocaba. Apesar do fato ter ocorrido há pouco mais de um ano, a mãe de Lukas, Cecília, continua denunciando o caso e fazendo apelos para uma mobilização, em suas próprias palavras, com “amigos do Lukas, mães que sofrem pelo que eu to sofrendo e mães que, Deus me livre, que nunca sofra o que eu to sofrendo”.

Durante seu relato, Cecília descreve detalhadamente a perseguição da polícia ao rapaz: ele foi atingido por bombas, correu muito, foi espancado na frente da comunidade e dos familiares, foi acusado de atos os quais não cometeu e xingado de coisas como “lixo” e “desgraça”.

Apesar de ser encaminhado ao hospital, Lukas não resistiu e veio a falecer no dia seguinte, no dia 1° de janeiro de 2019.

Veja a entrevista ou leia o relato de Cecília, mãe de Lukas.

Entrevista com a mãe de Lukas, assassinado pela polícia, de Sorocaba.

Como a senhora se chama?

Cecília Aparecida Lopes

Você pode contar pra gente como que foi a situação?

Na virada do ano, 2018, o Lukas estava bebendo com os amigos dele, como qualquer moleque de 23 anos de idade, e de repente apareceu as viaturas, ele tava brincando com vários meninos na rua, ele tinha mania de gritar “ralf, ralf”, que era o apelido dele, mas ele fazia um tom de cachorro, aí os policiais não gostaram. O amigo dele falou assim: “Lukas, os cara não tão gostando”, ele falou: “não to fazendo nada demais! É apenas uma brincadeira”, e nisso que eles tavam fazendo essa brincadeira, os policiais não gostaram, desceram e foram armados pra cima deles. Todos eles correram. Todo mundo correu pra um lugar só, inclusive numa casa, e nessa casa tava tendo churrasco, que era da mãe de um dos meninos, e eles continuaram ali bebendo, brincando. 

Quando o Lukas falou assim: “não, eu tenho que ir embora”, isso era um pouco antes da meia noite, era umas dez e pouco, ele falou “eu tenho que ir embora, eu tenho que tomar um banho, trocar de roupa”. Os meninos falaram: “não, fica aqui”, ele disse: “não, não, eu vou embora”. Na hora que ele saiu, os próprios policiais que tinham corrido atrás deles estavam na rua. Correram atrás dele, meu filho correu muito, os policiais correram com arma em punho e o carro da viatura atrás, meu filho acabou se jogando dentro de uma escola, eles começaram a jogar bomba dentro dessa escola, meu filho saiu meio atordoado e quando ele tava chegando perto de casa, que era na esquina, meu filho não tava aguentando mais correr, tava cansado, meu filho começou a passar mal e caiu dentro da casa de uma vizinha, de uma amiga nossa, e quando ele caiu ele virou pra Patrícia e falou: “Pa, me socorre, eu não fiz nada”, porém os policiais já entraram chutando a cabeça dele e falando “ele fez sim!” e começou a chutar ele.

O menino dela entrou no meio e pediu: “pelo amor de Deus para de bater no barbi, para de bater” e eles: “não, tem que tem que matar!”, é o que eles fazem. E essa amiga minha falou pra eles: “viu, porque você tá fazendo isso com o menino?” e ele falou assim: “ele acabou de roubar um carro”, aí a Patrícia falou assim: “não, ele não é ladrão, ele não rouba, o Lukas é trabalhador”, aí um deles falou que ele jogou pedra, então houve duas versão. 

Tá, vieram me avisar que ele tava estava sendo agredido quando o outro filho dela, de 16 anos, se jogou na frente, pediu pelo amor de Deus, e o Lukas caído no chão e ele chutando o Lukas, ele se jogou em cima do Lukas, eles bateram no menino também, tá? Pra você ter uma ideia, o primeiro chute que veio na cabeça do Lukas, o Lukas tinha uma prata e a prata do meu filho voou longe. Aí a Patrícia gritou, eles pegaram a perna do Lukas e puxaram ele, arrastaram ele na rua. Continuaram a bater mais no meu filho. Aí a Patrícia falou: “eu vou buscar a Cecília que é a mãe dele”, ele disse: “você não vai!” e inclusive puxou a arma pra Patrícia também, mas a Patrícia virou as costas e veio. Só que nisso veio uma menininha de 6 anos de idade, uma moreninha, e falou pra mim: “tia, tia!”, gritava no portão da minha casa”, eu: “o que que foi?”, ela falou: “tão matando o barbi”, que o apelido dele também era barbi, aí eu corri. Quando eu cheguei, encontrei a Patrícia no meio do caminho, ela falou: “Cecília, corre porque eles estão batendo muito no Lukas”.

Quando eu cheguei lá, meu filho tava caído no chão. Aparentemente não tava com sangue, não tava com nada, mas meu filho, ele tava se debatendo muito e eu gritava. Sò que  quando eu cheguei perto, um dos policiais, que é o que mais bateu nele, ele tava com a perna no peito do Lukas, tinha engatilhado a arma e falava: “se você der mais um passo, eu mato essa desgraça”. Eu falava pra ele: “deixa eu socorrer meu filho!”, “ele tá bêbado essa porra tem que morrer!”, esse palavrão, desculpe te falar, foi esse palavreado que toda hora ele falava. “Essa desgraça tem que morrer, essa desgraça tem que morrer!”, e eu falando: deixa eu socorrer, pelo amor de Deus, o senhor não tem filho?” ele batia no peito e falava: “não, eu tenho filho, eu tenho dois, que tá dentro da minha casa, se ele tá bêbado, porque a senhora não segurou ele dentro de casa?”, aí eu falei: “como que eu vou segurar um menino de 23…”, e ele: “eu não quero saber! Ele tem que morrer!”.Com essas palavras.

Chegou mais polícias, mais polícias, mais polícias e aí um dos policiais que eu fui pedir “pelo amor de Deus”, que eu tenho até o vídeo, ele me empurrou e aí nisso quando ele me empurrou ele disse: “sai daqui, sua filha da puta”. Um dos meus filhos falou: “ela não é filha da puta”. Aí o que que os policiais fizeram? Eu escutei mais tiros e não era tiro de borracha, porque a gente vive num lugar, num ambiente que a gente sabe o que que é o tiro de borracha e sabe qual é o tiro de verdade. E o barulho do tiro era de tiro de verdade. Aí eu fiquei com medo, fiquei com medo deles atirarem nos meus filhos, e eu pedindo, tentando, “pelo amor de Deus deixa eu socorrer”. E quando um deles falaram que ele jogou pedra na polícia, meu filho levantou a mão e disse que não tinha sido ele que tinha jogado pedra, fez assim, que não [gesto de levantar um braço e balançar o dedo de um lado para o outro]. 

Mesmo assim, eles continuaram falando que meu filho tinha que morrer, quando o meu filho não conseguia mais respirar. Aí eu comecei a falar: “meu filho não tá respirando, meu filho não tá respirando mais”, aí eles: ”então pega esse lixo. Vai socorrer esse lixo? Então socorre esse lixo!”, foi quando eu falei pra ele: “eu vou socorrer meu filho, é meu filho, eu vou socorrer”. Nisso, já avisaram meu outro filho, meu filho veio, a gente colocou o Lukas dentro do carro e com uma mão meu filho dirigia e com outra ele batia no peito do meu filho, Lukas, pra tentar socorrer e eu fazendo respiração boca a boca. E quando eu cheguei no PA [Pronto Atendimento], eu poderia muito bem ter parado, porque nós temos um corpo de bombeiro, você sabe muito bem, aqui na frente, mas tinha outra viatura lá dentro e a gente ficou com medo dele fazer mais coisas ainda. Aí chegamos no PA do Laranjeira, aonde eu fui fazer os papéis e o meu filho falou: “mãe, vai fazer os papéis”, e eu escutei meu filho gritando, o Mateus gritando: “reage meu filho, volta, volta!”, só que eu não entendia nada, tava meio desorientada. Nisso, quando eu voltei, eu perguntei pro médico: “doutor, o meu filho, ele vai sobreviver?” aí ele falou: “olha, mãe, vou ser bem sincero pra você. Se seu filho sobreviver, você vai criar outra criança, porque ele ficou muito tempo sem oxigênio no cérebro então ele automaticamente, ele vai ficar com sequela. E você vai criar outro bebezão”.

Levamos ele pro Regional, ele foi transferido pro Regional. Quando chegou no Regional, ficamos até 6 horas da manhã sem saber notícia, a não ser uma amiga minha que conseguiu entrar, olhou, o Lukas tava muito inchado na parte do abdômen dele, muito inchado. Essa amiga minha falou: “tá esquisito porque tá muito inchado no abdômen, o rosto dele não tem nada, mas o abdômen ta muito inchado. Aí, quando foi no outro, dia era 2 horas da tarde quando veio a notícia de que meu filho estava falecido. Que ele teve várias paradas cardíacas e que ele teve hemorragia interna. Portanto, a médica que atendeu ele, que veio falar para gente que ele tinha falecido, ela deixou bem claro: “você sabe, mãe, que ele apanhou muito e, infelizmente, a gente tentou tirar ele dos aparelhos, que ele já tava em coma, e ele não aguentou, ele teve 10 paradas cardíacas. Então foi essa a minha história em relação ao meu filho.

O que eu peço é que várias mães lutem comigo. Levanta essa paz, essa bandeira, sabe? De procurar fazer alguma coisa certa pra que nenhum filho, nenhum filho, passe pelo que meu filho passou e que nenhuma mãe chore pelo que eu tô chorando, por que todos os dias eu choro. Não tem um minuto que eu não lembre do meu filho. Não tem um minuto que eu não tenho vontade de abraçar meu filho. Porque é duro você criar um filho com tanto amor, com tanto carinho e, de repente, num piscar de olho você… você pensa tudo. Eu penso assim, se ele tivesse morrido de um acidente ou de uma doença, eu acho que taria mais conformada. Não ficaria feliz, é claro, porque era meu filho, mas do jeito que mataram ele, eu consegui doar as coras do meu filho, só, porque por dentro ficou tudo estourado. Então essa é a minha história.

Depois que isso aconteceu, como foi a reação dos amigos, parentes e da comunidade como um todo?

A comunidade, pela primeira vez eu vi elas se unirem, porque já tinha morrido vários meninos aqui, só que tem um porém: o Lukas, ele era, além de ser um menino muito, assim, muito ativo, sempre trabalhou, sempre vendeu roupa, cortava cabelo, menino de coração, menino bom, além de tudo isso, o que os meninos mais ficaram indignados é da maneira, a crueldade, sabe, que mataram o Lukas, e o menino que não tinha alguma coisa pra trás, tipo assim, é bandido, sabe? Não que justifique que eles tem que matar bandido, não é isso, mas eles sabiam quem era o Lukas. A comunidade ficou revoltada, porque o Lukas, desde quando a gente veio morar pra cá o Lukas sempre vendeu as coisas na rua. Meu filho fazia salgadinho, o Lukas vendia coxinha na rua, vendia, sabe? Sempre se virando! O Lukas, ele morreu com 23 anos de idade, se eu falar para você que eu comprei um tênis de marca pra ele, eu vou tá mentindo, porque ele sempre compro as coisa dele, mas ele nunca precisou traficar, roubar, nunca pra ter o que ele queria. Eles ia pra São Paulo, buscava mercadoria de São Paulo, vinha, chegava aqui uma e pouco da tarde, duas e pouco da tarde, porque ele virava a noite comprando mercadoria e pegava a bicicleta dele e ia de porta em porta vender as roupas. Quando não, igual ele fez, ele montou um salãozinho aqui dentro da minha casa, de cortar cabelo, ele cortava cabelo por 10 reais e, às vezes, muitas vezes, de graça porque ele ficava com dó das meninas que não tinha condições de cortar cabelo. Ele via na rua: “vem cá, tá muito feio, vamos arrumar esse cabelo”. Então o Lukas, sempre ele falou: “mãe, eu venho pra ser feliz, não pra ser perfeito”. E ele, realmente, ele fez muitos amigos, de todos os tipos de classes sociais, de tudo que você imaginar, meu filho tinha amigo. 

Pouco tempo depois do seu filho falecer, aconteceu uma marcha.

Sim, em fevereiro, passou um tempo, acho que foi dia 12 de fevereiro, nós fizemos uma marcha pela paz, onde reunimos, mais ou menos, de 400 a quase 500 pessoas.Todos amigos dele.

Aqui na Zona Norte?

Aqui na Zona Norte. E a gente quer fazer outra agora, dia 9, e eu peço pra vocês, mães que estejam do outro lado, amigos do Lukas, mães que sofrem pelo que eu to sofrendo e mães que, Deus me livre, que nunca sofra o que eu to sofrendo, venha comigo nessa marcha. A gente não quer levantar uma bandeira e dizer contra a militar que venha fazer o serviço dela. Eu quero que, se existe um serviço da militar, que faça pelo certo. Já que eles tão, tanto que eles acham que eles tão tanto certo, porque pra mim eles não tão sempre pelo certo. Eles tão entrando, eles tão batendo, eles tão agredindo, eles tão matando e as coisas não funcionam assim, eles também tem filho, sabe? É muito duro pra uma mãe enterrar um filho, como eu enterrei o meu, sabe? E dizer pra mim igual o que aconteceu, quando colocaram meu filho, mataram um menino da Zona Norte, muita gente falou assim: um Zé droguinha, um vagabundo. Meu filho não era vagabundo, meu filho não era Zé droguinha, e mesmo que fosse, se a militar tem o direito de matar, então porque que ela não solta os presos? Solta os presos então. Pra que faz cadeia? É o que eu penso.

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