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Coluna

Walmor Marcellino: histórias de repressão na ditadura militar

Walmor Marcellino tornou-se um dos inspiradores de gerações de políticos de vertentes nacionalistas e de esquerda no Paraná

Walmor Marcellino nasceu em 4 de fevereiro de 1930 em Araranguá SC e a partir da década de 1950 se torna jornalista, escritor e militante político de concepção marxista. Em 1964 foi cassado pela ditadura militar e perdeu seu emprego de funcionário público na Assembleia Legislativa do Paraná. Cassado devido às suas inúmeras participações na militância política de esquerda com atuações em matérias jornalísticas, produções e direções em peças de teatro criticamente ácidas e manifestações políticas em diversos espaços na cidade de Curitiba.

A partir de então passa a organizar e militar em várias entidades políticas como a Ação Popular entre outros. Devido a sua incisiva participação política frequentou por diversas oportunidades a cadeia da polícia federal em Curitiba, e a última em 1978 tornou-se emblemática e representativa do tamanho da brutalidade e da estupidez da ditadura com seus aparelhos repressivos, com suporte do imperialismo estadunidense e suas entidades multilaterais. No ano de 1978 a Polícia Federal (PF); a qual a esquerda adora mencionar como instituição que irá prender lava-jatistas e bolsonaristas com Lula na presidência lançou a operação de busca e prisão denominada “Pequeno Príncipe”. Essa operação tornou-se famosa no Brasil por se tratar de aspectos educacionais com envolvimento político de crianças da pré-escola.

Ao amanhecer de 18 de março, agentes entraram nas casas das famílias, que ainda dormiam. Alguns foram algemados na frente dos filhos, matriculados nas escolinhas. A acusação era de que as crianças de até 6 anos de idade eram doutrinadas pelo marxismo nesse espaço educativo e que a prisão dos envolvidos era mais do que justificada.

O jornal Folha de São Paulo na época também cobriu o caso trazendo uma matéria sobre a operação da PF. Segundo o portal Clicrbs “Em 19 de março de 1978, o jornal Folha de S.Paulo noticiou as prisões na capa. Nos dias seguintes, manteve a cobertura sobre o assunto. Em 2 de abril, uma charge do cartunista Jota no extinto caderno Folhetim, indicava o tom que a operação passava a adquirir para a opinião pública: piada nacional. O desenho mostrava um agente federal segurando um preso com uma mão e, na outra, um livro. O policial dizia:

— Taqui a prova: Eles davam Chapeuzinho Vermelho pras crianças lerem — em referência à cor que distingue os simpatizantes do comunismo”.

Essa passagem mostra o absurdo do nível rebaixado dos agentes repressores da ditadura e sua doutrina de apoio à subserviência à classe dominante e ao imperialismo. Walmor Marcellino e outros tantos foram presos por ter algum tipo de envolvimento com a chamada de Oficina e Oca e de acordo com a matéria do mesmo portal “as escolas foram criadas alguns anos antes por pais que atuavam em forma de cooperativa para cuidar dos filhos, que ainda não estavam em idade escolar. Tarefas administrativas e de limpeza, por exemplo, eram divididas pelos associados. A maioria dos 11 presos já era perseguida pela ditadura militar por envolvimento com algum sindicato, passeata ou movimento estudantil na década anterior”.

Walmor Marcellino tornou-se um dos inspiradores de gerações de políticos de vertentes nacionalistas e de esquerda como o ex-governador Roberto Requião e a ex-deputada federal pelo PT e também presa e torturada pela ditadura militar Clair da Flora Martins. Em 1978 eu, Marcelo Marcelino com dez anos de idade era uma dessas crianças que foram testemunhas da invasão da casa com a prisão do meu falecido pai Walmor.

Por coincidência eu frequentava o Colégio Conselheiro Zacarias ao lado da antiga sede da polícia federal na rua Ubaldino do Amaral próximo ao centro de Curitiba e experimentei a brutalidade e a estupidez da ditadura militar, que nesse período começava a despencar. A prisão de Walmor e demais companheiros em março de 1978, além de ter servido de exemplo de piada e chacota da medíocre ditadura mostrou um lado perverso da aliança das instituições nacionais com agências internacionais como no caso relatado em matéria na página do mestrado profissional no ensino de História que aborda a associação do MEC com a USAID (United States Agency for International Development) que contribuiu para a cooperação com os órgãos da Segurança Nacional como apontou o relatório da Comissão da Verdade em 2014.

Na época da OCA, onde os “doutrinadores marxistas de criancinhas” foram presos nessa operação pra lá de desmoralizante, nem tudo pode ser considerado revelador de estupidez, já que alguns desses companheiros foram torturados e coagidos das mais variadas maneiras. Por ser jornalista Walmor permaneceu na PF, onde em seguida seria solto com os demais “doutrinadores infantis”.

Walmor Marcellino participou ativamente da cena política paranaense entre o final da década de 1950 e início dos anos 2000 quando ainda testemunhou a vitória de Lula e seu governo morno em termos de mudanças políticas concretas. Foi presidente do PSB no Paraná na redemocratização, quando ainda era considerado um partido de esquerda.

Com a ascensão de Bisol como vice de Lula em 1989 o PSB passa rapidamente para uma opção à direita do espectro político e no Paraná a legenda se rende abertamente para a direita tradicional de Curitiba já no início da década de 1990 quando Walmor já não se encontra mais como filiado. Walmor concorreu ao senado pelo Paraná em 1986 e para vereador de Curitiba em 1988 pelo PSB e a partir daí vê a legenda ser atravessada por vários indivíduos que entregam o partido de bandeja para a direita num golpe interno.

Algumas obras literárias de Walmor Marcellino: Janela para o mundo, é de 1964, Duelo de corte vivo (poesia), de 2003; Os idus de março e os ódios de abril (teatro) é de 1996; Verberação dos demônios (ensaio), de 2000; A cólera é uma loucura breve (narrativas), de 2001. Ao todo foram lançados mais de 40 livros e mais algumas peças de teatro que foram produzidas e lançadas sempre com uma vertente ácida de teor marxista.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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