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Futebol

Assim falava Neymar Júnior

Esta coluna é contraindicada para Enzos e amantes do futebol europeus. Desses, fujo como o Diabo foge da cruz

– Por Heinrick Aguiar

Este artigo, ao contrário do que pode parecer de primeira vista a um desavisado, não versa sobre filosofia – mesmo que contenha uma paráfrase ao livro Assim Falava Zaratustra, de Nietzsche. Tampouco falo aqui de política. Isto aqui é, primeiramente e antes de tudo, uma declaração de amor. Sim, isso mesmo que você leu: uma declaração de amor. Eu amo o Neymar. Neymar, obrigado por todos os seus serviços ao futebol brasileiro: eu te amo.

A Zaratustra, ocorreu chegar à cidade mais próxima e anunciar: eis o super-homem! “O homem é coisa que deve ser superada, o que fizeste para superá-lo?”. A quem não entendeu, ele ainda tenta explicar: o que é o macaco para o homem? Motivo de zombaria, uma irrisão ou dolorosa vergonha; o mesmo é o homem para o super-homem; percorremos o caminho que leva do verme ao homem, mas ainda nos resta muito do verme. O homem é uma ponte entre o animal e o super-homem, sua superação, através da transmutação de todos os valores.

O que Nietzsche não poderia imaginar é que o homem seria superado por um menino, o homem que atingiu a idade de espírito da criança, nascido em 1992, em Mogi das Cruzes. Ecce Homo! Eis o homem! Trata-se de Neymar; que operou com a sua arte, com seus dribles, seu jeito irreverente e com a bandeira brasileira a mais profunda superação que a história recente do futebol pôde ver. Assim falava Neymar Júnior.

“Noutros tempos, blasfemar contra Deus era a maior das blasfêmias; mas Deus morreu, e com ele morreram tais blasfêmias. Agora, o mais espantoso é blasfemar contra a terra”: eis a filosofia da afirmação dos valores da vida terrena, da vida que existe, do mundo da vida, contra o enfraquecimento do corpo em prol de um além-mundo. “Pobre Nietzsche! Morreu na pré-história da civilização, antes de ver nascer o Deus em pessoa, o Rei, o único salvador; o Deus que renasceu, após morrer, e que não tinha nada de além-mundo, mas que era humano, demasiado humano: Pelé”. Assim falava Neymar Júnior.

“Sofrimentos e incompetências; eis o que criou todos os além-mundos, e este breve desvario de felicidade que só conhece quem mais sofre”. Assim falava Zaratustra, mas não Neymar. Não é que o ídolo santista não concordasse, mas ele ia além, superava Nietzsche: a negação do mundo da vida é, de fato, a causa de todas as infelicidades; mas o filósofo se esqueceu dos verdadeiros culpados por isso, os culpados por descolorir o mundo da vida, torná-lo monótono, chato, repetitivo, ao ponto de nos forçar ao escapismo: os malditos europeus e seu esporte meia-boca, que insistem em chamar de futebol. Malditos! Querem subtrair a maior de todas as alegrias da humanidade: enebriar-se, embebedar-se, perder a razão com a arte do futebol, com a paixão resultante do fulgor de uma partida bem jogada.

Em lugar, querem um esporte morto regido por padrões táticos. Assim falava Neymar Júnior.

“Falar-lhes-ei do mais desprezível que existe, do último homem”. – Imediatamente após proferir estas linhas, antes que ao leitor possa ocorrer qualquer tipo de reflexão, já vos digo: o tipo mais desprezível dos homens é o jornalista esportivo, baba-ovos dos jogadores europeus, e o último homem, o mais desprezível de todos, é o Casagrande. Assim falava
Neymar Júnior.

O homem é coisa que deve ser superada! O que você faz para superar o homem? O homem precisa ser superado! Por isso deve amar tuas virtudes, porque por elas morrerás!
Assim falava Zaratustra, e assim falava Neymar Júnior. Ah, as três idades do espírito! Quem sabe mesmo o que são? Quem pode as explicar? Zaratustra tentou. O camelo, o leão e, finalmente, a criança – que é a mais evoluída de todas; no nosso jargão, o menino (menino Ney!). Na fase do camelo, carrega-se todo peso da vida, embrutece-se tal qual o camelo carrega em suas corcundas; então, chega-se a fase da revolta, do leão. O leão se revolta contra um dragão, em cujas escamas estão marcadas “tu deves”. Isto é, é a fase da revolta contra as obrigações; por si só, ela não cria nada, mas abre o caminho para a idade da criação; que é a criança. Há algo de melhor para criar que as jogadas que o nosso Menino Ney cria? Assim falava Neymar Júnior.

A criança é ao que retornamos após enfrentar o mundo das obrigações. Na metáfora de Zaratustra – embora creio que ele tenha entendido de maneira limitada as idades do espírito, pois, por mais que tente, sem a habilidade nos pés, falta a habilidade no coração –, tal qual a criança, o homem que atingiu esse estágio é livre, não está submetido a grilhões e, antes de tudo, pode criar! Cria conceitos, cria amores, cria ideias, cria sentimentos, cria!

Ah, há alguém mais cria que o 11 do Santos? E há alguém que leve com mais representatividade a alma de uma criança que o homem que entrou na história como Menino Ney? Há maior poeta que um jogador de futebol – do futebol-arte, não daquela porcaria europeia? Assim falava Neymar Júnior. Finalmente, chegamos à última etapa desta viagem. Depois de se isolar nas montanhas para adquirir inspiração, de ter superado as três etapas do espírito, de ter de enfrentar a campanha moralista rasteira dos sem-moral da imprensa – que transformaram em assunto de primeira ordem saber se Neymar traiu ou não a esposa –, de ter inspirado os brasileiros com o futebol-arte, tudo que eu escrevesse seria limitado. Neymar merece mais. Merece tudo. Só de ele lidar com um pé-no-saco como Casagrande já seria motivo o suficiente para idolatrá-lo. Tudo o que qualquer poeta jamais sonhou está sintetizado em cada lambreta que Ney cria: transborda amor, arte, poesia. Ecce homo! Não só superou tudo que poderia ser superado no esporte, mas transcendeu, e superou o próprio homem! Eis o super-homem! Eis o meu grande amor, e o grande amor de todos os enamorados pela arte que é o futebol e a Seleção Brasileira. Assim falava Neymar Júnior

*As opiniões contidas neste artigo não expressam, necessariamente, as deste Diário.

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