Nesta última quarta-feira (03), a Polícia Federal cumpriu mandado de busca e apreensão na casa do ex-presidente Jair Bolsonaro, em Brasília, no âmbito da Operação Venire, que investiga a inserção de dados falsos sobre vacinação contra Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde. Foram apreendidos o seu celular e o de sua esposa, Michelle Bolsonaro. Além disto, foram presos Mauro Cesar Barbosa Cid, que atuou como ajudante de ordens do ex-presidente enquanto este chefiava o executivo.
Conforme já apontou esse Diário, a operação constitui mais uma tentativa da direita tradicional em assumir o controle do regime político no país.
Inúmeros indícios nos permitiram chegar a essa conclusão. Os principais: a Operação Venire foi autorizada por Alexandre de Moraes, um homem ligado ao PSDB, partido representante direto dos interesses do principal do imperialismo no Brasil. Sendo Ministro do Supremo Tribunal Federal, ele não teria a competência judicial para o caso, haja vista que Bolsonaro não possui mais foro por prerrogativa de função, pois não é mais Presidente da República. Contudo, Alexandre de Moraes avocou a competência judicial, e o fez com fundamento nos Inquéritos nº 4.871/DF (“Fake News”) e 4.874/DF (Milícias Digitais). Assim, novamente, Alexandre de Moraes se utilizou dos Inquéritos para centralizar em suas mãos o comando de processos judiciais e policiais que dizem respeito à estabilidade do Estado burguês brasileiro. Semelhante ao que fazia Sergio Moro durante a Operação Lava Jato, em que todos os casos de corrupção que diziam respeito à estabilidade do regime político brasileiro acabavam parando em suas mãos.
Afinal, o que são os Inquéritos nº 4.871/DF (“Fake News”) e 4.874/DF (Milícias Digitais)?
O Inquérito das “Fake News” foi instaurado em 2019 para, supostamente, investigar a existência de notícias falsas, denunciações caluniosas, ameaças etc. contra os membros da Suprema Corte e seus familiares. O ministro Alexandre de Moraes foi designado para presidi-lo. Neste caso específico, vê-se o quão absurda, abusiva e antijurídica é a situação: o Supremo Tribunal Federal, na figura de Alexandre de Moraes, instaurou de ofício um inquérito para apurar supostos crimes cometidos contra a própria instituição e seus membros. E, ao fim do inquérito, quem serão os julgadores? Eles mesmos. Assim, nesse caso específico, o Supremo atua como vítima, polícia, acusador, juiz e carrasco. Uma total aberração jurídica.
Já o Inquérito das Milícias Digitais foi instaurado, supostamente, para apurar a existência de milícias digitais antidemocráticas, que estariam se articulando em diversos núcleos, com a finalidade de atentar contra a democracia e o Estado de Direito no país. Vê-se, aqui, outra aberração jurídica. Afinal, ninguém sabe dizer o que seria uma “milícia digital”. Muito menos o que poderia ser caracterizado como antidemocrático ou Estado de Direito, tendo em vista que as instituições brasileiras violam os direitos democráticos da população dia e noite, e os tribunais brasileiros passam por cima da lei todos os dias, sem nenhuma consequência.
Em outras palavras, qualquer cidadão pode ser enquadrado nesses inquéritos, pois “notícias falsas”, “milícias digitais” e “atentar contra a democracia” são tipos abertos.
Vê-se, portanto, que o Brasil virou uma terra sem lei, em que se impera o arbítrio. Como chegamos a esse ponto? Bem, esses inquéritos não são um raio em céu azul. Eles são um desdobramento do Golpe de 2016.
As origens do Golpe de 2016, por sua vez, podem ser rastreadas ao ano de 2012, quando outra aberração jurídica foi posta em marcha na época contra a esquerda: o julgamento do Mensalão, o qual resultou na prisão de vários dirigentes petistas. À época, este Diário apontou que o julgamento era o início de um golpe de Estado contra o governo do PT, perpetrado pelo imperialismo. Esta análise foi possível de ser feita, pois os Estados Unidos já haviam colocado em marcha uma nova fase de golpes de Estado na América Latina, com Honduras em 2009.
Com o julgamento do Mensalão, começou a liquidação do regime político brasileiro. Começou a barbárie jurídica que vemos nos dias de hoje. A partir de então, a cada dia que passa, os direitos democráticos e garantias fundamentais do povo brasileiro perante o Estado burguês são cada vez mais tolhidos. Hoje em dia, são praticamente inexistentes. O Golpe de 2016 se iniciou justamente com essa demolição final da ordem jurídica, cujo pontapé inicial foi o julgamento do Mensalão.
Com a ordem jurídica desfigurada, o caminho estava pavimentado para derrubada de um governo democraticamente eleito (Dilma Rousseff) e a prisão do líder político mais popular do país e o principal candidato à Presidência da República (Lula).
Após o golpe contra Dilma, quem assumiu foi o golpista Michel Temer, frequentador assíduo da embaixada dos EUA. E quem foi o ministro do Supremo Tribunal Federal nomeado por ele, durante seu mandato? Alexandre de Moraes.
Assim, o ex-secretário de segurança pública do governo de São Paulo assumiu a tarefa importante de dar continuidade a um dos projetos do imperialismo para o Brasil: a desfiguração do ordenamento jurídico brasileiro, de suas leis e da Constituição, e a centralização de poder na Suprema Corte, para facilitar a contenção das instabilidades do regime político.
As arbitrariedades de Alexandre de Moraes, portanto, são uma consequência do golpe de Estado de 2016 e do fato de que não há mais leis vigentes no País.
São, também, uma continuidade do mesmo golpe, e servem para manter e aprofundar o Brasil como uma terra sem lei, a mando do imperialismo.
Os abusos do Bonaparte de toga nos últimos quatro anos vêm se mostrando cada vez mais gritantes. A partir de 2018, com a ascensão e a consolidação da extrema-direita, passou a perseguir elementos secundários do bolsonarismo, censurando suas redes sociais e até mesmo ordenando a prisão daqueles que falavam contra as instituições do Estado brasileiro, como o próprio Supremo. A justificativa era o combate ao fascismo e a defesa da democracia. À época, este Diário fez uma intensa campanha contra a política de censura de Alexandre de Moraes. Defendeu a liberdade de expressão irrestrita. Alertou a esquerda, inúmeras vezes, que a censura não poderia ser defendida, pois a repressão à extrema-direita iria inevitavelmente se voltar contra os trabalhadores. Dito e feito. No ano de 2022, após várias perseguições a elementos secundários e insignificantes da extrema-direita, o alvo da perseguição foi o Partido da Causa Operária (PCO), o mais ativo e combativo partido da esquerda nacional.
O PCO foi incluído no Inquérito das “Fake News“, tendo todas suas redes bloqueadas às vésperas das eleições presidenciais. A atividade política do Partido ficou imensamente prejudicada. Nunca foi permitido acesso ao conteúdo do inquérito. O motivo da censura? O Partido propôs uma reforma constitucional, pedindo a dissolução do STF. Nada de ilegal! Nada além de uma reivindicação democrática, afinal, as supremas cortes são instituições que foram criadas em oposição ao elemento revolucionário da burguesia e ao órgão máximo de sua representação popular, o parlamento.
Apesar das redes do Partido terem sido liberadas, o prejuízo foi causado. Ademais disto, o Inquérito das “Fake News” continua aberto, e sigiloso. Ninguém sabe o que o Supremo e o Bonaparte de toga podem fazer em seguida, quem pode ser o próximo alvo de perseguição política. Da mesma forma, segue em aberto o Inquérito das Milícias Digitais.
E qual foi a mais recente arbitrariedade cometida por Alexandre de Moraes? A autorização da Operação Venire, mais um episódio de perseguição política contra Jair Bolsonaro. Mas por que seria uma perseguição e uma arbitrariedade?
Bem, conforme já foi dito, a Operação investiga inserção de dados falsos sobre vacinação contra Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde. Segundo as investigações da Polícia Federal, a suposta vacinação de Jair Bolsonaro teria ocorrido no município de Duque de Caixia/RJ, conforme dados Sistema da Rede Nacional de Dados em Saúde – RNDS, encaminhados pelo Ministério da Saúde.
O objeto da investigação é se a vacinação realmente teria ocorrido, ou se estas informações foram falsamente inseridas nos bancos de dados públicos.
De qualquer forma, o que importa é que Jair Bolsonaro não é mais presidente da República. Assim, ele não possui mais foro por prerrogativa de função. Portanto, Alexandre de Moraes não teria competência para ser o juiz a presidir processo judicial contra ele.
Contudo, o Bonaparte de toga centralizou mais um processo judicial em suas mãos. Outro processo judicial relevante à estabilidade do regime político brasileiro, afinal, Bolsonaro é um líder político que possui o apoio de milhões de brasileiros, e que possui uma base militante ativamente mobilizada.
E qual foi a justificativa jurídica que o ministro do Supremo utilizou para avocar o processo? Os Inquéritos das “Fake News” e das Milícias Digitais.
Na Petição nº 10.405, que é a decisão que determinou a busca e apreensão contra o ex-presidente, isto é deixado claro.
Ao fundamentar sua decisão, Alexandre de Moraes cita despacho elaborado pela Polícia Federal.
No despacho, os inquéritos são citados inúmeras vezes. Em um dos trechos, presentes às folhas 5 da decisão, a PF diz que:
“é preciso relacionar o presente contexto criminoso, com a estrutura da Associação especializada investigada nos autos do Inq. 4874/DF, focada nos objetivos de atacar integrantes de instituições públicas, desacreditar o processo eleitoral brasileiro, reforçar o discurso de polarização; gerar animosidade dentro da própria sociedade brasileira, promovendo o descrédito dos poderes da república; estimular a animosidade […] contra o Supremo Tribunal Federal […] Conforme apresentado em vários relatórios produzidos nos autos do Inq. 4874/DF, o mecanismo idealizado pelo autointitulado GDO (“gabinete do ódio”) reverberou e amplificou por multicanais a difusão de notícias falsas envolvendo a pandemia e ataques à vacinação contra covid-19, sendo objeto de investidas constantes realizadas pela milícia digital investigada”.
Em suma, eles presumem que Bolsonaro falsificou seu registro de vacinação simplesmente por suas posições políticas.
A Polícia Federal prossegue, falando ainda sobre o posicionamento de Bolsonaro e da extrema-direita a respeito das eleições, e chega a citar o episódio de 08 de janeiro. Diz que:
“da mesma forma, a milícia digital reverberou e amplificou por multicanais a ideia de que as eleições presidenciais foram fraudadas, estimulando aos seus seguidores ‘resistirem’ na frente de quartéis e instalações das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para uma intervenção federal comandada pelas forças militares, sob o pretexto de aturarem como um Poder Moderador, com base em uma interpretação peculiar do art. 142 da Constituição Federal”.
E qual seria exatamente a correlação disto com possíveis dados falsos sobre vacinação contra Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde? A natureza de perseguição política dessa nova investida judicial vai ficando cada vez mais clara.
Após as citações, Alexandre de Moraes decide por ordenar a busca e apreensão na residência de Jair Bolsonaro. Dentre os objetos, foram apreendidos o celular do ex-presidente e o de sua esposa, Michelle Bolsonaro, como já informado.
Em sua decisão, o ministro tenta disfarçar, mas não é possível. Acaba revelando que essa nova investida jurídica contra Jair Bolsonaro, supostamente por causa da inserção de dados falsos sobre vacinação contra Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde, é apenas a continuidade da perseguição anterior instaurada no âmbito dos Inqs. 4.781/DF (“Fake news”) e 4.874/DF (Milícias Digitais). Após citar novamente as palavras da Polícia Federal, expostas acima, Alexandre de Moraes diz que:
“diante do exposto e do notório posicionamento público de JAIR MESSIAS BOLSONARO contra a vacinação, objeto da CPI da Pandemia e de investigações nesta SUPREMA CORTE, é plausível, lógica e robusta a linha investigativa sobre a possibilidade de o ex-Presidente da República, de maneira velada e mediante inserção de dados falsos nos sistemas do SUS, buscar para si e para terceiros eventuais vantagens advindas da efetiva imunização, especialmente considerado o fato de não ter conseguido a reeleição nas Eleições Gerais de 2022. Imprescindível, portanto, a realização de diligências, inclusive com o eventual afastamento excepcional de garantias individuais […]“.
Finaliza determinando a busca e apreensão.
Está claro, assim, que Alexandre de Moraes tornou-se o novo Sergio Moro do regime político brasileiro. Assim como ocorreu durante a Operação Lava Jato, todos os processos judiciais que dizem respeito à estabilidade do regime político brasileiro estão caindo em suas mãos.
O Bonaparte de toga e o Supremo Tribunal Federal se utilizam dos Inquéritos 4.781/DF (“Fake news”) e 4.874/DF (Milícias Digitais) para aprofundar essa centralização de poder nas mãos do judiciário, na tentativa de conter a crescente polarização social. Utilizam esses inquéritos para perseguir seus adversários políticos, de forma completamente arbitrária, rasgando qualquer semblante de direitos e garantias fundamentais.
Já são pelo menos dois inquéritos com essa natureza. Quais serão os próximos?
Aliás, quem serão as próximas pessoas a serem alvos de inquéritos do Supremo Tribunal Federal? É impossível prever, pois qualquer um pode ser perseguido. Reina a arbitrariedade jurídica.
Assim, é necessário fazer uma ampla campanha pelo fim dos Inquéritos das Fake News, das Milícias Digitais e demais inquéritos antidemocráticos que correm soltos no âmbito do STF, sigilosos, longe do conhecimento da população brasileira.
Pelo fim dos Inquéritos das Fake News, das Milícias Digitais e de todos os inquéritos e processos arbitrários e sigilosos.