O Psol está à esquerda do PT? É evidente que não. Contudo, aparentemente, essa ideia faz parte do senso comum de boa parte dos “progressistas”, eufemismo para pessoas que apoiam (algumas) causas sociais.
Depois que o Psol tomou a decisão de sair da base de apoio ao governo Lula, ouvi alguns analistas aqui e acolá e percebi que esta ideia é uma espécie de senso comum não só entre jornalistas, mas entre os eleitores “progressistas”.
Na segunda-feira, por exemplo, o jornalista Joaquim de Carvalho, do 247, falou sobre o assunto. Ele levantou as contradições da decisão de maneira lúcida, construindo uma argumentação crítica, porém, posicionando o partido a partir desta ideia.
Ao iniciar, disse que a escolha revelou uma “certa independência do PSOL”, por estar “à esquerda do PT”. A seguir, ressaltou, no entanto, que a decisão também poderia ser usada pela direita contra o governo. O posicionamento do partido na Lava-Jato foi tomado como exemplo, pois ajudou a criminalizar o PT.
Foi possível perceber que o jornalista escolheu suas palavras com cuidado, quase didático, visto que muitos comentaristas e convidados do 247 estão ligados ao partido. O único senão foi mesmo a escolha infeliz da expressão “à esquerda do PT”.
Uma análise concreta, baseada em materialismo histórico, mostra que o Psol não só não está à esquerda do PT, como é duvidosa sua posição de esquerda no atual momento.

Basta olhar alguns vídeos da campanha eleitoral de seus candidatos para perceber o quanto ele é afastado da luta de classes e da defesa dos interesses nacionais contra o imperialismo.
Conheço alguns eleitores do Psol que se identificam com algumas das pautas deste partido, principalmente a identitária. São, no geral, funcionários públicos, pequenos empresários, publicitários, jornalistas, muitos ligados ao ambiente universitário, a ONGs e leitores ávidos da Folha de S. Paulo. Muito além dos milhões de trabalhadores que o partido está longe de representar, como o PT.
Além disso, está mais do que provado que a cultura identitária é um dos instrumentos de propaganda da direita americana. Um partido político deveria liderar o debate sobre o assunto, apontar as contradições, defender nossa soberania e cultura, e não usar esses argumentos para eleger deputados.
É fato que, nas últimas eleições, muitos candidatos do PSOL receberam financiamento de bancos (nada contra, desde que não se diga que estes candidatos estão “à esquerda do PT”). Suas principais pautas são vagas, passando longe do materialismo histórico.
As ligações do partido com o IREE são concretas. Sobre esse tipo de relação entre políticos, institutos e ONGs, há críticas mais do que sólidas sobre a influência de empresas e do aparato de estado norte-americano na construção de falsas lideranças políticas “progressistas”. Boric, no Chile, é exemplo básico.
O PT, claro, tem várias dessas contradições, mas o apoio popular dos brasileiros a este partido é incomparável. Se o Psol está à esquerda de algum partido, só pode ser do PSDB. À esquerda do PT está o PCO.
O fato de o jornalista do 247 posicioná-lo desta forma revela um certo senso comum. Aparentemente, a audiência do 247 tem esta percepção do Psol também. Infelizmente, com sua análise, o jornalista apenas ajudou a alimentar e a corroborar esta ideia.
Isso é muito ruim para a esquerda, que precisa colocar na ordem do dia suas reivindicações históricas. Inclusive como base de sustentação do governo que se inicia.
A luta de classes deve ser o ponto de partida de qualquer análise política de esquerda. Aqueles que empunham microfones devem ter a responsabilidade de sempre levar isso em consideração.