Antônio Vicente Pietroforte

Professor Titular da USP (Universidade de São Paulo). Possui graduação em Letras pela Universidade de São Paulo (1989), mestrado em Linguística pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo (2001).

Coluna

Milton Banana e a bateria brasileira

Escutar Milton Banana tocando bateria é escutar horas de batucada sem o músico repetir uma passagem sequer... o homem foi genial!

Certa tarde, passeando com meu pai na Avenida São João, cidade de São Paulo, entramos em uma daquelas lojas de discos, que hoje não existem mais. Estávamos na década de 1970; interessado em bateristas excepcionais, lembro-me de haver comentado com o vendedor algo sobre a banda de rock progressivo Emerson, Lake and Palmer. Gentilmente, o moço concordou comigo a propósito das performances fantásticas de Carl Palmer, todavia, ele acrescentou “você precisa escutar os bateristas brasileiros” e me ofereceu um disco do Milton Banana.

Milton Banana é na verdade Antonio de Souza, nascido no Rio de Janeiro em 23 de abril de 1935, veio a falecer no dia 15 de maio de 1999, com 64 anos; Milton Banana é, sem dúvida alguma, um dos maiores bateristas do Brasil, portanto, do mundo inteiro. Banana gravou mais de 32 álbuns, sendo o líder da banda, algo incomum para bateristas; no Brasil ele foi um dos poucos nessa posição. Em meio a obra tão vasta, quero me deter em apenas dois trabalhos seus: “Balançando com Milton Banana”, 1966, com Sid no piano e Mário na bateria; “Milton Banana”, 1971 – deste álbum, infelizmente, não consegui descobrir nada dos demais músicos participantes –.

Quem se lembra dos antigos documentários exibidos antes das sessões de cinema da década de 1970? Pois bem, a trilha sonora das reportagens sobre futebol era geralmente a música “Cidade vazia”, de Baden Powell e Lula Freire, na versão instrumental do Milton Banana trio, registrada no álbum de 1966. Atualmente, a música instrumental brasileira não é valorizada, entretanto, na época muitos acompanhavam os trabalhos do Zimbo Trio, Paulo Moura, Dom Um Romão, Tenório Júnior, Edson Machado etc.; valorizavam-se a criatividade e o desempenho dos músicos sem os relegar a meros acompanhantes de cantores e cantoras, cujos talentos deveriam estar à altura desses instrumentistas e não o contrário, quando os músicos são desvalorizados diante de cantores medíocres.

No álbum de 1966, Milton atua com o tradicional trio de jazz composto por piano, baixo e bateria. Concebidos no jazz, tanto o trio quanto os instrumentos escolhidos são próprios para tocar jazz; utilizar a mesma concepção musical para fazer música brasileira, com ritmos específicos do Brasil, tais quais samba, bossa-nova, baião, maracatu, frevo etc., é uma adaptação de nossos músicos e arranjadores. Na história da bateria, tocar repicando no prato chimbal – aqueles pratos menores, percutidos com pedal, geralmente com pé esquerdo –, com marcação constante no bumbo e utilizando o aro da caixa para dividir o ritmo com o corpo da baqueta é invenção brasileira; Banana foi um dos responsáveis por essa concepção instrumental, mostrando todas as suas possibilidades rítmicas, de timbre, de dinâmica musical.

No álbum de 1971, 5 anos depois de gravar “Balançando com Milton Banana”, sem deixar de tocar samba e bossa-nova, Banana incrementou a banda com guitarra elétrica, adicionando ao grupo outros instrumentos de percussão, entre eles cuíca, pandeiro, tamborim etc., o piano acústico divide os solos e harmonias com órgão hammond, clavinete, piano rhodes e o baixo é elétrico, não mais acústico; os timbres são variados, mas o swing é o mesmo, com a prática, Milton está tocando melhor!

Quem escuta desatentamente bateristas semelhantes a Milton Banana, pensando escutar bateristas fajutos de rock, imersos em dezenas de tambores e pratos, com dois bumbos, fazendo sempre as mesmas passagens tercinadas, ou bateristas de grupos pop, com seus intermináveis grooves executados sem variação alguma durante toda a música, apenas para dar destaque a farsantes fantasiados pulando no palco, certamente não estende por que tanta admiração por bateristas como Banana, Rubinho Barsotti, Dom Um Romão, Wilson das Neves, João Cortez, Lilian Carmona, Azael Rodrigues, Realcino Lima Filho ou Zé Eduardo Nazário; escutar Milton Banana tocando bateria é escutar horas de batucada sem o músico repetir uma passagem sequer… o homem foi genial!

Por fim, resta lembrar de que a bossa-nova não foi concebida apenas por pequenos burgueses asquerosos no apartamento de senhoras ainda mais asquerosas, aquelas mesmas quem se queixavam de, durante os governos petistas, ter de encontrar os porteiros dos prédios nos aeroportos, pegando os mesmos aviões com elas e demais burgueses desocupados.

Os dois álbuns citados estão na íntegra no Youtube; desejando aos companheiros de luta boas sessões musicais, eis os endereços:

(1) “Balançando com Milton Banana”, 1966

(2) “Milton Banana”, 1971

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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