O governo do “bloco histórico” colombiano enfrenta grandes problemas e contradições. Está claro que o governo não está conseguindo cumprir seus compromissos adotados na campanha eleitoral e que é preciso uma reviravolta, pois apenas 25% de suas promessas de campanha foram cumpridas. A saída de Petro foi culpar seus ministros e diretores de departamentos administrativos. Ele fez uma reunião televisionada de seu governo em 4 de fevereiro, e houve um conflito generalizado entre os membros do governo, que resultou na demissão de dois deles e de vários cargos de alto nível. Em 9 de fevereiro, Petro pediu a todos que se demitissem para nomear um novo governo. Ou seja: o presidente é revolucionário, quer mudanças, e seus ministros não são revolucionários.
Surpreendente também foi a forma como ele atacou o último grupo guerrilheiro histórico remanescente na Colômbia, o ELN, para justificar o retorno a uma estratégia de contrainsurgência, abandonando a estratégia de paz total e declarando estado de distúrbio interno por 90 dias.
Na verdade, o presidente simula uma virada à esquerda quando aprofunda uma estratégia de manter a ordem e virar à direita. Foi mantido o chefe de gabinete Armando Benedetti, uma posição estratégica ocupada por um político direitista. Na verdade, o objetivo da reunião era uma reviravolta no governo, mas não no sentido de mudança. A crise humanitária e a guerra em curso em Catatumbo e outras partes do país, devido aos confrontos entre os dissidentes das FARC, a Frente 33 e o ELN, que causaram mais de 60 mortes e deslocaram cerca de 50.000 moradores, e a mudança para uma política de segurança nacional eram os objetivos verdadeiros da reunião. O “Governo da Mudança” de Petro é um exemplo claro das contradições que a esquerda parlamentar e social-democrata enfrenta devido ao seu colaboracionismo com a burguesia, que leva a acordos que pouco ou nada beneficiam a classe trabalhadora.
Os movimentos populares que determinaram a grande votação em Petro e na vice-presidente Francia Márquez esperavam uma mudança em suas condições de vida. Mas os pactos com os políticos burgueses que há décadas sangram econômica e fisicamente a população mais vulnerável do país impediram que o governo levasse à frente seu programa de mudanças. O que sustenta o governo é o apoio de amplos setores da juventude e da classe trabalhadora, do movimento feminista e LGBTI+ e dos povos originários, que não hesitaram em mobilizar-se repetidamente contra a extrema-direita. Mas as políticas capitalistas do governo ameaçam solapar esse apoio.
Outro problema é a forma como o governo trata a questão da soberania nacional. Apesar de sua atitude firme em relação à decisão escandalosa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de deportar centenas de cidadãos colombianos, algemados e acorrentados como se fossem criminosos, ele não sustenta uma política de defesa da soberania colombiana. Nada fez, por exemplo, com relação ao número extremamente alto de bases militares norte-americanas no país.
A história das relações diplomáticas, econômicas e militares entre os Estados Unidos e a Colômbia mostra que a soberania da Colômbia sempre foi subordinada aos interesses geoestratégicos e econômicos da potência hegemônica. O país deixou de ser uma colônia espanhola para ser um Estado nacional sob o domínio hegemônico dos Estados Unidos. A reação a essa subordinação se expressa no conflito armado interno, através da guerra contrainsurgente e anticomunista de mais de 80 anos, que ainda persiste em várias regiões do país: Catatumbo, Arauca, Cauca, Pacífico, Chocó, Nariño.
Portanto, romper as negociações com o ELN e passar de uma proposta de paz total para uma guerra de contrainsurgência em Catatumbo e outras partes do país, com o argumento falacioso de que o ELN é simplesmente um cartel de drogas sob as ordens da máfia mexicana, não é apenas um ultraje, mas também uma decisão errada.
Desenvolvimento capitalista aumenta a desigualdade
Ao contrário da propaganda burguesa de que o governo Petro traria o caos econômico, o crescimento do PIB em 2024, de acordo com as estimativas do FMI, esteve por volta de 3%. O ano de 2025 começou com uma taxa de inflação de 5,2%, uma das mais baixas do continente. O peso colombiano é uma das moedas regionais que mais se valorizou, e as exportações aumentaram para os EUA, a Europa, a China e a Venezuela.
O desenvolvimento capitalista não trouxe qualquer melhoria na qualidade de vida da classe trabalhadora. A economia colombiana é a terceira mais desigual do mundo, superada apenas pela África do Sul e pela Namíbia. A economia informal afeta 55% da população ativa, aumentando a precariedade e deixando sem efeito medidas governamentais como o aumento do salário mínimo.
Combater o imperialismo exige uma política revolucionária
Algo que tem dado apoio a Petro são seus discursos de denúncia do imperialismo estado-unidense. Historicamente, os governos colombianos têm-se curvado a Washington. Recusou-se a apoiar o governo fascista de Zelensky na guerra da Ucrânia e condenou as ações sionistas em Gaza, falando de genocídio. Mas depois de ter apregoado o corte de relações com “Israel”, aceitou a pressão da burguesia para manter as relações comerciais. Um verdadeiro escândalo.
Recentemente, recusou-se a permitir a entrada de aviões estado-unidenses que transportavam migrantes deportados em condições indignas, acorrentados de pés e mãos, exigindo-lhes um tratamento justo. Mas, mais uma vez, a ausência de medidas verdadeiramente socialistas expõe a fragilidade de suas posições reformistas.
Conclusão
Seja qual for a direção política que o governo de Gustavo Petro tomar, ele provavelmente não conseguirá cumprir seu programa de governo, e não é absurdo dizer que isso pode acabar abrindo caminho para a extrema-direita retornar ao poder. E isso seria um pesadelo e o maior obstáculo para continuar o projeto de mudança na Colômbia.
Na América Latina, há vários exemplos do desastre deixado por governos que vacilaram e co-governaram com o inimigo histórico, em alianças de classe, alguns até enfrentando impeachment e prisão: Alberto Fernández (Argentina), Rafael Correa (Equador), Gabriel Boric (Chile), Lula/Dilma (Brasil), Pedro Castillo (Peru).
Quando se hesita entre aprofundar e radicalizar o projeto numa aliança organizativa e política com as bases, a constituinte primária, retomando o caminho da independência definitiva, corre-se o risco de perder tudo. Tomar qualquer um desses caminhos hesitantes mergulhará a nação de volta na noite escura, o prelúdio da morte da esperança na Colômbia e da unidade dos povos da Nossa América.