Marcelo Marcelino

Membro Auditoria Cidadã da Dívida Pública (ACD) nacional, sociólogo, economista e cientista político, pesquisador do Núcleo de Estudos Paranaenses – análise sociológica das famílias históricas da classe dominante do Brasil e membro do Partido da Causa Operária – Curitiba.

Coluna

As instituições a serviço do imperialismo e da burguesia nacional

Tesouro Nacional e Banco Central: as instituições nacionais a serviço do imperialismo e da burguesia nacional contra o povo

As políticas públicas do Estado brasileiro, o funcionamento administrativo da máquina pública, assim como os salários dos servidores públicos e os investimentos das empresas estatais, mistas, autarquias e demais repartições públicas, como os próprios três poderes e o aparato militar, dependem desse orçamento federal e que também nutrem os Estados e municípios com os fundos de participação, por exemplo. Se existe um teto ou limite máximo de gastos públicos, como poderiam esses recursos ser suficientes para manter, por exemplo, o Sistema Único de Saúde (SUS) funcionando adequadamente numa situação de pandemia como no Brasil na entrada de 2020, por exemplo?

Se os cidadãos dependem exclusivamente do sistema público de saúde e, por alguma razão, o orçamento destinado a esse setor é insuficiente devido à prioridade de pagar os juros da dívida pública, de acordo com a imposição legal no caso da LRF e da Lei do Teto de Gastos Públicos, como o Estado poderá acolher ou não os cidadãos neste quesito essencial? Nesse caso, expressa-se a desigualdade de acesso às políticas públicas por parte das populações mais carentes, isto é, a esmagadora maioria dos cidadãos brasileiros que não têm como pagar planos de saúde privados. Mas quanto à necessidade de transplantes de órgãos, que na maioria são realizados por hospitais públicos e muitos universitários, isso também atinge aqueles da remuneração mais alta, já que se trata de uma infraestrutura que, em grande medida, o Estado tem mais suporte, e a própria lei de acesso aos órgãos segue uma fila de acordo com prioridades de atendimento. Sendo assim, tratar o assunto da dívida pública operada entre o Tesouro Nacional e o Banco Central, como instituição máxima da intermediação do fluxo monetário, é lidar com a questão histórica de base da expropriação nacional, onde reside a desigualdade.

Essa situação cada vez mais dramática na sociedade brasileira em termos de desigualdade necessita de uma ampliação ainda maior de espectro, tendo como alicerce maior a drenagem de recursos orçamentários do Tesouro Nacional, que é o guardião do orçamento público federal, na direção ou para o pagamento dos juros dos títulos públicos que o Banco Central remunera no mercado financeiro. O golpe de Estado de 2016, a pandemia SARS-CoV-2 de 2020-21 no Brasil e a crise estrutural do capitalismo mundial aceleram medidas políticas e econômicas que possam responder aos anseios vorazes do sistema econômico e financeiro global em tempos de crise profunda do capitalismo.

No caso do capitalismo dependente brasileiro, a extração de mais-valor ocorre desde as terras agricultáveis ou não, da pilhagem dos recursos naturais e do patrimônio público, passando pelos setores da indústria, comércio e serviços, e em especial o mercado financeiro, que no país representa a maior fatia de expropriação e extração de mais-valor por parte dos capitalistas tradicionais e emergentes, em conluio com o imperialismo capitaneado pelos EUA e seus consortes europeus e asiáticos em grande escala. A parte referente ao Canadá e nações de bandeira anglo-saxônica, como Austrália e Nova Zelândia, são satélites estratégicos de dominação geopolítica, e, no caso desses dois últimos, ainda mais subservientes à ordem global. A simbiose necessária argumentativa para explicar os fundamentos da desigualdade social no Brasil, como dissemos no preâmbulo da nossa discussão, não parte do ponto de vista strictu sensu das engrenagens ou mecanismos do Sistema da Dívida Pública, abordado também por Fatorelli nesse espaço de discussão.

O Banco Central do Brasil tornou-se a instituição política e econômica mais poderosa do país a partir do Plano Real em diante, onde o centro decisório da política econômica passa às mãos do seu presidente e demais membros do Comitê de Política Econômica (COPOM), que, na sua composição, aglutinou forças em torno do cartel dos maiores bancos brasileiros e suas estreitas vinculações com a sofisticada engenharia financeira organizada em torno do BIS (o banco central dos bancos centrais mundiais) e seus parceiros multilaterais, como FMI, BIRD, BID e outros que compõem o sistema financeiro internacional. A autonomia e a independência do Banco Central estão prestes a se ratificar de forma legal-institucional, e o nível de poder decisório será ainda mais avassalador no sentido de favorecer os privilégios do setor financeiro em detrimento das políticas públicas e dos projetos nacionais de desenvolvimento, mesmo para um país atrasado e dependente como o Brasil. Entrementes, essa explicação carece de uma análise mais robusta sob o ponto de vista histórico de como pavimentamos essa estrada do atraso e da subserviência aos ditames do imperialismo. O Banco Central foi erguido sob o machado da exploração e sob o jugo do grande capital, de forma secular, no processo de gestão embrionária da nossa sociedade escravocrata colonial. Desta maneira, alguns dos principais aspectos que compõem a organização do capitalismo brasileiro precisam ser mais bem esmiuçados no processo de compreensão.

O capitalismo brasileiro construiu ao longo das gerações instituições modernas, mesmo sob a égide do imperialismo, inserido principalmente na órbita geopolítica dos EUA. Ao mesmo tempo, essas mesmas instituições estão permeadas de poderosas articulações entre diversas frações de classe da burguesia, desde as oligarquias colônias de dominação familiar histórico-secular. Ao lançarmos um fio condutor de análise sócio-histórico, precedemos de uma abordagem que combine interesses da classe dominante, que controla o aparelho estatal e também conduz os negócios privados, numa dialética permanente entre “bens públicos” e interesses privados imbricados entre a classe dominante nacional e a burguesia imperialista desde a gênese colonial da Coroa Portuguesa. Mas, afinal, a corrupção pertence única e exclusivamente aos mandatários proprietários de terras e agentes públicos concomitantemente desde a formação do Estado brasileiro ou, ao mesmo tempo, estão vinculados aos negócios “privados” ou apropriados desta maneira, num emaranhado de imbricações que geram diversas formas de corrupção além da dicotomia público e privado?

A maior corrupção se encontra na engrenagem do sistema da dívida pública, na entrega do patrimônio público e dos recursos naturais para o controle dos capitalistas nacionais e do imperialismo, que perpetua a pilhagem colonial na forma do capitalismo ultraliberal. Se a pequena burguesia, e até mesmo a esquerda bem comportada, fala em corrupção, a explicação não é moral, mas sim pela via material, concretamente determinada pelas relações sociais de produção da reprodução na expropriação histórica secular.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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