Teoria marxista

UP transforma Comuna de Paris em colônia de férias de Paris

Tomada do poder pelos operários de Paris provou que a etapa de progresso do capitalismo acabou, uma conclusão de Marx ignorada por revolucionários pequeno-burgueses

Em artigo publicado no portal A Verdade, órgão do partido Unidade Popular (UP), Carlos Alberto Coutinho lembra os 153 anos da Comuna de Paris. O autor escreve frases vazias como que “a classe operária havia provado ao mundo que uma outra sociedade é possível”, mas deixa de lado as lições mais importantes do movimento que consistiu no primeiro governo dos trabalhadores da história. A maior prova disso é que, em todo o texto, não é possível encontrar o termo “ditadura do proletariado”, que é justamente o termo que sintetiza as principais conclusões de Marx sobre o assunto.

Imediatamente após a ocorrência desse importante evento histórico, Karl Marx analisou minuciosamente a Comuna de Paris e utilizou a sua experiência para demonstrar, de um ponto de vista prático, que o Estado não poderia ser imediatamente abolido, mas precisaria antes ser tomado pelos trabalhadores, que, por meio desse instrumento de repressão, terminaria a luta contra a burguesia, eliminando os restolhos da sociedade decadente. Ainda, as conclusões apresentadas por Marx e Engels da Comuna de Paris foram essenciais à ala revolucionária II Internacional, destacadamente os russos, liderados pelos bolcheviques. No clássico O Estado e a Revolução, Vladimir Lênin escreveu que “muito embora o movimento revolucionário das massas falhasse ao seu objetivo [na Comuna], Marx viu nele uma experiência histórica de enorme importância, um passo para a frente na revolução proletária universal, uma tentativa prática mais importante do que centenas de programas e argumentos. Analisar essa experiência, colher nela lições de tática e submeter à prova a sua teoria, eis a tarefa que Marx se impôs”.

Esta é a consideração do principal líder da Revolução Russa pela análise produzida por Marx da Comuna, algo solenemente ignorado pelo partido esquerdista brasileiro. Em outra obra, “A guerra civil na França”, Marx debateu o problema do Estado operário durante a marcha dos eventos, com o livro sendo publicado em junho de 1871, um mês após a derrota da Comuna. Nele, a constituição da ditadura do proletariado é discutida pelo revolucionário pela primeira vez na história.

Nada disso, no entanto, tem a menor relevância para a UP e, deste erro, originam-se outros, presentes no artigo de maneira implícita, por exemplo, quando Coutinho escreve:

“Os burgueses venceram aquela batalha [Revolução de 1848]. A derrota colocou a classe operária da França na defensiva, o que permitiu a constituição da República burguesa. Com a derrota dos revolucionários em junho, a burguesia consolidou seu domínio pleno, o que não trouxe nenhuma melhoria material às classes oprimidas, em especial à maior classe da França naquele período, os camponeses.”

A ideia de que o “domínio pleno da burguesia” não traz “nenhuma melhoria material às classes oprimidas” é absurda. Comparado com a miséria e o atraso do feudalismo, o capitalismo é sim uma importante evolução e fator de progresso humano. Um marxista mais criterioso diria que esse progresso guarda contradições, mas negá-lo como faz o articulista de A Verdade indica, paradoxalmente, que não é a verdade o que mobiliza o órgão, mas um conto moral, para socialistas utópicos, atrasados em última instância.

Isso porque tais colocações mostram que o autor é incapaz de entender o capitalismo como parte de um processo de desenvolvimento das sociedade humana. O capitalismo teve uma etapa de progresso e outra importante lição derivada da Comuna de Paris é que a etapa de progresso do regime burguês chegou a seu ápice.

As confusões continuam sendo expressas quando o autor diz que “o Segundo Império francês deu à burguesia a ‘tranquilidade’ que tanto exigia para que seus negócios prosperassem. Com a repressão brutal dos camponeses, dos operários e de povos de outras nações do mundo, a economia francesa adquiriu proporções inimagináveis.” Mais uma vez, a história do bem contra o mal substitui a dialética como ferramenta de análise histórica, que desconsidera o fato de o problema de “a economia atingir proporções inimagináveis” não passa pela “repressão brutal” dos povos oprimidos, mas pelas condições econômicas da etapa progressista do sistema capitalista. Foi a ditadura da burguesia contra a aristocracia feudal que permitiu o desenvolvimento econômico, assim como a ditadura do proletariado contra a burguesia é o que permitirá uma nova etapa de desenvolvimento da sociedade

A “repressão brutal” contra a classe trabalhadora sempre existiu, porém, no século XIX, o capitalismo ainda não tinha sido totalmente dominado pelos monopólios que serviriam de base para a etapa do imperialismo. Essa razão, aliada ao mercado mundial ainda em formação, sim, possibilitaram à França produzir uma riqueza real, fundamental para o enriquecimento “em proporções inimagináveis”. Um observador mais atento pode ver a fraqueza do argumento apresentado por Coutinho observado a situação deplorável dos trabalhadores hoje, submetidos a uma repressão tão ou mais brutal do que nos séculos anteriores, sem que isso implique no crescimento real da economia, completamente parasitada pelos banqueiros e os monopólios.

Ao dizer que “a classe operária havia provado ao mundo que uma outra sociedade é possível”, o autor faz uma poesia desprovida de sentido político real, baseada em uma concepção do socialismo utópico, como se a classe operária tivesse aprovado um novo projeto, o que é totalmente falso. O que a classe operária provou e que deve ser enaltecido para a manutenção dos objetivos libertadores da Comuna, é, em primeiro lugar, que a burguesia é incapaz de liderar o processo revolucionário, de onde decorre a necessidade da ditadura do proletariado. Sendo a Comuna de Paris o grande marco histórico de que a etapa revolucionária da burguesia acabara e ela se tornava desde então uma classe reacionária, outra classe precisará tomar as rédeas do processo revolucionário para, assim, avançar na transformação social, a partir do ponto onde burguesia parou.

Não é que a classe operária provou que um mundo novo é possível. Ela provou que a classe revolucionária é a classe operária. As tarefas inconclusas da revolução burguesa precisarão ser resolvidas pelo proletariado, que precisará impor sua ditadura para isso, até que o Estado enquanto estrutura política de dominação seja destruído.

A Comuna provou que a etapa de progresso social do capitalismo se fechou. O fato dessas conclusões fundamentais serem ignoradas pelo artigo do órgão da UP, mostram acima de tudo um diletantismo incompatível com um partido verdadeiramente orientado pelo marxismo e para a luta revolucionária do povo trabalhador.

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