Nessa semana, o caso dos ex-jogadores Robinho e Daniel Alves ganhou muita repercussão. O primeiro foi levado preso na última quinta-feira (21), após a Justiça brasileira ter decidido que sua condenação por estupro na Itália era o suficiente para condená-lo no Brasil. Já Daniel Alves reapareceu nos noticiários porque a Justiça espanhola concedeu fiança para sua libertação provisória.
Os dois casos envolvem jogadores brasileiros e condenações por estupro em países europeus. Há outra coisa comum entre os dois casos: uma histeria que lembra o comportamento daqueles noticiários policiais cuja filosofia é “tolerância zero”, “bandido bom é bandido morto” e coisas do tipo. A imprensa capitalista cria esse clima para reforçar a defesa de uma política autoritária.
Assim, criado o clima repressivo, a burguesia pode, sempre que necessário aos seus interesses, recrudescer o regime político. Nada melhor do que fazer isso usando “tenebrosos crimes de estupros” cometidos por jogadores de futebol ricos. Sim, porque se fossem apenas ricos, não seria muito boa propaganda, afinal, os ricos são a burguesia. O jogador de futebol é apenas uma pessoa com muito dinheiro, mas ele não faz propriamente parte da burguesia.
Com o caso Robinho, a burguesia brasileira abre um perigoso precedente que é o de condenar um cidadão nascido no Brasil por um julgamento feito em outro país. No caso de Daniel Alves, a campanha foi contra o direito à fiança.
Está claro que todo o clima repressivo é estimulado pela burguesia e pela direita. O que é escandaloso, no entanto, é a política da esquerda em relação a casos como esse.
A esquerda pequeno-burguesa, seduzida pela campanha cínica e demagógica da burguesia de “defesa da mulher”, transformou-se na principal correia de transmissão da política repressiva.
Até Lula caiu no conto da direita e atacou o direito à fiança: “o Daniel Alves pode ser libertado se pagar uma coisa. Eu aprendi lá em Pernambuco, quando eu era pequeno, que as pessoas diziam ‘aqui no Nordeste quem tem 20 conto de réis não é preso’, e a gente está vendo que essa máxima continua”. A confusão é total. Lula confunde o direito à fiança, que deveria ser garantido para toda a população, com o privilégio de ricos e poderosos que controlam a justiça.
E é justamente porque a Justiça é controlada pelos poderosos que qualquer direito que favoreça o cidadão comum deve ser defendido, não só a fiança, mas também o habeas corpus, o direito de ampla defesa, o direito de responder em liberdade. A esquerda lutou por todos esses direitos, pois sabe que eles são uma pequena garantia contra as arbitrariedades judiciais. Quando Lula foi perseguido, a esquerda lutou para que ele tivesse esses direitos, para que lutasse contra as acusações feitas contra ele em liberdade.
No caso da fiança, o juiz simplesmente deve estabelecer o valor de acordo com o poder aquisitivo da pessoa, ou seja, o rico deve ter uma fiança muito alta e o pobre, uma fiança baixa. Se há um problema de classes sociais, como se preocupa Lula, ele deve ser resolvido assim, e não simplesmente cortando um direito fundamental.
A esquerda, ao defender o fim dos direitos democráticos, está se juntando aos bolsonaristas. É uma vergonha e um abandono de qualquer tradição de luta progressista. Com essa política, a esquerda vai entregar o povo para a direita, que sabe muito melhor do que a esquerda ser defensora da repressão.