A recente pesquisa do Núcleo de Estudos Raciais do Insper trouxe à tona uma realidade alarmante e já conhecida: a diferença de tratamento pela polícia de São Paulo entre pessoas brancas e negras quando se trata de porte de drogas. Segundo o estudo, 31 mil pessoas negras foram enquadradas como traficantes em situações onde brancos foram tratados como usuários, evidenciando um viés racial nas decisões policiais. Tiago Pires, militante do Coletivo de Negros João Cândido e do Coletivo de Negros do Partido da Causa Operária (PCO), comenta sobre essa situação.
Tiago Pires enfatiza que “esses casos onde os negros são enquadrados como traficantes portando a mesma quantidade de drogas que pessoas brancas, que são tratadas como meros usuários, revelam que tanto a polícia militar quanto o conjunto do aparato repressivo do estado, que inclui o judiciário, existem finalmente para perseguir a população pobre e preta”.
A declaração de Pires é respaldada pelos dados do estudo. A análise de 3,5 milhões de boletins de ocorrência feitos de 2010 a 2020 mostrou que a possibilidade de um suspeito preto ou pardo ser enquadrado como traficante é 1,5% maior do que um suspeito branco em situações semelhantes. Embora o percentual possa parecer pequeno, na prática ele resulta em milhares de negros encarcerados injustamente.
Para Pires, essa discriminação não é um acidente. Ele cita um caso emblemático onde um jovem negro foi preso por portar um grama de cocaína, e a então vice-procuradora geral Lindôra Araújo reconheceu que se a motivação racial fosse oficialmente admitida, “o estado teria que libertar milhões de pessoas”.
Pires argumenta que esses dados “revelam finalmente para que serve o código penal, as leis e toda a estrutura da justiça brasileira: perseguir e prender a população pobre e preta”. Ele critica a inércia da esquerda e destaca a necessidade de uma resposta mais contundente e organizada contra essa injustiça.
A pesquisa também indica que o grau de instrução é um fator determinante na decisão de quem é tratado como usuário ou traficante. Pessoas com ensino médio completo ou superior têm mais chances de serem enquadradas como usuárias, enquanto aquelas com menor grau de instrução, predominantemente negras, são mais frequentemente tratadas como criminosas.
Além disso, a diferença no tratamento racial é mais evidente em casos de porte de pequenas quantidades de drogas consideradas leves, como a maconha. A falta de critérios objetivos na lei 11.343/2006, que deixou de punir consumidores de drogas ilegais e aumentou a pena dos traficantes, dá margem para decisões subjetivas e discriminatórias por parte dos agentes de segurança.
Pires ainda criticou a política geral das organizações do movimento negro. “Essa iniciativa acaba sendo de extrema importância para superar toda essa confusão e também as barreiras impostas por essas organizações que finalmente abandonaram a luta e só pensam em eleição”.