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Ascânio Rubi

Ascânio Rubi é um trabalhador autodidata, que gosta de ler e de pensar. Os amigos me dizem que sou fisicamente parecido com certo “velho barbudo” de quem tomo emprestada a foto ao lado.

Coluna

O golpe do Bolsonaro e os outros golpes

Usar o poder das instituições burguesas para fazer política nunca vai favorecer o povo   

Na esquerda pequeno-burguesa, que ultimamente se curvou ao ativismo jurídico-identitário, a possibilidade de ver Bolsonaro atrás das grades é motivo de grande entusiasmo. Disposta a aplaudir as eventuais manobras legais que podem levar a esse desfecho, esquece-se de que os mesmos estratagemas foram empregados para depor Dilma Rousseff e impedir Lula, por meio de prisão arbitrária, de concorrer nas eleições.

Ouve-se que Bolsonaro cometeu o crime de ter tentado dar um golpe de estado. No artigo 359-M, da lei nº 14.197/2021 (que revogou a Lei de Segurança Nacional), lê-se que constitui crime a tentativa de “depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído”. O fato é que as informações coletadas mostram conversas de teor golpista nas quais a tese aventada era a de que o tal golpe deveria ser dado antes das eleições, pois Bolsonaro estava convencido de que seria derrotado por fraude nas urnas eletrônicas.

Não houve golpe. Houve eleição e Lula venceu. Depois, o famoso domingo de 8 de janeiro de 2023, quando os bolsonaristas acampados diante do Quartel-General do Exército em Brasília invadiram e depredaram prédios do governo. Bolsonaro, na ocasião, estava fora do país. Como sabemos, por causa dessa ação, muita gente já foi condenada a penas longas, chegando a 17 anos de reclusão. O fato tem sido chamado de “ato golpista”, embora não tenha havido o mais importante: um líder que se sentasse na cadeira presidencial e, com o apoio das Forças Armadas, tomasse o poder. Houve quem defecasse na mesa de um juiz do STF, mas não houve tomada do poder.

Em 2016, no entanto, houve deposição da presidenta eleita sem cometimento de nenhum tipo de crime. Na ocasião, no auge da Operação Lava Jato, a imprensa burguesa esgrimia argumentos para convencer a população da legalidade do “impeachment”. Foram muitas as páginas gastas para explicar o que eram “pedaladas fiscais” (usadas como desculpa para a condenação de Dilma Rousseff), procedimento tão comum em todos os governos que Temer, tão logo se acomodou na cadeira presidencial, fez entrar para a legalidade. De resto, não tomamos conhecimento das reuniões e dos planos de teor golpista, que devem ter sido urdidos durante jantares privados nas mansões da burguesia, longe das câmeras.

Admira muito que a esquerda pequeno-burguesa se exalte tanto com a possibilidade de prisão de Bolsonaro por ser ele um “golpista” quando os verdadeiros golpistas, os que efetivamente tomaram o poder sem voto, são os autores das manobras para prendê-lo por algo que, queiramos ou não admitir, ele não fez.

Aliás, seria bom recolher o entusiasmo, porque a burguesia, conforme se vê, por exemplo, em recente editorial da Folha, já está recuando. Afinal, Bolsonaro e sua militância são objeto de desejo da classe mais poderosa da sociedade, que tem sabor de picolé de chuchu. Quem sabe, passado o susto, Bolsonaro se deixe domar pela burguesia financista aliada do imperialismo.

Ademais, a inelegibilidade de Bolsonaro favorece eleitoralmente o renascer do PSDB, que, por ora, travestido de PSB, se imiscuiu no governo de Lula. Sem Bolsonaro no páreo, é muito mais fácil levar o grosso do eleitorado de direita de volta para o cercadinho da burguesia. De resto, usar o poder das instituições burguesas para fazer política nunca vai favorecer o povo.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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