A Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) anunciou que está retirando a maior parte das sanções impostas ao Níger depois do golpe militar nacionalista de 2023. A retirada faz parte de uma mudança na política da CEDEAO em relação aos governos nacionalistas da região que ganham cada vez mais força, além do Níger, também em Burquina Fasso e no Mali. Estes três no mês de fevereiro anunciaram a criação da Confederação dos Estados do Sael e se retiraram da CEDEAO.
No sábado (24), o presidente da Comissão da CEDEAO, Omar Alieu Touray, afirmou que a zona de exclusão aérea e o fechamento de fronteiras estão entre as sanções sendo levantadas “com efeito imediato”. Ele ainda afirmou que o fim das sanções se dá “puramente por razões humanitárias” para aliviar o sofrimento causado. A declaração foi dada em uma cúpula da CEDEAO na capital da Nigéria, Abuja.
A cúpula teve como objetivo principal formular uma política para as ameaças da região como os grupos armados como o Estado Islâmico. Além disso, tinha como objetivo tomar medidas para reincorporar o Níger, Mali e Burquina Fasso ao bloco, uma tentativa de fazer os países revogarem sua decisão. Há uma forte tendência nacionalista na África Ocidental que pode desmantelar completamente a CEDEAO. Na Guiné também houve um golpe nacionalista, menos radical que nos outros três países, e no Senegal a crise é gigantesca em torno das eleições.
O presidente da CEDEAO e presidente nigeriano, Bola Tinubu, ao abrir a cúpula, afirmou que o bloco “deve reexaminar [sua] abordagem atual à busca de ordem constitucional em quatro de nossos Estados-membros”, referindo-se aos três países suspensos e também à Guiné. Tinubu pediu aos três países para “reconsiderar a decisão” e disse que eles não deveriam “perceber nossa organização como inimiga”.
A CEDEAO também afirmou que suspendeu algumas sanções contra indivíduos do Mali e algumas contra a junta militar que governa a Guiné. Este país não expressou a intenção de sair do bloco, mas também não se comprometeu com os pedidos para retorno ao “governo democrático”. O caso da Guiné demonstra que a CEDEAO tenta manter relação com os países, mas ainda está radicalmente contra os governos militares de tendências nacionalistas.
O golpe militar no Níger e a CEDEAO
Em 26 de julho de 2023, no aniversário de 70 anos do assalto ao quartel de Moncada pelos cubanos, os militares do Níger tomaram o poder, derrubando o fantoche dos franceses Mohamed Bazoum. Foi o terceiro golpe de Estado nacionalista na região em menos de dois anos. O novo governo começou rapidamente a se chocar com a França, que controlava o país indiretamente. Os dois principais focos da disputa foram a mineração de urânio, maior riqueza do Níger, e a presença das tropas francesas no território.
Os dois primeiros meses foram de gigantesca crise, naquele momento se discutia todos os dias uma possível guerra. Uma das possibilidades seria com a própria França, a outra, provável, com a CEDEAO. De princípio os franceses pensaram em bombardear o Níger, mas a Argélia negou acesso ao seu espaço aéreo. Ao mesmo tempo, a crise do governo Macron era gigantesca e seria difícil entrar em guerra diretamente na África. O imperialismo então acionou a CEDEAO.
A situação foi tão dramática que a própria Victoria Nuland, subsecretária de Estado dos EUA e organizadora do golpe de 2014 na Ucrânia, foi a reunião da CEDEAO e visitou o próprio Níger para ameaçar os militares. As sanções econômicas, as mesmas que estão sendo suspensas agora, foram impostas quase que imediatamente. A discussão, então, seria como invadir o Níger para “reinstaurar a democracia”. Seria necessário usar algum país da África de bucha de canhão nessa operação.
A Costa do Marfim era a melhor opção, mas ela não faz fronteiras diretas com o Níger. Apenas a Nigéria seria capaz de invadir o país, e a crise se instaurou no mais populoso país da África. Sendo quase o mesmo país, tendo até o mesmo nome, a invasão foi impossível. As mobilizações próximas à fronteira a favor do novo governo do Níger começaram a crescer. O recém-eleito presidente Bola Tinubu, um lacaio do imperialismo, não conseguiu controlar a crise interna. A burguesia da Nigéria não estava disposta incendiar o país em defesa da França.
E assim o Níger venceu, quase sem disparar um tiro. No mês de dezembro todas as tropas francesas se retiraram do país. Desta forma, os três países da Aliança do Sael não estavam mais ocupados pela França, sua parceria só aumentou. E, em conjunto, a parceria com os vizinhos também se fortalece nas relações com a Rússia, muito admirada pelo povo do Níger em todas as manifestações, e também o Irã.
Agora a CEDEAO, que em julho de 2023, queria até mesmo invadir o Níger, implora pelo seu retorno ao bloco, a própria CEDEAO tem a sua existência ameaçada e quem desferiu o maior golpe foram os militares do Níger. O imperialismo se esfacela na África e o caso do Sael pode se tornar algo prevalente em todo o continente.