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Ásia

Índia: camponeses saem às ruas aos milhares e são reprimidos

Camponeses e trabalhadores rurais são reprimidos após tentarem marchar à capital, exigindo do governo melhores condições de trabalho

Há cerca de uma semana, grandes manifestações de camponeses e trabalhadores rurais vem ocorrendo próximo de Nova Déli, capital da Índia.

Os protestos se iniciaram no dia 13 de fevereiro de 2024, e decorrem da cada vez mais precária condição de vida do campesinato e proletariado rural indiano.

Segundo reportagem da Al Jazeera, emissora do Catar, “na Índia, os especialistas dizem que a agricultura tem atravessado uma grave crise devido ao aumento das condições meteorológicas extremas, combinadas com a redução do lençol freático, afetando os rendimentos e empurrando os agricultores para uma profunda dívida”. Na matéria é ainda apontado que o povo do campo é afetado por uma “epidemia” de suicídios, dada sua situação cada vez mais difícil: 

“Milhares de agricultores tiram a própria vida todos os anos. Em 2022, dados recolhidos pelo National Crime Records Bureau (NCRB) mostram que 11.290 agricultores morreram por suicídio.” 

Assim, organizações de agricultores decidiram cobrar do governo de Narendra Modi (primeiro-ministro) que cumprisse as promessas que havia feito ao povo do campo quando dos grandes protestos de 2020 e 2021.

Em 12 de fevereiro, representantes das organizações populares reuniram-se com representantes do governo a fim de chegar a um acordo. Contudo, mesmo com as tratativas se estendendo até o fim da noite, nada foi firmado, o que acabou resultando na onda de mobilizações que segue acontecendo.

No início dos protestos, os camponeses se reuniram na fronteira de Shambu, entre os estados de Hariana e Punjab. O estado de Harina faz fronteira com o de Dele, onde fica a capital da Índia, Nova Deli. É para lá que os manifestantes pretendiam marchar, com a finalidade de pressionar o governo Modi a atender suas reivindicações, que são várias, conforme divulgado pelos jornais The Economic Times e Hindustan Times:

  • Que o governo de Narendra Modi garanta preços mínimos dos produtos agrícolas, através do chamado Preço de Apoio Mínimo, política que visa a garantir um lucro mínimo para a colheita, ao mesmo tempo em que garante a produção agrícola e o fornecimento de víveres para a população indiana, salvaguardando a segurança alimentar. Este também foi a principal demanda dos protestos camponeses que ocorreram nos anos de 2020 e 2021;
  • Que seja garantido pensão de 10 mil rúpias (moeda indiana) por mês para camponeses acima de 60 anos;
  • Que sejam fixados salários diários para camponeses regidos pela Lei Nacional de Garantia de Emprego Rural (MGNREGA, na sigla em inglês), devendo ser de  700 rúpias por dia. Igualmente, requerem que sejam garantidos anualmente 200 dias de emprego;
  • Que o governo garanta 50% do lucro dos produtores agrícolas, sobre o custo total da produção;
  • Que sejam implementadas as recomendações do comitê MS Swaminathan sobre agricultura (Comissão Nacional de Agricultores), o qual foi criado em 2004 para dar uma solução para a “epidemia” de suicídios que existem entre os camponeses indianos;
  • Que o governo honre a promessa feita de duplicar o rendimento dos agricultores, pois os custos da atividade agrícola aumentaram exponencial e rapidamente nos decorrer dos últimos anos, enquanto que a renda dos camponeses ficou estagnada, gerando defasagem, que foi justamente uma das promessas feitas na conjuntura dos protestos anteriores;
  • Retirada das acusações e processos abertos contra os manifestantes e lideranças dos protestos de 2020-2021.

As organizações que lideram a marcha são as coalizões sindicais Samyukta Kisan Morcha e Kisan Mazdoor Morcha. Por sua vez, relata-se que suas lideranças são Jagjit Singh Dallewal de BKU (Dallewal) – Sindicato Bharatiya Kisan – e Sarvan Singh Pandher do Kisan Mazdoor Morcha.

Segundo as lideranças, mais de 250 sindicatos de camponeses e trabalhadores rurais se juntaram aos protestos, com camponeses vindo de todas as partes do país. Contudo, de acordo com os relatórios (governamentais), a maioria dos camponeses seria de Hariana, Punjab e o oeste de Uttar Pradesh, outro estado.

A marcha conta com dezenas de milhares de camponeses, muitos em veículos motorizados, como tratores; muitos outros a pé. Contudo, apesar da sua amplitude, o aparato de repressão conseguiu barrar o avanço dos agricultores, de forma que eles permanecem estacionados a cerca de 200 km de Nova Deli. Afinal, segundo informações da imprensa, as polícias de Hariana e Delhi têm ordens de impedir que os camponeses cheguem à capital.

Vale ressaltar que o estado de Hariana é governado pelo Bharatiya Janata (BJP), partido do primeiro-ministro Narendra Modi, de forma que as forças policiais de lá possivelmente seguem ordens do governo nacional.

Foi necessária violenta repressão por parte do governo para impedir a marcha de avançar. Na ação repressiva foram (e continuam sendo) utilizadas bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e barricadas de concreto envolto com arame farpado, as quais foram montadas em inúmeras fronteiras, tais como as de Gazipur, Shambhu e Tirki.

Segundo relatos de camponeses e trabalhadores que foram reprimidos, a polícia não está simplesmente utilizando balas de borracha, mas também municiando suas armas de contenção com projéteis de ferro.

“Eu estava acalmando os manifestantes quando fui atingido. Eu não conseguia entender se foi uma bala ou outra coisa que me machucou”, relata Balvinder Singh, com o olho ensanguentado por um ferimento causado por uma bala de ferro disparada pela polícia, em um hospital em Patiala, Punjab (informações da rede Al Jazeera):

Anteriormente, o governo restringia o uso desse método na contenção de protestos na Caxemira. Agora, segundo os relatos, está se generalizando.

Contudo, embora o aparato repressivo tenha impedido os camponeses e trabalhadores de chegarem à capital, a manifestação não arrefeceu, de forma que, no dia 18 de fevereiro, houve nova reunião entre representantes do governo e líderes das organizações dos agricultores. 

O governo propôs um contrato de cinco anos com preços garantidos para cinco produtos, incluindo leguminosas, milho e algodão. A proposta foi rejeitada. Segundo os representantes do movimento, esse controle de preços, que usualmente só é aplicado ao trigo e ao arroz, pode ser aplicado para 23 tipos de cultivo, conforme informações da agência de notícias Associated Press.

Assim, após oito dias, os protestos seguem, assim como a repressão, de forma que os agricultores ainda não conseguiram marchar para a capital. Sobre isto, há informações de que o governo está usando a Seção 144 do Código de Processo Penal de 1973. Tal dispositivo é frequentemente utilizado para proibir reuniões quando o governo acredita que elas poderão sair de seu controle. Isto é, uma lei profundamente antidemocrática.

Apesar dos fatos indicarem que tais protestos são realmente protestos populares, é importante destacar que é ano de eleições gerais na Índia. E a tendência é que Narendra Modi, atual primeiro-ministro, seja eleito para um terceiro termo, com superioridade sobre demais candidatos. Ao que tudo indica, seu partido, o BJP, também tende a sair vitorioso nas eleições.

Isso torna necessário levantar a hipótese de que esse movimento possa estar sendo, ou possa vir a ser, manobrado por políticos de oposição a Modi. Não para atender aos interesses dos camponeses e trabalhadores rurais, mas para atender a interesses escusos.

Nesse sentido, Jagjit Singh Dallewal, que diz falar em nome dos manifestantes, afirmou que “a popularidade de Modi está no auge. Seu gráfico subiu por causa de Ram Mandir. Temos menos tempo. Temos que derrubar o gráfico de Modi“, declaração que deixa claro que ele busca impulsionar o movimento para interesses eleitorais.

A respeito dessa declaração, Manohar Lal Khattar, ministro-chefe de Hariana, disse que “não é apropriado comentar, mas é evidente que eles [agricultores] estão recebendo apoio de algum lugar ou de outro […] O governo de Punjab poderia tê-los impedido, mas não o fizeram, isso mostra que deve haver algum entendimento. O governo de Deli diz que eles apoiam o movimento dos agricultores“.

Por fim, como nessas eleições gerais será escolhido quais forças políticas irão governar a Índia, não se pode descartar a intervenção do imperialismo. Afinal, o país asiático é o segundo mais populoso do mundo e membro do BRICS. O imperialismo já demonstrou interesse em utilizar a gigantesca população da Índia para os mesmos fins que se utilizou da classe operária chinesa nas décadas de 1980 e 1990: dar sobrevida ao imperialismo, com a política neoliberal. Nisto, já demonstrou ressalvas e desconfianças em relação a Narendra Modi e seu “nacionalismo hindu” e proximidades com a Rússia mesmo após o início da Guerra na Ucrânia.

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