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José Álvaro Cardoso

Graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina, mestre em Economia Rural pela Universidade Federal da Paraíba e Doutor em Ciências Humanas pela UFSC. Trabalha no DIEESE.

Coluna

Evolução do PIB e o desafio do desenvolvimento nacional

Como o Brasil, entre os países atrasados, é um dos mais industrializados ainda, quanto toma qualquer iniciativa na direção do desenvolvimento, é atacado com muita ferocidade

Segundo os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a economia brasileira cresceu 3,3% no segundo trimestre de 2024, na comparação com o mesmo período do ano passado. Esse resultado superou a maioria das expectativas, que apontavam um avanço em torno de 2,7%, na mesma base de comparação. Em relação aos primeiros três meses do ano o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,4%.

O crescimento no trimestre foi liderado pela Indústria (+1,8) e Serviços (+1%). Na indústria, destaques no trimestre para eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos e na construção civil. Na comparação anual, a indústria avançou 3,9%, o setor de serviços, que responde por quase 70% do PIB, cresceu 3,5%. Na Agropecuária, houve um recuo de 2,9% na comparação anual, causado pelos recuos da produção de soja e milho devido às condições climáticas desfavoráveis. Condições essas que não afetaram da mesma forma a pecuária e outras culturas agrícolas, que apresentaram bom desempenho no período como foi o caso do algodão e café.

Em valores correntes o PIB totalizou R$ 2,89 trilhões no trimestre, acima em 6,4% do valor verificado nos primeiros três meses deste ano (R$ 2,71 trilhões) e em 6,9% o total obtido no segundo trimestre do ano passado (R$ 2,7 trilhões). Conforme a Tabela abaixo, no segundo trimestre de 2024, frente ao mesmo período do ano passado, o Consumo das Famílias expandiu 4,9% e a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) cresceu 5,7%. Esses fatores foram fundamentais para o resultado geral do PIB no período, acima das expectativas.

O crescimento do consumo das famílias e da taxa de investimentos acima da média revela uma liderança do consumo interno, em boa parte estimulada pelas políticas de sustentação da renda, operadas pelo governo. Por exemplo, a política de ganho real para o salário-mínimo, que neste ano teve recomposição de 4,57%, exerce forte impacto no consumo, em função de sua influência no conjunto dos salários e no mercado consumidor interno do país.

Os resultados das negociações coletivas no setor privado ajudam também a incrementar o mercado consumidor interno e puxar o crescimento: de 482 negociações da data-base maio, registradas no Mediador até 4 de junho, segundo o Dieese, 87,3% resultaram em ganhos reais aos salários, na comparação com o INPC-IBGE. Outras 10,4% conquistaram reajustes iguais à inflação e apenas 2,3% ficaram abaixo do índice inflacionário. A variação real média dos reajustes de maio foi de 1,86%, percentual modesto, mas que faz grande diferença no reforço da massa salarial.

Além do consumo de bens e serviços ter incrementado no terceiro trimestre (o setor de Serviços, também expandiu 3,5%, ajudando a puxar o crescimento) a FBCF (que indica quanto do novo valor adicionado da economia é investido), cresceu 5,7% no trimestre, comparado ao mesmo período do ano passado. Em uma conjuntura na qual o mercado de trabalho vem apresentando seguidos avanços, e o nível de utilização da capacidade instalada, vem operando acima da média histórica, uma parcela do consumo adicional tem sido suprida pelo crescimento da indústria, o que explica o crescimento do Setor, de 3,6% em um ano, acima do crescimento do PIB no período.

Possivelmente o melhor desempenho da indústria também está relacionado ao impacto das medidas decorrentes da Nova Indústria Brasil (NIB), plano anunciado em janeiro deste ano. A NIB, que prevê um conjunto de metas até 2033, prevê R$ 342,7 bilhões de investimentos até 2026. O plano define 13 instrumentos que poderão ser acionados pelo governo para cumprir as metas (compras governamentais; empréstimos; subvenções; investimento público, créditos tributários, comércio exterior, transferência de tecnologia, propriedade intelectual, infraestrutura da qualidade, participação acionária, regulação, encomendas tecnológicas e requisitos de conteúdo local). É possível que o acionamento de tais instrumentos já esteja provocando resultados no nível de crescimento do setor.

Uma parcela do crescimento da demanda foi também suprida pelo aumento das importações que expandiram 14,8%, muito acima das exportações, que aumentaram 4,5%. Segundo os dados do IBGE, as exportações cresceram, principalmente, pela extração de petróleo e gás natural; indústria alimentícia; agropecuária; e derivados do petróleo. Nas importações, destaque para a indústria automobilística, produtos químicos, produtos de metal, agropecuária e serviços. Ou seja, a balança comercial do período é ilustrativa de um problema estrutural da economia brasileira, que é baixo valor agregado das exportações, quando comparadas às importações.

O Brasil finalizou 2023 na condição de nona economia do mundo. Em 2022, último ano do governo Bolsonaro, o Brasil estava em 11º lugar no ranking. A subida do Brasil no ranking é especialmente relevante. O país sofreu um golpe de Estado em 2016, perpetrado, dentre outros motivadores, pela guerra contra o desenvolvimento econômico nacional. A Operação Lava Jato, que neste ano completou 10 anos de criação (foi fundada em março de 2014) tinha o objetivo não declarado de impedir ou, no mínimo, atrasar o desenvolvimento nacional e fazer o país recuar em todos os sentidos. O caráter antinacional e antidesenvolvimentista do golpe ficou bem caracterizado pelos governos decorrentes (Michel Temer e Jair Bolsonaro), que colocaram em marcha políticas contra o desenvolvimento social e econômico do país.

É significativa a diferença da magnitude do PIB do Brasil, em relação aos primeiros colocados no ranking mundial, especialmente os EUA e a China. Se o Brasil quiser melhorar a vida de seu povo, terá que produzir cada vez mais riqueza. Que, evidentemente, terá que ser distribuída, o país terá que mudar significativamente o perfil de distribuição de renda. Acontece que o desenvolvimento nos países subdesenvolvidos não é um problema de simples dificuldade no ciclo de crescimento, de redução normal da atividade econômica, como ocorre em algumas economias. Na realidade, o problema do crescimento nos países atrasados é uma questão de disputa política, crescer não é um simples desafio de caráter técnico, mas está relacionado à correlação de forças. Esse processo, que não é recente, se agravou com a crise internacional do sistema capitalista, que tornou os países imperialistas ainda mais agressivos contra o desenvolvimento nacional das economias subdesenvolvidas.

Como o Brasil, entre os países atrasados, é um dos mais industrializados ainda – apesar de todo o processo de desindustrialização nas últimas décadas – quanto toma qualquer iniciativa na direção do desenvolvimento, é atacado com muita ferocidade. O sonho dos países imperialistas seria transformar o país em definitivo, em um exportador de matérias primas e em uma base onde as companhias estrangeiras possam explorar seus negócios, aproveitando a abundância de recursos naturais, como petróleo e água, e uma população acostumada a baixos salários. Da qual, inclusive, uma parcela significativa depende de auxílio público para não passar fome. Esse projeto dos países ricos não é voltado exclusivamente para o Brasil, mas é um projeto para o conjunto da América Latina, como é muito claro no caso do processo na Argentina.

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