As eleições do Parlamento Europeu, em que a extrema direita teve um crescimento enorme nos principais países do continente, ligou um sinal de alerta para muitos setores da esquerda. No entanto, a maior parte desses setores da esquerda não compreendeu o problema: os partidos tradicionais do regime político imperialista estão falidos, sejam os de esquerda, sejam os de direita. É o caso do Alberto Cantalice, que publicou o artigo Aprofundamento da democracia política e social é o caminho para frear a extrema-direita, no portal Focus Brasil.
Ele começa o texto com o destaque “o crescimento avassalador dos extremistas de direita na Alemanha – a maior economia do bloco e na França-berço do iluminismo e do Estado de bem-estar, foram as notas dissonantes e preocupantes”. E ele continua “o encurtamento da votação da SPD – social-democrata – e do Die Linke, pós comunista e o ascenso dos neonazistas do AFD apontam um cenário sombrio para a pátria de Hegel, Marx e Goethe”.
Aqui, a ideia é de que os países são tradicionalmente esquerdistas é uma reflexão que demonstra a incompreensão do fascismo. É justamente nos países onde há uma classe operária grande e organizada em que a direita se organiza de forma muito violenta. Tanto a França quanto Alemanha tiveram regimes fascistas no passado.
Ele continua se contentando com supostas vitórias da esquerda: “fato significativo foi uma ligeira recuperação do Partido Socialista em aliança com o Place Publique, liderada por Raphael Glucksmann, com forte apoio nos meios artísticos e intelectuais e que venceu as eleições em Paris. Também mais à esquerda se manteve o France Inssubimisse de Jean Luc Mellenchon com 10%, os ecologistas com 5,5% e os comunistas com 2,36%”.
Tirando o fato de os ecologistas não podem ser considerados propriamente uma esquerda, o fato é que a extrema direita teve um crescimento gigantesco enquanto a esquerda está completamente estagnada. Isso é uma demonstração de falência política, pois em condições naturais a polarização levaria ao crescimento dos dois lados. Basta ver o caso do Brasil, cresce a popularidade de Bolsonaro e também a de Lula. No passado cresceu o Partido Comunista e o Partido Nazista na Alemanha.
Ou seja, os resultados estagnados da esquerda são uma demonstração do tamanho da derrota. Caso houvesse ao menos um crescimento significativo, mesmo que menor que o da extrema direita, isso seria um índice importante.
Ele então afirma: “cabe destacar ainda a resiliência do Partido Socialista Português, tendo na cabeça de chapa Marta Temido, na contenção ao Chega e do Partido Socialista Operário Espanhol de Pedro Sánchez, que em uma disputa de ideias e de caráter cultural, freou a ascensão do direitista Vox. Digno de nota foi também a votação do Partido Democrático na Itália, sob a liderança da ex-deputada Elli Schlein, a maior bancada da centro-esquerda europeia e não flanco interno da Itália, polarizando com o Fratelli d’Italia de Giorgia Meloni. O protagonismo das mulheres em todos os espectros políticos é o fato novo dessa disputa”.
Nestes três países europeus o desenvolvimento da extrema direita parece um puco menor do que na França e na Alemanha. No entanto, isso é menos relevante, pois estes dois sãos as principais econômicas do continente, que definem a tendência geral, e, no fim, o movimento segue sendo o mesmo. A extrema direita cresce em Portugal, na Espanha e na Itália. A Itália inclusive é governada pela extrema direita, ou seja, não há o que comemorar.
Ele então chega à conclusão: “fica, entretanto, o alerta. Sem uma articulação dos setores sociais-democratas com a esquerda socialista, e, até com setores liberais que aceitem a pauta da emergência climática e o restabelecimento do Estado de bem-estar social, a extrema-direita e seu discurso xenófobo e racista continuará avançando”. Aqui está o erro primordial.
Por que na Alemanha e na França a esquerda não cresceu? Justamente por estarem atrelados à política dos partidos que foram derrotados nas eleições. Na Alemanha, inclusive, é a social-democracia que está no governo, a mesma que foi derrotada nas eleições. A questão climática também não tem nenhuma relação com a popularidade, os verdes na Alemanha são os maiores defensores da OTAN e, portanto, estão entre os mais impopulares. A proposta de industrialização, por sua vez, é muito popular na Europa.
A realidade é que esses partidos acoplados ao regime neoliberal estão todos falindo. Pode ser o partido de Macron, a tradicional social-democracia da Alemanha, o Partido Democrático da Itália, ou os partidos da direita tradicional. A extrema direita cresce contra esses partidos, contra a OTAN, contra o neoliberalismo tradicional, mesmo que sem o enfrentar na prática.
Isso é importante, pois, no Brasil, essa tese é a mesma que está afundando o governo Lula. A “articulação dos setores sociais-democratas com a esquerda socialista, e, até com setores liberais” é a mesma que está incapacitando a atuação do governo. Lula fica paralisado por meio desses “aliados” que estão levando adiante a política de destruição neoliberal do imperialismo. Bolsonaro não é muito diferente, mas nos argumentos se coloca contra esse setor.
A sugestão de Cantalice, no fim, é: é preciso juntar todos os setores que estão perdendo para se ultrapassar a extrema direita. Não é assim que a luta política funciona, ela é justamente política. Ou seja, um partido de esquerda deve adotar uma política combativa para o atual momento de polarização. Não adianta se juntar a Macron, que é odiado pelos trabalhadores da França, é preciso ter uma política popular para os trabalhadores, uma política, em grande parte, contra Macron.
O mesmo vale em relação à Alemanha, ao governo Biden, ao governo dos trabalhistas que deve assumir na Inglaterra. No Brasil, Lula não é dessa ala, ele, portanto, pode se livrar dos aliados falidos. Caso contrário, seu governo terá o mesmo destina que os dos Alckmins e Tebets da Europa, ser esmagado pelo avanço da extrema direita.