Por quê estou vendo anúncios no DCO?

Valéria Guerra

Historiadora, artista (atriz) sob DRT 046699-RJ. Jornalismo UMESP-SP, término neste ano corrente. Bióloga e professora da Rede Estadual do Rio de Janeiro. Colaboradora textual do Site Brasil 247 há 4 anos. Escritora com livros publicados e textos para inúmeras Antologias, inclusive concursos de textos teatrais. Mestrando em psicologia da Educação. Escreveu o livro “Eu preciso de um Hulk” que se transformou em peça homônima

Coluna

Azul e verde

Colocavam toco de cigarro nas mãos deles até fazer bolha, beliscavam o corpo deles com pontas de faca

“Em 69, eu fui presa na sala de aula. Eu estava fazendo uma prova de… não me lembro do nome da matéria, mas o professor chamado Espina. Eu estava fazendo, estava lá no meio da turma, de repente eu vi dois homens na sala, chamaram o professor e tal…terminei a prova e fiquei enrolando, enrolando… um colega saiu, chamado Milton. Milton saiu e me mostrou também para os homens, para os dois homens. “Estou presa!”. Chega uma hora não tinha mais ninguém, eu tinha que sair. Conversei com o professor: “Professor, eu vou ser presa, por favor, conte para alguém”. “Mas eu nem sei se você é minha aluna! Eu nem sei se você é minha aluna”. Aí, os homens lá, eu saí…algemada na hora.”

O fragmento acima parece até um texto ficcional de teatro, mas não é… é um depoimento dos mais suaves sobre as prisões que aconteciam a torto e a direto a partir da DITADURA DE 1964, que colocou o nosso sofrido povo brasileiro debaixo da truculência e do chicote da Junta Militar que passou a governar o país, com as ordens do status quo vigente.

“Colocavam toco de cigarro nas mãos deles até fazer bolha, beliscavam o corpo deles com pontas de faca, eles ficaram todos feridos. Os rostos ficaram só hematomas. Quebraram o nariz do Ribeiro com soco, arrastaram pelos pés e penduraram em uma árvore de cabeça para baixo, o sangue pelo nariz escorrendo. Se eu não falasse o que eles queriam ouvir, eles iriam matar o Ribeiro enforcado. Aquilo me deu um desespero tão grande, mas não implorei nem chorei, deu vontade de me matar, mas como? Parti para a ignorância, dei uma gargalhada e o policial gritou: ‘essa puta safada prefere ver o marido morto a falar’. E eu disse: ‘eu não sei e se soubesse também não falaria’, e dei um tapa na cara dele com toda força que eu tinha, ele cambaleou e depois me deu um telefone, fiquei com esse ouvido inutilizado.

Eu desmaiei, quando acordei estava molhada de pinga e vomitando. Lavaram o rosto do Ribeiro com pinga, isso andando a noite toda, o dia quase todo sem comer e sem beber. Já era mais de meio-dia quando chegamos em Formoso na pensão da velha Afonsa, onde foi transformada em cadeia e já estava preso o Nelson Marinho, Onezimo Montezuma e Aniceto Policarpo, esses eram todos companheiros da associação e do partido.”

O exposto acima parece bem dramático, não é meu nobre leitor?

Não é fácil não. Comemorar sessenta anos do Golpe de 1964: de jeito nenhum. Nós precisamos, sim, é contar a História, e contar com a melhor memorialística. A moça que foi morta em São Paulo, com tiros na cabeça, mãe de seis filhos, foi o subproduto de uma não evolução sociológica nacional, efeito do mau funcionamento do País, que não preserva nenhum direito humano, seja de primeira, segunda, terceira, ou milésima geração, cá entre nós o país herdou uma estrutura apodrecida, com um estado policialesco despreparado, mas pudera, quiseram até dar outro golpe, ou não? De qualquer maneira, caso a estrutura educacional não mude, e nós intelectuais, escritores, jornalistas, historiadores continuemos em nossas bolhas, viajando pelas ondas da web, na carruagem de ouro on-line, não teremos chance de nos abrigarmos de um temporal antidemocrático, que no futuro poderá desabar sobre as nossas cabeças…

Bem, vamos continuar mergulhados nos relatos de seres humanos que estavam lá, na hora, no lugar, e no momento histórico, como contou uma aluna da USP:

“Mas eu não fui, eu fui para a cadeira do dragão, em que os caras jogaram água e me deram um choque na vagina, no seio, o pior foi na orelha, porque a impressão que dá é que jogaram o cérebro da gente no liquidificador, sabe?”

“Uma mulher de 31 anos, mãe de seis filhos, morreu depois de ser atingida por um tiro na cabeça em Santos, no litoral paulista, na última quarta-feira, 27. A Secretaria de Segurança Pública afirma que a morte ocorreu após confronto entre policiais militares e criminosos. Familiares e amigos contestam a versão oficial e dizem que ela foi vítima de um disparo quando três motos da PM patrulhavam a região.

A cabeleireira Edneia Fernandes Silva foi baleada na Praça José Lamacchia, na região conhecida como Mangue Seco, na quarta-feira. Ela foi levada para a UPA Zona Noroeste e, depois, transferida para a Santa Casa de Santos. Parentes e conhecidos se mobilizaram nas redes sociais pedindo… “

Caro leitor, poderíamos ficar aqui discorrendo sobre várias atrocidades urbanas, rurais, regionais, nacionais, que ocorrem em nosso país, somos filhos dos golpes, das ditaduras, e vivemos na miríade de democracias da desigualdade, pois se fosse ao contrário, a cabeleireira Edneia Fernandes Silva poderia ser uma advogada, bióloga, atriz, deputada, ou filósofa, será que ela sabia que existe um SISTEMÃO DESIGUAL E COMBINADO? Que faz nascer e morrer, e que delineia as profissões, sonhos e destino de cada ser humano? Em especial no nosso continental país, tão admoestado e belo…

Neste país onde germinou uma elite do atraso, uma mulher ser cabeleireira é habitar o mundo da subalternidade. São dois pesos e duas medidas: “há maquiadores, há cabeleireiros, há atores, há jornalistas, que podem fazer jus ao endeusamento, ou à fortuna, outros não”.

O passado e o presente se misturam formando um mosaico singular de desigualdades e injustiças sociais, que são camuflados por regimes políticos quase monárquicos: a falta de cognição e conhecimento gerou uma sociedade enclausurada pelo abuso das “autoridades”, que através de suas leis, em sua maioria, não são conhecidas pela gama empobrecida da população, e através da eterna corrupção, em seus variados formatos, vem gerando falta de renda, e diminuição da autoestima em cada professor aposentado por invalidez que sucumbe às patologias, que atacam seu corpo e sua alma, independente de seus mestrados e doutorados.

É triste a pergunta que uma filha de cinco anos fez ao pai e a mãe torturados na cadeira do dragão no idos da GRANDE DITADURA DO MEDO de 1964: “mamãe, por que você está azul? E o papai está verde?”

Tiradentes fora esquartejado, Dilma Rousseff experimentou a agonia da tortura, há centenas de pessoas soterradas pela ousadia de uma força imperialista que não aceitou que o país colonizado pudesse se desenvolver… eu quase fui aos ares, em 1981, com o episódio da Bomba do Rio Centro, eu espero que você que sofre do mal da baixa autoestima instituída não idolatre, partidos, políticos ou dirigentes, ou qualquer outro ser humano, mas que use e abuse do autodidatismo, como alavanca de desenvolvimento e evolução humanitária.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

Gostou do artigo? Faça uma doação!

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Diferentemente de outros portais , mesmo os progressistas, você não verá anúncios de empresas aqui. Não temos financiamento ou qualquer patrocínio dos grandes capitalistas. Isso porque entre nós e eles existe uma incompatibilidade absoluta — são os nossos inimigos. 

Estamos comprometidos incondicionalmente com a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo pobre e oprimido. Somos um jornal classista, aberto e gratuito, e queremos continuar assim. Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.

Quero saber mais antes de contribuir

 

Apoie um jornal vermelho, revolucionário e independente

Em tempos em que a burguesia tenta apagar as linhas que separam a direita da esquerda, os golpistas dos lutadores contra o golpe; em tempos em que a burguesia tenta substituir o vermelho pelo verde e amarelo nas ruas e infiltrar verdadeiros inimigos do povo dentro do movimento popular, o Diário Causa Operária se coloca na linha de frente do enfrentamento contra tudo isso. 

Se já houve um momento para contribuir com o DCO, este momento é agora. ; Qualquer contribuição, grande ou pequena, faz tremenda diferença. Apoie o DCO com doações a partir de R$ 20,00 . Obrigado.