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História do Brasil

A quem serve desmoralizar a Semana de Arte Moderna de 22?

Há uma tendência a reduzir o acontecimento a uma mera ação inconsequente e diletante

Por Henrique Áreas, do Grupo por uma Arte Revolucionária e Independente (GARI)

No último dia 4 de fevereiro, uma coluna no sítio A terra é Redonda, publicada também no Brasil 247 no dia 5, chamou a atenção sobre algumas concepções acerca da Semana de Arte Moderna de 1922.

Na coluna, chamada Rupturas e desdobramentos da Semana de Arte Moderna, Julian Rodrigues faz um breve comentário sobre o livro Rupturas e desdobramentos – reverberações críticas da Semana de Arte Moderna, escrito por Maria Lúcia Outeiro Fernandes.

O objetivo aqui não é uma crítica ao livro, mas fazer algumas considerações gerais sobre as concepções apresentadas pelo colunista que, presumimos, são próximas ao que defende a autora do livro. Tais concepções sobre a Semana e o Modernismo brasileiro têm aparecido com frequência em alguns meios universitários, que tentam diminuir a importância do movimento com interpretações equivocadas.

Logo no início da coluna, Julian Rodrigues ironiza, afirmando: “imagina ter que sair de uma gostosa rede para aprender a tocar um tal de alaúde (já viram um?). E sair escrevendo manifestos tão inteligentes quanto pretensiosos – com a quase absoluta certeza de que, a partir de então, nada mais haveria de ser como antes. Tempos velozes, futuristas“.

Esse é o primeiro parágrafo da coluna. Não há nada propriamente errado ali, o que chama a atenção é a maneira desleixada com a qual o autor trata o assunto. Passa a impressão de que os artistas em torno daquele movimento eram uns diletantes que, de repente, como quem levanta de uma rede, decide, do nada, escrever “manifestos pretensiosos”. Por que seriam pretensiosos? E se forem, qual seria exatamente o problema? Nada disso é explicado, a coluna deixa ao leitor, que não conhece a história do movimento, apenas uma má impressão.

Essa má impressão não é ocasional. Circulam por aí teses absurdas sobre a Semana de 22 que querem demonstrar que os artistas envolvidos naquele movimento eram uma espécie de “porras-loucas” irresponsáveis, inconsequentes, sem conteúdo, playboys arruaceiros, farristas etc.

E quais os problemas desses adjetivos todos? 1) Não condizem com a realidade; 2) não são explicados, ou seja, se fossem verdadeiros, quais as implicações concretas para aquele movimento; 3) eles servem para depreciar o movimento.

Já no segundo parágrafo, o colunista mantém o mesmo padrão argumentativo, muitos adjetivos, nenhuma explicação: “pensem na ousadia iconoclasta que provocou um bafão de dimensões épicas – em pleno Theatro Municipal de São Paulo. Sim, o ‘h’ permanece lá até hoje (quem duvidar é só ir ao site oficial). O espetacular prédio (que mimetiza teatros parisienses) tornar-se-ia motivo de orgulho para os caipiras aristocratas/cafeicultores – futuros industriais de uma cidade que se expandia rapidamente“.

Digamos que um “bafão” seja uma descrição um tanto quanto estranha para um acontecimento histórico. Cada um descreve os fatos como quiser, mas a escolha da palavra revela a ideia por trás de quem conta. O autor nos dá a impressão que o evento foi uma mera extravagância desses playboys farristas. Novamente, o que fica ao leitor é a má impressão. Se não se conhece o que foi o movimento, sua importância, os artistas e as obras que produziu, ficamos com a impressão de se tratar de algo menor, como se uma socialite tivesse tomado a decisão de dar uma festa no Municipal e chamado os jornais para divulgar.

O problema é que justamente a Semana de 22, assim como o movimento Modernista brasileiro em seu conjunto, está muito longe de ser uma confraternização de mauricinhos e patricinhas da época. Não só muito longe, como é o exato oposto disso.

A Semana de 22 foi o marco de uma revolução cultural sem precedentes na história do Brasil. Essa revolução era produto de outra revolução que se desenvolvia no Brasil na época, desde antes de 1922 e que culminou na Revolução de 30. Dá para resumir um fato dessa relevância como um “bafão de caipiras aristocratas/cafeicultores”? É como descrever a fundação do PCB, que não por coincidência ocorreu em 1922, como uma reunião de revoltadinhos.

Por falar em ser pretensioso, é muita pretensão do colunista achar possível caracterizar a Semana de 22 e o Modernismo assim.

Segundo o colunista, esses temas estão no livro de Maria Lúcia Fernandes. Ainda segundo ele, “Fernandes sustenta que a Semana não foi imprescindível para a constituição do Modernismo. Em ótima e sarcástica tirada, chega a classificar as apresentações no Municipal como um ‘happening dadaísta’ (os mais jovens chamariam de lacração)“.

Não, companheiro, os happenings dadaístas não eram “lacração”, se é que dá para levar a sério o uso desse termo. Aqui, o desleixo do colunista, e imaginamos que a autora do livro pensa o mesmo, é com o dadaísmo. Os happenings realizados por aquele movimento nas primeiras décadas do século XX não eram ações sem conteúdo, mas um protesto contra a sociedade burguesa da época, tendo como principal alvo a própria Primeira Guerra Mundial. Sua ação era subversiva, estética e politicamente.

Para o colunista, a comparação seria uma forma de desmoralizar e rebaixar a Semana de 22. Não é! Assim como as personagens da Semana de 22, os dadaístas não eram inconsequentes. Eram rebeldes, revolucionários, subversivos. A comparação com a Semana de 22 é legítima, certamente o dadaísmo influenciou os modernistas brasileiros. No entanto, não é correto reduzir a Semana a um happening.

Essas considerações não são exclusivas da coluna e do livro em questão. São várias as teses que procuram rebaixar o movimento modernista. Por que isso acontece?

Os motivos são bem claros. Aqui, vemos uma crítica que parece – só parece – de esquerda. Existe uma tendência de desmoralizar as conquistas nacionais, os personagens, os fatos, as obras importantes da história do Brasil. Tal tendência é impulsionada por uma necessidade da burguesia, em particular da burguesia pró-imperialista, de esconder os traços revolucionários do modernismo e, ao mesmo tempo, o caráter nacional do movimento. E do ponto de vista cultural, o modernismo efetivamente fez uma revolução no País, colocando as artes nacionais entre as mais avançadas da época. Não dá para reduzir isso a “bafões” e “lacrações”.

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