Nas últimas colunas sobre língua portuguesa, foram definidos dois conceitos: semântica e morfologia. A semântica diz respeito ao significado; recapitulando, sabe-se existir o mundo, isso é fácil de perceber, contudo, a língua não o nomeia simplesmente, pois, a seu modo, ela o interpreta. Dito de outro modo, as palavras não fazem simplesmente referências às coisas; as palavras são conceitos com os quais se busca explicar o mundo. Tratar as palavras desse ponto de vista é, justamente, estudar semântica; diferentemente, quando é analisada a forma gramatical das palavras, fazemos morfologia.
A palavra “meninos”, por exemplo, pode ser segmentada em três componentes: (1) o “-o” significa gênero masculino, opondo-se ao “-a”, isto é, ao gênero feminino “meninas”; (2) o “-s” significa número plural, opondo-se à sua ausência, isto é, ao singular “menino_”; (3) o sentido fundamental da palavra está no segmento “menin-”, cujo significado é criança ou adolescente. Este último segmento é chamado radical da palavra, enquanto o “-o” ou o “-a” e o “-s” ou a sua ausência são chamadas desinências.
Dessa maneira, no radical é fixado o sentido básico da palavra e, nas desinências, a forma gramatical; nessa concepção morfológica, todo substantivo, em língua portuguesa, é formado por radical, desinência de gênero e desinência de número. Os substantivos, portanto, em sua semântica apontam para a interpretação das coisas do mundo e, em língua portuguesa, possuem morfologia com radical, gênero e número.
Tratando do gênero, em português essa categoria gramatical se realiza em dois gêneros, quer dizer, o masculino e o feminino. Antes de tudo, não se deve confundir gênero com sexo, pois o sexo, embora muitas vezes coincida com o gênero, não está diretamente relacionado a ele. Quando o substantivo designa seres animados e sexuados, há coincidência; em menino/menina, garoto/garota, gato/gata, rato/rata etc., porque se trata de seres animados e com sexo, o sexo masculino coincide com o gênero masculino e o sexo feminino, com o gênero feminino. Contudo, em palavras tais quais “livro”, “mesa”, “escola”, há gênero, mas não há sexo; essas palavras designam seres inanimados, portanto, sem sexo. Em algumas línguas, por exemplo o latim, existe o gênero neutro para substantivos assim; porque no português as palavras são do gênero masculino ou do gênero feminino, as palavras neutras realizam-se, necessariamente, em um dos dois gêneros anteriores.
Além disso, o gênero não é determinado pela terminação da palavra no singular; a palavra “mapa” termina em “-a” e é do gênero masculino (o mapa), semelhantemente, a palavra “libido” termina em “-o” e é do gênero feminino (a libido), sendo por meio do artigo que, em português, determina-se o gênero dos substantivos.
Há em português outro modo de ocorrência do gênero além dos morfemas “-o” e “-a”; nas palavras boi/vaca, bode/cabra, homem/mulher etc., a diferença de gênero é marcada no radical.
Na próxima coluna sobre língua portuguesa, antes de cuidar da desinência de número, há alguns itens de vocabulário, referentes ao gênero gramatical, que precisam ser observados.
(as ilustrações desta coluna são poemas visuais de Fernando Aguiar)