Tudo foi feito com muita tranquilidade e isso foi um golpe político contra o governo. Está sendo feito um controle de danos.
Está em marcha um movimento muito mais abrangente.
O artigo de Valério Arcary no Brasil247, intitulado ‘Nota sobre a aventura golpista’ começa com uma interessante citação da sabedoria popular portuguesa: “A cem fustiga quem a um castiga. O castigo faz, ao doido, ter juízo”. É interessante também que da citação não seja tirada a devida conclusão, pois, seguindo o que vem sendo dito na imprensa de todos os tamanhos, é que deve haver punição exemplar. Ora, se um bolsonarista será castigado, cem esquerdistas serão fustigados. Essa é uma certeza.
O temos visto no Brasil é direitização do ambiente político. Para tudo se pede prisão ou aumento de penas. Nisso, o identitarismo tem uma grande contribuição. Quem sempre sofre com o aumento de punição, castigo, são os pobres e os militantes de partidos de esquerda e de movimentos populares. Porém, não se vê ninguém adquirindo juízo, o que seria ótimo.
Fracasso?
Segundo Arcary, “Fracassaram. O “assalto aos palácios” bolsonarista foi derrotado. Agora é hora de avançar na investigação, prisão e condenação dos responsáveis, sem tropeços, mas, sobretudo, sem hesitações sobre o destino de Jair Bolsonaro. O principal responsável da incitação do golpismo, há anos, impunemente, é Jair Bolsonaro”. Será mesmo que fracassaram, ou estamos diante de um primeiro movimento. Os militares adoram as ‘aproximações sucessivas’, foi assim com o governo Dilma. A coisa não foi de uma hora para a outra, tivemos o Mensalão, o ‘Não Vai Ter Copa’ etc., até que se chegou ao golpe.
Não podemos descartar, e é melhor acreditar, que existe um movimento dentro das Forças Armadas, especialmente do Exército, que quer desestabilizar o governo Lula e, nesse sentido, podemos dizer que houve muito mais sucesso do que fracasso. O fracasso virá se o governo mobilizar o PT, a CUT, os sindicatos, os movimentos sociais e formar uma grande base da classe trabalhadora para se opor à direita. Não se trata de uma tarefa simples, mas é completamente necessária.
É preciso olhar para trás, ver o que foi feito contra Dilma Rousseff e evitar os erros do passado. Quanto mais o tempo passar, mais difícil será debelar o golpe, pois outras aproximações virão. Não podemos demorar, pois poderá ser tarde demais.
Prisão de Bolsonaro
Parte da esquerda tem insistido na tese da prisão de Bolsonaro que age “impunemente”. Só falta dizer quem fará tal prisão. Seguramente, há aqueles que acreditam que o Estado burguês e suas instituições estão aí para ‘fazer justiça’. Cada um acredita naquilo que quiser.
Além da crença nas instituições, a insistência nessa tese da prisão evidencia que os setores pequeno-burgueses estão mais preocupados em cobrar o STF do que mobilizar as massas populares. O que revela o quão identificada esses setores da esquerda com a burguesia.
Valério Arcary aplaude “a decisão de Alexandre de Moraes de afastar Ibaneis Rocha do governo do Distrito Federal”. Parte da esquerda passa solenemente por cima do fato de esse ministro do STF ser um tucano e ter votado pela prisão de Lula.
Os mandantes
Arcary acerta quando diz que “Não foi uma manifestação de protesto. Não foi o descontrole de uma “explosão” de radicalização espontânea. A aparente “acefalia” da subversão não deve esconder a responsabilidade de quem preparou, organizou e dirigiu ”. Mas erra ao afirmar que havia uma “tentativa de tomada de poder”, pois as cabeças por trás desse ato estão pensando a coisa em um prazo mais dilatado.
É muito provável que os manifestantes, que são da base bolsonaristas, tivessem como objetivo estimular “a saída às ruas de tropas militares dispostas a oferecer sustentação ao golpe de Estado”. No entanto, não basta querer, é preciso ter condições para tal.
Os distúrbios em Brasília foram mesmo “Uma desconcertante operação articulada, planejada e, minuciosamente, orquestrada que não pode ser subestimada”. E isso vem acontecendo desde a eleição de Lula. Os ônibus incendiados na Capital Federal foram muito bem executados, o que nos leva a crer que foi coisa de gente treinada.
Houve mais conluio do que omissão, e muita simpatia dos policiais pelos manifestantes. A “evidente simpatia policial e militar pelo movimento bolsonarista” é muito mais que uma simpatia, houve a participação efetiva de elementos da Forças Armadas, ainda que alguns estejam na reserva.
As instituições burguesas
O PT ganhou as eleições, não significa que por isso tenha a máquina do Estado em suas mãos. É uma ilusão acreditar que “as prisões preventivas são inescapáveis para investigar os organizadores. Há mandantes ocultos ainda por ser revelados. Mas, ainda que progressivas, estas decisões são insuficientes. Permanece sem solução a “questão militar”. A própria aceitação de que o aparato repressivo do Estado está coalhado de bolsonaristas, põe por terra a intenção de se investigar os organizadores”, ou descobrir quem sejam os mandantes ocultos.
Mesmo que se descubra, quem vai colocar militares na cadeia? Eventualmente, uma ou outra figura venha a receber ‘punição exemplar’. Mas não passará de uma cortina de fumaça para os desavisados se sentirem aliviados com a ideia de o Super Xandão estará colocando ‘terrorista nas cadeia.
Para terminar, Arcary faz alusão ao ‘sem anistia’, uma palavra de ordem que vem sendo repetida em toda imprensa. No entanto, a esquerda não está forte o suficiente para punir os militares, muito menos tem poder para rever a Lei de Anistia.
Se existe algum desejo real de se punir os militares, a esquerda precisa jogar todo seu peso para organizar os Comitês de Luta e assim enfrentar nossos inimigos de classe e seus lacaios de farda.
