O coletivo “Judias e Judeus Sionistas de Esquerda” (JJSE) publicou uma nota fazendo coro com o cancelamento do músico Roger Waters. O JJSE denuncia um suposto “antissemitismo” do músico e seu “comportamento racista”. Segundo os signatários da nota, “Waters banaliza o Holocausto” ao estabelecer uma relação entre o Estado de Israel e a Alemanha Nazista. E afirmam que “não há paralelo” entre os dois regimes.
“Roger Waters é o exemplo vergonhoso do antissemita de Esquerda, que se utiliza do véu do Antissionismo para destilar seu Antissemitismo. Nisso, nunca deixaremos de repudiá-lo e combatê-lo”, diz a nota.
No entanto, o JJSE concorda que o músico “não é nazista”, ao contrário do que é apontado por aqueles que querem o cancelamento de seu espetáculo. “Sua vestimenta que emula a de soldados da SS é parte de uma encenação em seu show, que é justamente crítica ao nazismo”, destaca. Para o coletivo, o problema seria “distorcer a realidade e igualar nazismo ao que não é nazismo”, isto é, ao Estado de Israel.
A crítica dos sionistas de esquerda, por mais que tenha diferenças em relação ao eixo central da campanha contra Roger Waters, faz parte do mesmo esforço. Ao assumirem que Waters “não é nazista”, mas “demonstra ser antissemita”, na realidade, apenas ingressam na ala moderada da cruzada pelo cancelamento do artista. Dessa forma, os sionistas de “esquerda” nada diferem dos sionistas de direita e do restante da burguesia imperialista na sanha contra a liberdade de expressão do músico.
Roger Waters está sendo perseguido pelo explícito apoio que dá à luta dos palestinos contra o Estado de Israel, motivo pelo qual ergueu a bandeira palestina em diversos espetáculos. Para a burguesia não-sionista, Waters também é um problema quando, em diversas oportunidades, ataca os interesses internacionais do imperialismo, quando, por exemplo, afirma que Taiwan pertence à China e culpa a OTAN e os Estados Unidos pela guerra na Ucrânia.
Pela popularidade que tem, sendo um dos músicos mais famosos do planeta, Waters precisa ser censurado e linchado por uma campanha difamatória. Ambas as acusações, de que ele seria nazista e antissemita, são falsas e fazem parte do mesmo processo. A tentativa do JJSE de atenuar as críticas não fazem diferença.
É completamente inútil afirmarem que “somos completamente contra a censura e não defendemos o cancelamento dos shows de Waters, mas, sim, ações punitivas específicas a qualquer ato antissemita que este carregue. Combatemos nele o antissemitismo!” Primeiro, porque a declaração é contraditória. Não se pode ser “completamente contra a censura” e apoiar “ações punitivas específicas a qualquer ato antissemita”. Ser contra a censura é defender, inclusive, a liberdade de expressão para antissemitas. Segundo, porque participar do linchamento de Waters, acusando-o falsamente de ser antissemita, dá força à campanha pela censura dos espetáculos.
Os sionistas de esquerda tentam esconder, buscando se apresentarem como democráticos, mas revelam que não são nada além de censores a serviço do imperialismo e do lobby sionista mundial.
“Quando Waters combate o Fascismo e o Nazismo contemporâneos, e toda forma de opressão e disrupção dos Direitos Humanos, estamos ao seu lado. Ele (e qualquer um) pode livremente criticar as opressões do governo de Israel e defender a criação de um Estado Palestino que conviva ao lado de Israel (ambos soberanamente). Esta é exatamente a pauta central de nosso coletivo. Mas, se ultrapassar os limites da crítica justa e adentrar a esfera do racismo, merece repúdio”, diz a nota.
Resumindo: “somos completamente contra a censura” desde que não ultrapasse “os limites da crítica justa”. Ou seja: defendemos a censura em determinadas ocasiões…
Mas a lógica não é o forte dos sionistas de esquerda. Afinal, se dizem de esquerda ao mesmo tempo em que defendem um Estado que se estabeleceu artificialmente numa região habitada há séculos por árabes, que foram expulsos, violentados e assassinados pelas forças de Israel. Defendem um Estado que foi criado e impulsionado pelo imperialismo para controlar os movimentos nacionalistas árabes (antiimperialistas) da região e manter o Oriente Médio sob opressão.
Nesse sentido, os paralelos feitos por Waters entre o Estado de Israel e o Terceiro Reich de Adolf Hitler são totalmente válidos. Na Palestina, assim como na Alemanha Nazista, uma parcela da população vive em guetos, na extrema pobreza e sob constante ocupação militar. Os israelenses, assim como os nazistas, promovem por meio da ditadura um processo de limpeza étnica contra essa população. E assim seguem os exemplos.
Mas, de fato, a Alemanha Nazista e o Estado de Israel não são iguais. Israel é bem pior. O nazismo alemão, mesmo financiado pela burguesia, foi um regime que surgiu da própria Alemanha. O Estado de Israel foi uma criação artificial, baseada em um suposto “direito ancestral” sobre a “terra prometida” de há mais de quatro mil anos, que locomoveu uma população europeia para oprimir os árabes.
Waters, assim, não é antissemita, é sensato. Ele apenas denuncia o total absurdo que o Estado de Israel promove há mais de meio século contra a população palestina.
Enquanto isso, novamente buscando aparecer como democráticos em meio à campanha reacionária que promovem, os sionistas de esquerda tentam se distanciar do bolsonarismo:
“Por fim, um recado aos bolsonaristas, que hoje pedem o cancelamento de Waters: Nós fazemos questão de enfatizar que mesmo neste episódio do cantor não estamos no mesmo fronte que vocês. Vocês abraçaram/abraçam o nazismo bolsonarista e não têm a menor condição de fazer a análise e a crítica que fizemos a Waters nesta presente nota”.
Quer dizer, além do apoio a Bolsonaro, a diferença entre o bolsonarismo e os integrantes do JJSE seria apenas um problema de inteligência, a incapacidade “de fazer a análise e a crítica que fizemos”. Não parece algo significante… Aliás, mais uma vez os sionistas de esquerda se contradizem. Segundo eles, o problema de Waters “é distorcer a realidade e igualar nazismo ao que não é nazismo”. Agora, falam em “nazismo bolsonarista”. Pela própria lógica do JJSE, seus integrantes sofrem do mesmo “problema” que o músico, pois o bolsonarismo não é, de fato, nazismo. Na verdade, o Estado de Israel é bem mais similar ao nazismo do que o bolsonarismo.