Ontem, estive no ato que foi chamado pela esquerda de conjunto em resposta às ações dos bolsonaristas no dia anterior, no domingo, 08 de janeiro de 2023. Eles, os direitistas, invadiram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e outros prédios públicos para protestar contra a presidência de Lula e requerer intervenção militar, dentre outras coisas.
Uma invasão estranha porque as ocupações foram desfeitas sem nenhum resultado político prático para o grupo. Em regra, uma ocupação tem reivindicações a serem atendidas para ser desfeita, mas não foi o caso. Eles entraram, com a ajuda explícita da Polícia Militar do Distrito Federal, quebraram coisas, saíram e é isso.
De qualquer maneira, fomos para as ruas defender o governo Lula, como é natural de qualquer esquerda que se preze. O que não é natural da esquerda é a reivindicação de repressão contra seus inimigos políticos. Ao longo da história, os vitimados da repressão estatal são os elementos da esquerda, não os da direita. Basta ver o caso recente de Lula e de outras lideranças do PT.
Ocorre, agora, o chamado, a palavra de ordem de “sem anistia”, que quer dizer: prendam todos os golpistas e seus financiadores, como diz Guilherme Boulos (PSOL) no carro de som no ato de segunda-feira, em São Paulo, no MASP.
Embora seja conhecida a relação de Boulos com a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, não foi somente o deputado que pediu a prisão dos bolsonaristas. Esse chamado foi uma unanimidade dos que puderam falar no carro de som do ato desta segunda-feira. Parecia um ato de senhoras da classe média paulistana, ou das madames da Zona Sul carioca com medo de arrastões. Todo mundo precisa ser preso, bradavam uns; investigação e punição dos financiadores, falavam outros. O negócio é mandar prender, cadeia para os golpistas, enfim, coisa muito reacionária vinda da esquerda. Algum esperto de alguma ONG mandou fazer um cartaz de mão “sem anistia para os que atacam a democracia”, dizia os sempre bem feitos cartazes de ONG que aparecem na Paulista. Outros menos espertos escreveram isso em casa, na cartolina, e levaram para o ato.
Ora, não precisa ter tido alguma experiência com o sistema prisional e judiciário penal brasileiro para se concluir que isso é a coisa mais macabra que existe na sociedade. É uma máquina de tortura de gente, e de gente pobre, obviamente, como sempre foi.
Perto dos um milhão de detentos, o sistema prisional brasileiro deveria simplesmente acabar. Ali tem gente que não cometeu crime; gente que ainda aguarda recurso; gente presa provisoriamente pois não sabe ainda se é culpado ou inocente; gente que já cumpriu a pena. Gente que está em uma cela com outras 19 pessoas, quando só deveriam ter cinco pessoas. Gente doente, gente comendo lixo, gente sendo espancada, torturada, todos os dias. É um crime humanitário diário de escala mundial.
Pedir mais cadeia e mais penas para um sistema desse tipo é algo totalmente desumano, mesmo que seja contra os golpistas. Aqui deveria valer o debate político, que sempre foi a arma principal da esquerda. A discussão para evolução da consciência, para a própria evolução da luta política entre as classes sociais. Mas esse método foi abandonado.
A “reivindicação” repressiva é uma proposta da direita, sempre foi. Inclusive é ela quem sustenta boa parte da ideologia direitista dos bolsonaristas. Mas, agora, em tom de revanche covarde, parte da esquerda quer cadeia para todo mundo. Como se a esquerda tivesse a chave da cadeia, coisa que nunca teve na história.
Quem prende é a polícia, e a polícia é da burguesia. Isso era o ABC da esquerda, agora não é mais.