Legalizar já!

Qual o verdadeiro problema por trás da guerra às drogas?

Setores da esquerda denunciam a política repressiva sem apresentar uma solução real para o problema tanto do consumo quanto da violência contra os traficantes e usuários

A chamada guerra às drogas, isto é, a política repressiva tanto contra o tráfico quanto contra o usuário é uma discussão antiga na esquerda internacional. Há uma defesa comum da legalização de drogas mais leves como a maconha, alguns setores da esquerda radical também apoiam a criminalização, inspirados supostamente na Revolução Chinesa. O mais recente comentário na esquerda brasileira foi do Partido Comunista Brasileiro com o artigo “Guerra às drogas, imperialismo e saúde pública”, onde não apresenta nenhuma política clara em oposição à política da burguesia de guerra aos trabalhadores e aos países atrasados.

O artigo começa com uma introdução histórica do termo “guerra às drogas” remetendo ao governo de Richard Nixon nos EUA. Ele então afirma que o consumo de substâncias psicoativas nem sempre foi regulado e que nem sempre essa regulação foi uma questão médica. Até aqui não há nenhum grande argumento, apenas afirmações corriqueiras. O artigo então cita a conferência de Haia de 1912 que seria o início do processo de internacionalização de criminalização do uso recreativo das drogas. A Conferência definiu que “o uso não medicinal [de drogas] é patológico em si”.

Então o texto segue: “Ganhava força a imagem de que substâncias como o ópio e a morfina desencadeavam problemas de saúde pública e que necessitavam de controle rigoroso”. Aqui já há um anacronismo, a própria questão do ópio é um caso clássico de saúde pública, não em Haia mas na China. Quando o país tentou tomar medidas regulatórias sobre ópio, que era produzido na Índia inglesa, os britânicos iniciaram uma guerra contra os chineses, a famosa Guerra do Ópio – naquela época, como era preciso abrir novos portos comerciais na Ásia, o imperialismo defendia, por conveniência, a legalização das drogas. A política para drogas nos EUA também precede o século XX, o estado do Maine proibiu o álcool ainda em 1851.

O texto destaca a discriminação racial em relação às drogas: “o corte xenófobo e racista, relacionava, por exemplo, uso de maconha nos EUA com imigrantes hispânicos, ópio com chineses, cocaína com negros e o álcool com irlandeses e italianos. No Brasil, o uso de maconha já era associado aos negros praticantes de capoeira desde o século XIX”. Que é uma realidade mas não se pode esconder também o caráter de classe, a repressão do Estado se volta sempre contra as classes oprimidas, no caso do século XX na classe operária, sejam imigrantes e seus descendentes, negros ou brancos.

O texto então deixa escapar a sua posição de apoio moderado ao uso de drogas: “muito mais do que uma autêntica preocupação com a regulação e criação de modos saudáveis para usufruir tais substâncias, as operações visavam principalmente agrupamentos sociais considerados “indesejáveis” no jogo geopolítico que se desenhava.” Aqui fica claro que o PCB foge da política marxista sobre as drogas, adotando uma posição idealista, burguesa e contrarrevolucionária. Existe uma linha ideológica dentro da esquerda que não considera as drogas como um problema de saúde gerado pelas dificuldades da vida na sociedade de classe, mas de fato uma recreação. O texto nesse momento aponta para essa posição, mas sem deixar muito claro.

Os marxistas, apesar de combaterem a repressão contra usuários de drogas, compreendem que elas são um mal para a sociedade, causam danos aos indivíduos e ao coletivo. O consumo de drogas é algo absolutamente degradante para o cidadão, o retira da realidade, o aliena, portanto afasta os trabalhadores de sua luta. A esquerda pequeno burguesa brasileira no entanto em grande parte abandonou essa posição, chega a defender o uso de drogas como algo até ideal.

O uso de drogas na esquerda aliás foi algo estimulado pelo próprio imperialismo, que despejou o craque em comunidades negras para desarticular o movimento negro – como ocorreu com o desmantelamento dos Panteras Negras pela CIA e pelo FBI. A sua presença na juventude é também um dos grandes entraves para a organização deste que é um dos setores mais revolucionários da sociedade. Um texto sobre drogas e imperialismo deveria deixar essa posição bem clara. É preciso fazer uma luta política contra o uso das drogas, que não passa pela repressão do Estado burguês, que é na verdade uma das causas do uso de drogas por sustentar a terrível sociedade burguesa que oprime bilhões.

Qual é o verdadeiro problema? É que o imperialismo e a burguesia, ao mesmo tempo que permitem e incentivam o tráfico de drogas (internamente e externamente, uma vez que é um dos negócios mais lucrativos do mundo e a própria CIA e os grandes monopólios ligados ao Estado Profundo dos EUA estão ligados a isso), utilizam isso como pretexto para reprimir a população pobre, porque isso faz com que a indústria bélica lucre muito com a repressão e também mantém os trabalhadores sob o tacão do Estado, esmagando sua organização independente. Nada disso é levado em consideração pelo PCB.

O mais importante, no entanto, é que o PCB não oferece uma saída, que passa necessariamente pela legalização total de todas as drogas. Isso não é uma reivindicação levantada pela esquerda, embora seja uma reivindicação democrática e tradicional, porque pega mal em seu meio, pois é uma esquerda pequeno-burguesa com o rabo preso com o Estado burguês. Longe de ser uma apologia liberaloide ao consumo de drogas, que nós não concordamos, isso é a única forma de iniciar o rompimento do Estado com a repressão ao povo, pois com a legalização das drogas não haveria mais tráfico de drogas – além de o Estado perder o grande motivo para a repressão, ele seria obrigado a tratar o caso como caso de saúde pública, seria algo mais humano, mais racional, mais democrático. O Estado então seria também obrigado a cuidar da saúde publica como um todo, da educação e seria obrigado a garantir a mínima qualidade de vida da juventude, com emprego e ensino.

A perda do impulso repressivo enfraqueceria sobremaneira o Estado, que é a grande luta dos revolucionários.

Essa política de legalização de todas as drogas, contudo, é duramente atacada pela burguesia e por isso não é defendida por quase nenhuma organização de esquerda. Apenas a legalização da maconha é defendida com facilidade até porque ela também é pauta de setores da direita como FHC e já aconteceu em diversos estados nos EUA. A maconha também é usada para desmobilizar a juventude nos dias de hoje. Há uma grande propaganda de que não há vícios, que ela não tem grandes efeitos negativos e de que ela seria até mesmo menos negativa que o álcool. Mas nem mesmo a legalização da maconha é defendida no artigo do PCB.

Ao fim o texto é apenas uma vaga propaganda esquerdista que ataca tangencialmente o imperialismo sem propor nada. Atacar a guerra às drogas da forma que é colocada é o mesmo que atacar a invasão da polícia militar nas favelas sem nem mesmo colocar que a polícia tem que sair das favelas, isso sem falar na solução real que é o fim da polícia militar. Como sempre o PCB para não revelar a sua política direitista não revela política nenhuma, o que o torna um partido inócuo e portanto uma ferramenta para a direita golpista.

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