O julgamento de Bolsonaro está deixando claro que um amplo setor da esquerda, incluindo aqueles grupos e figuras que se consideram comunistas revolucionários, prefere ficar ao lado da repressão do Estado burguês do que da luta pelas liberdades democráticas do povo e, consequentemente, pelos direitos dos trabalhadores no geral.
Esses setores acreditam que vão resolver os problemas da luta de classes pela via do Judiciário, algo totalmente absurdo. Decerto que Bolsonaro, assim como muitos ex-presidentes, poderia ser julgado por crimes contra o Brasil. Não necessariamente por aquilo corriqueiramente utilizado pela esquerda contra ele, mas por coisas concretas como a privatização da Eletrobrás, por exemplo. Porém, não é isso que está acontecendo: o julgamento de Bolsonaro é visivelmente um julgamento político.
As ações contra ele se dão em torno do fato de que o ex-presidente fez uma reunião com embaixadores na qual afirmou que as urnas eletrônicas brasileiras são muito vulneráveis à fraude. É totalmente anormal alguém ser cassado por isso, é uma verdadeira aberração jurídica.
Temos, portanto, uma situação que, em nome da luta contra a extrema-direita, contra o bolsonarismo, a esquerda começa a ser apologista de uma política repressiva arbitrária das instituições do Estado capitalista. Isso não é uma política de esquerda correta não é uma política socialista, não é uma política revolucionária, nada disso. É um apoio a arbitrariedades que tanto podem ser usadas contra o Bolsonaro como podem ser usadas contra a esquerda, como tem sido usado contra a esquerda o mesmo método. É preciso rejeitar esse tipo de intervenção política reacionária.
Um segundo ponto desta discussão é o seguinte: essa perseguição jurídica contra Bolsonaro dará certo? Vamos supor que nós estivéssemos diante de um cálculo político sem nenhum tipo de princípios, do tipo “precisamos eliminar Bolsonaro seja como for”. Isso será efetivo para esse objetivo? Decerto que não.
No fim, o bolsonarismo vai demonstrar a um amplo setor – e é fácil demonstrá-lo – que o que está acontecendo é uma perseguição política. Nesse sentido, essa operação para tornar Bolsonaro inelegível contribui muito mais para fortalecer o bolsonarismo diante da população do que para enfraquecê-lo. Não vai acabar com o bolsonarismo, é uma mera manobra eleitoral.
Amanhã a burguesia vai precisar de Bolsonaro e vai chamá-lo para intervir na situação política. Podem aprovar a inelegibilidade de Bolsonaro por oito anos, mas, logo em seguida, surge uma crise política e a burguesia volta atrás e derruba essa decisão.
Ou seja, trata-se de algo que só serve para manobras de bastidores. Vai fortalecer o bolsonarismo e quem vai ficar com a má fama de realizar essas arbitrariedades é o próprio Lula e a esquerda. Não é à toa que, nos jornais da direita, já se fala nisso: é o “STF a serviço do Lula”.
Portanto, do ponto de vista da luta política, de ganhar a consciência das massas, de romper a frente bolsonarista, isso não acrescente em absolutamente nada. Pelo contrário, é muito evidente que se trata de um tiro que vai sair pela culatra.