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A grama do vizinho

Peronismo sim, “lulismo” não

Ao mesmo tempo que celebra a longevidade do peronismo na Argentina, Valerio Arcary parece contar os dias para o fim do "lulismo"

Há bairros em São Paulo de difícil navegação para aqueles que não são locais. Bairros operários de crescimento orgânico, sem planejamento, com caminhos tortuosos e travessas que começam e terminam na mesma rua. A famosa “quebrada”. A sensação de andar por esses bairros é a mesma que temos ao percorrer o pensamento sinuoso de Valerio Arcary.

Na última sexta-feira (27), o dirigente psolista escreveu coluna intitulada “Peronismo e lulismo”, buscando fazer uma analogia histórica entre o movimento político originado no líder do nacionalismo burguês argentino e fundador do Partido Justicialista, Juan Peron, e o que Arcary chama de “lulismo”, em referência ao dirigente petista, Lula.

Antes mesmo de entrar no tema, o autor do texto já nos leva por um caminho inusitado. “Desconsiderando outras diferenças, como o papel da educação e da saúde pública, Sergio Massa representa um projeto gradualista de ajuste. Milei representa um projeto de choque. O desafio da esquerda argentina, que subestimou o perigo da extrema-direita, é compreender que, até novembro, não é possível lutar contra os dois ao mesmo tempo. A denúncia de Massa pela esquerda, nas próximas quatro semanas, mesmo quando muito justa, favorece Milei”, diz Arcary. Ou seja, na Argentina Arcary é pelo apoio a Sergio Massa, candidato peronista, pseudo-kirchnerista, que em 2015 impulsionou indiretamente a vitória eleitoral de Maurício Macri e que desde que assumiu o ministério da Economia de Alberto Fernández, busca acordos criminosos com o Fundo Monetário Internacional colocando a economia argentina cada vez mais nas mãos dos abutres do mercado financeiro internacional.

Arcary reconhece os defeitos do “projeto gradualista” de Massa, mas curiosamente, em situação análoga no Brasil, com uma opção mais à esquerda de Massa como “mal menor”, o dirigente psolista defendeu o voto nulo. Relembremos:

“A tarefa daqueles que defendem o programa socialista consiste em demonstrar para os trabalhadores que era e é possível ir além. Era e continua sendo possível desafiar a ordem do capital. Às vezes, infelizmente, muitas vezes, é preciso ter a firmeza de nadar contra a corrente. Para defender uma posição firme e simples: nenhuma ilusão ou confiança no governo. Voto nulo”, era sua posição diante da campanha golpista – e baixa – de Aécio Neves contra Dilma Rousseff em 2014, quando o golpe de Estado no Brasil já estava a pleno vapor (Não declares que as estrelas estão mortas só porque o céu está nublado, Revista Espaço Acadêmico, 14/10/2014). 

O Partido da Causa Operária também defendeu o voto nulo naquela ocasião, que por princípios não apoia candidaturas burguesas como a de Dilma, mas denunciou o golpe de Estado em curso no País. O Partido tem posição similar diante da atual situação argentina, mas Arcary parece ter mudado de rumo no meio do caminho.

Voltando à metáfora da cidade, nos sentimos como percorrendo uma rua familiar onde nos lembrávamos de uma virada à esquerda, mas que, na verdade, revela-se uma guinada à direita. 

Na sequência, retoma-se o tema introduzido no título. A analogia é interessante, há paralelos, mas não tantos quanto se possa parecer. Peron foi um líder militar, ligado à burguesia nacionalista argentina, que se apoiou nas massas operárias para levar adiante uma política de desenvolvimento capitalista do país. Lula também procurou e procura organizar uma política de desenvolvimento nacional, mas é um líder operário, que já conta com grande apoio popular, e que procura apoio num setor cada vez mais raro da sociedade brasileira, a burguesia com interesse nacional.

Arcary apresenta o “lulismo” como um herdeiro do varguismo, que teria padecido com a morte de Leonel Brizola, que carregava de certa forma o legado de Getúlio Vargas. Apresenta ainda o “lulismo” como um fenômeno que se torna maior que o petismo apenas durante os dois primeiros mandatos do atual presidente. Na realidade, Lula e o movimento sindical que liderou sempre foi maior que as direções burguesas e pequeno-burguesas que participaram da fundação do Partido dos Trabalhadores.

Somos apresentados a um paralelo histórico dos dois movimentos políticos. Curiosamente, Arcary apresenta em sua história do peronismo um momento neoliberal, com Menem, no final do século XX, algo que não aparece no relato sobre o “lulismo”. Ainda assim, devemos votar em Massa, mas devemos criticar ferozmente Dilma. O “lulismo” tem ainda dois momentos heroicos, na fundação do PT e na luta contra o golpe, enquanto o peronismo teria apenas um, quando assume “a direção das classes populares” na Argentina após a queda da ditadura no início dos anos 1980.

Apesar de tudo, o texto nos leva a crer que a “longa vida do peronismo” ainda se perpetuará com Massa, mas os dias do “lulismo” parecem estar contados e durarão apenas até os últimos dias daquele que dá o nome ao movimento.

Arcary elenca que Lula deve entregar crescimento econômico e atender às principais demandas populares e acrescenta que “a corrente neofascista deverá ser derrotada” e uma nova “liderança do PT deverá emergir”. Mas mesmo que todas essas condições sejam atendidas, algumas com as quais concordamos, o movimento político liderado por Lula encontra-se ameaçado pelo PSol.

“A relocalização do PSol, que assumiu liderança nos movimentos feminista e negro, indígena e LGBT, estudantil e popular, e o protagonismo do MTST projetaram Boulos, que chegou ao segundo turno em São Paulo em 2020 e, conquistando mais de um milhão de votos em 2022, se afirmou como a segunda liderança popular mais influente do país, emparelhando ou até superando Haddad, que tinha substituído Lula na eleição contra Bolsonaro em 2018. Ninguém pode prever qual será o desfecho do governo Lula”, diz o dirigente, puxando a sardinha para seu lado. Para ele, se Boulos vencer as eleições municipais de São Paulo, o “lulismo” estará ameaçado.

O posicionamento atual de Arcary sobre as eleições argentinas e seu posicionamento histórico em relação aos governos petistas nos levam a crer que o peronismo é menos direitista que o “lulismo”. Será que isso é verdade? Basta ver o próprio exemplo de Menem. O peronismo arrumou seu próprio Fernando Henrique Cardoso para destruir a economia argentina. Ainda somos levados a crer que o legado de Lula está ameaçado pelo esquerdista fabricado pelo imperialismo, Guilherme “Não vai ter copa” Boulos. 

Saindo do labirinto político das teses de Arcary, revela-se o que sempre foi seu desejo. Com sua política oportunista, tanto no PSTU como agora no PSol, o político supostamente trotskista sempre quis faturar na queda do “lulismo”, queda essa que ainda não veio, mas pela qual esperam com grande ansiedade.

O que nos leva à pergunta: se fosse argentino, será que o dirigente psolista seria tão amigável com o peronismo? Talvez visse com bons olhos o “lulismo” que descreve de forma tão decadente. 

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