Quem acompanhou as notícias na imprensa burguesa sobre os acontecimentos em Brasília neste domingo (8) ouviu até se cansar as palavras ‘terroristas’ e ‘prisão’. Curiosamente, isso não veio da extrema-direita, mas de supostos esquerdistas, como Sofia Manzano, presidenta do Partido Comunista Brasileiro (PCB), e boa parte da imprensa dita progressista.
Desde a invasão ao Capitólio, em 06 de janeiro de 2021, a esquerda tem repetido que aquele atos se tratava de tentativa de golpe e terrorismo. De lá para cá, esse discurso, que é uma armadilha, tem apenas ganhado força. Com o agravante de que a condenação daquele acontecimento nos Estados Unidos era uma defesa do governo Biden.
O que não conseguem explicar, os defensores da tese do golpe, como se poderia tomar o poder sem a participação de forças armadas. Um bando de manifestantes teria condição de tomar o poder de um Estado, teria condições de mantê-lo, teria condições de governar? Uma simples reflexão nos faz notar o quão absurdo é pensar que se tratava de uma tentativa de golpe.
Em Brasília, neste domingo, não se tratava de um golpe como propões o artigo “Organizar a luta de massas contra o golpismo” publicada no sítio do PCB, que diz que “na tarde desse domingo, (…), apoiadores de Jair Bolsonaro invadiram o Congresso Nacional e tentaram ocupar prédios de outros órgãos públicos, com o intento de promover distúrbios e ensejar um golpe de Estado”.
A presidenta do PCB tuitou em sua conta no Twitter que “É inaceitável a tentativa de golpe de Estado dos terroristas bolsonaristas hoje em Brasília bem como a participação ativa das forças de segurança. Espero ver a prisão e condenação dessa massa atrasada, dos mandantes e financiadores e das autoridades envolvidas” (grifos nossos). Pedir a punição para manifestações é atirar contra o próprio pé. O MST, por exemplo, já foi à Brasília e tentou invadir prédios, já bloqueou estradas, já acampou em tudo quanto é lugar. Manifestar-se é um direito, não pode ser um privilégio apenas da esquerda.
https://twitter.com/SofiaManzanoPCB/status/1612210807936368644
A grande imprensa tem repetido com gosto a palavra terrorismo. A Rede Globo, que fez uma grande cobertura da invasão dos prédios públicos na Capital Federal, repetiu à exaustão a palavra ‘terroristas’. A esquerda deveria parar e pensar um minuto no porquê desse tipo de atitude dessa empresa que é uma das piores inimigas da classe trabalhadora.
O clima antidemocrático e repressivo interessa à direita. Neste momento, é um bando de extremistas bolsonaristas que está sendo alvo de propaganda. Amanhã, não podemos ter dúvida, qualquer ato da esquerda vai ser tratado como terrorismo.
A grande palavra de ordem de parte da esquerda, além da prisão de manifestantes, tem sido a necessidade da “defesa da democracia”. Em nome dessa pretensa ‘defesa’ é que se tem proposto, e efetivado, todo tipo de alianças com setores golpistas que oportunamente se apresentam como opositores de Bolsonaro. E é em nome da defesa da democracia também que a esquerda tem apresentado a prisão, como remédio.
A criminalização de manifestações servirá para coibir quaisquer manifestações futuras da esquerda, é por isso que a imprensa golpista repete a palavra ‘terrorismo’ a todo instante.
Ilusão institucional
O PCB prega no artigo:
1) (…) prisão para golpistas e exoneração para servidores cúmplices na tentativa de golpe.
2. Articulação nos estados de atos de massa denunciando as agitações golpistas e exigindo a prisão dos articuladores das agitações golpistas.
3. Organização de plenárias estaduais amplas de denúncia contra as tentativas golpistas e em defesa das liberdades democráticas!
É curioso, pois em vez de organizar as massas trabalhadoras nos Comitês de Luta para assim se formar uma base de sustentação para o governo, o PCB quer uma rede denúncias. A classe trabalhadora não tem que fazer o papel da polícia.
O partido quer, ainda, organizar plenárias estaduais amplas de denúncia, o que se poderia, se fosse o caso, fazer montando um simples grupo nas redes sociais. Ora, as plenárias precisam ser utilizadas para organizar os Comitês e não se tornar um grupo de alcaguetes.
Isso que estamos vendo é, a um tempo, a incapacidade de parte da esquerda de enxergar o real papel da classe trabalhadora na luta de classes e, ao mesmo tempo, uma fé nas instituições do Estado burguês.
Quando o PCB, e outros, pedem as punições, não se pode se esquecer que tudo isso é atribuição do Estado, ficará ao encargo das instituições burguesas. A Justiça, as polícias, estão abarrotadas de bolsonaristas e não se pode esperar que ajam contra eles próprios.
Falência
O que temos visto é uma completa falência de setores da esquerda, basicamente, estão propondo uma “guerra ao terror”, que é uma política dos Estados Unidos que, a despeito de não combater a produção de drogas, serviu apenas para a mais dura repressão do imperialismo. Basta ver o estrago que fizeram na Colômbia, onde a direita avançou de tal modo que praticamente todos os dias pessoas de esquerda, ou ativistas sociais, eram assassinadas naquele país pelo próprio Estado ou por paramilitares.
A esquerda tem que defender os direitos democráticos como princípio, não importa se são nossos adversários políticos que estão se manifestando. Como a esquerda reagiria, hoje, às manifestações que ocorreram nos EUA em 2020 em decorrência do assassinato George Floyd, chamaria de terroristas? A população incendiou delegacias, automóveis, lojas etc, muito pior do que ocorreu em Brasília. Deveríamos pedir a prisão dos manifestantes?
A maneira de combater a direita, não é apresentando a cadeia, a Justiça burguesa, como remédio. É a força da esquerda, das massas trabalhadoras, sua presença nas ruas, na vida política que fará recuar a direita, não existe outro caminho.
Pedir mais repressão estatal é o exato oposto do que a esquerda deve fazer, pois isso só fortalece o Estado, que é a máquina que a burguesia utiliza para conter e oprimir a classe trabalhadora.