Ianomâmis

O canto da sereia dos “índios” identitários

Imprensa criou a falsa realidade de que a culpa de todos os problemas dos índios, que sofrem há séculos, é o garimpo

A situação de calamidade dos ianomâmis, amplamente divulgada pela imprensa burguesa como se fosse algo de agora (e ao contrário da calamidade de dezenas de milhares de outros índios no Brasil), gerou um enorme debate acerca da exploração de minério em terras indígenas. Uma das opiniões muito divulgadas é a de Davi Kopenawa, um ianomâmi ligado ao movimento identitário que aponta, assim como a Globo, que o grande problema dos índios é o garimpo. Essa tese ignora que os índios, e outras populações rurais, sofrem com a fome em diversas outras regiões do Brasil e que os ianomâmi já sofriam muito antes da chegada do garimpo em suas terras.

Todo discurso de Kopenawa é voltado para afirmar que o problema é o garimpo: “Os ianomâmis nunca morreram de fome. Estou aqui, tenho 66 anos e quando era pequeno, ninguém morria de fome. Agora o garimpo está matando o meu povo e também os parentes Munduruku e Caiapó. Quando os indígenas ficam doentes, eles não conseguem trabalhar [na roça] ou caçar”. Essa afirmação é uma mentira descarada pois relatórios oficiais feitos durante a própria ditadura militar indicavam a situação de fome que passavam os ianomâmis.

O relatório do procurador Jader de Figueiredo Correia, de 1967, descreve a situação dos índios ianomâmis, que, de acordo com ele, estavam em uma situação de miséria, subnutrição, peste, parasitose e até de extermínio por conta do abandono por parte do Estado. Ainda no relatório, a situação dos indígenas é descrita como intolerável desde, no mínimo, a década de 1940. Ou seja, este documento de 1967 caracteriza a situação dos ianomâmi de forma muito semelhante à atual. Nada indica que a situação desses índios melhorou depois disso, mas mesmo assim, se Davi Kopenawa de fato morou nessa comunidade, ele teria ouvido histórias dos mais antigos sobre a fome e a miséria que viviam. Ele também, como suposta liderança indígena de projeção nacional, deveria saber que existe fome em várias outras aldeias, como o caso dos guarani no Mato Grosso do Sul.

Ele mesmo se contradiz na entrevista que deu à Folha de S.Paulo: “Foram anos de muita luta, uma luta muito dura, junto com os outros povos do Brasil. Saí do meu país, fui à ONU para conseguir apoio, enquanto meus parentes estavam adoecendo com malária, gripe e [outras] doenças que os invasores levaram. Em 1992, nós conseguimos [a demarcação da terra]. Mas agora estamos aqui de novo, em luta de novo, em uma situação muito difícil. Mas vamos conseguir, outra vez, salvar o povo e o território ianomâmi”. A causa da fome atualmente de acordo com essa tese é a situação de epidemia causada pela infecção de mercúrio, mas ele mesmo afirma que existia uma epidemia trazida pelos “invasores”. A verdade é que a situação marginalizada dos indígenas os deixa sempre à mercê desses problemas que caso ganhem uma proporção grande acarretam em outros problemas como a insuficiência de alimentos.

Kopenawa também tenta jogar a culpa toda da crise no ex-presidente fascista Jair Bolsonaro: “O governo que ficou quatro anos foi contra minha terra, meu povo. Deixou isso acontecer. O garimpo não estava sozinho, ele estava junto com as autoridades”. De fato o ex-presidente é um dos grandes responsáveis por ser conivente com os ataques aos indígenas, contudo todos os governos da direita sempre tiveram essa política. Até mesmo os governos do PT, apesar de não atacar os índios da mesma forma, não promoveram políticas bem determinadas para tirá-los de sua situação. Algo que foi muito importante nos governos petistas foi o programa “Mais Médicos”, que cobria a região amazônica como nunca antes, pois a falta de saúde pública de qualidade é um dos problema crônicos dos índios.

Está claro que a direita está fazendo uma campanha contra o garimpo em conjunto à campanha geral de desmatamento zero da Amazônia se utilizando da calamidade dos ianomâmis. Isso é evidente pois nenhuma política real é defendida para solucionar o seu problema e o de todos os índios do Brasil, existe apenas a defesa do assistencialismo e uma demagogia com a ancestralidade indígena. Em todo o planeta as populações de zona rural estão sujeitas a crises de fome caso não tenham um desenvolvimento econômico e um sistema de saúde público de qualidade. Seja no Brasil e na Europa do século XV, seja no Brasil, na América Latina e na África atualmente, a pobreza rural é onde se concentram as crises de fome.

No atual caso dos ianomâmis, o gatilho teria sido a poluição de mercúrio criada pelo garimpo, mas em outros locais podem ser geadas, gafanhotos, latifundiários que impedem o cultivo das terras, etc. Tudo isso é fruto da extrema pobreza dessas regiões, as zonas rurais dos países ricos até antes da atual crise já haviam resolvido o problema da fome e das doenças de fácil tratamento. Não é só porque os índios têm uma cultura própria que eles não poderiam ter um desenvolvimento tecnológico na agricultura e na pesca, silos e refrigeradores para armazenar alimentos, estradas para facilitar a chegada de recursos externos etc. Essa política de deixar os índios na miséria também faz parte da política neoliberal geral de não investir um centavo na população pobre.

Davi Kopenawa, como indicado acima, é ligado ao imperialismo, tem uma ONG com relações com a Fundação Ford, é propagandeado pela Folha de S.Paulo, publicou livros em editoras francesas e expressa a política imperialista para (ou melhor, contra) os índios. Ele, portanto, é um índio neoliberal. Faz demagogia com a questão indígena por ser um ianomâmi, mas na prática sua política é contra os ianomâmis, em defesa dos interesses da burguesia expostos pela grande imprensa. Ele também não apresenta uma política para solucionar o problema do garimpo. A própria Folha afirmou que as tropas do exército são subornadas visto que a região está cheia de ouro. É preciso uma proposta séria para solucionar essa crise e não é a tentativa de repressão aos garimpeiros que resolverá a questão.

O primeiro ponto e o mais crucial é que os índios têm armamento moderno para proteger as suas terras dos invasores, “combater” armas de fogo com arcos e flechas foi o que permitiu desde o princípio que as suas terras fossem invadidas. Para além disso é necessário colocar o garimpo sob o seu controle para que eles possam impedir a poluição de mercúrio, fazer a defesa das minas, que sempre serão um motivo para invasão, e também gerar uma renda para que possam comercializar o que desejaram com o resto da sociedade brasileira. Mesmo que a culpa atual da calamidade atual seja reduzida apenas ao garimpo sem apresentar uma pauta séria para resolver o problema, a suposta liderança indígena não está defendendo os ianomâmi, e portanto deve estar defendendo interesses obscuros, talvez de grandes mineradoras ou latifundiários.

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