Como amplamente alertado neste Diário, o teatro encenado pelo judiciário após a invasão da Praça dos Três Poderes não atingiu os principais responsáveis pela mobilização ocorrida no dia 8 de janeiro. É público e notório que o alto-comando militar esteve envolvido até o pescoço, tanto na agitação da militância bolsonarista quanto no facilitamento do acesso aos prédios públicos e na retirada dos figurões quando a coisa escalou demais. Para disfarçar, o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou o afastamento do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, para delírio de setores emocionados da esquerda. Agora, depois que a poeira baixou, o mesmo ministro determinou o retorno de Ibaneis às atividades.
Na ocasião, Moraes argumentou que “a escalada violenta dos atos criminosos resultou na invasão dos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, com depredação do patrimônio público, conforme amplamente noticiado pela imprensa nacional, circunstâncias que somente poderiam ocorrer com a anuência, e até participação efetiva, das autoridades competentes pela segurança pública e inteligência, uma vez que a organização das supostas manifestações era fato notório e sabido, que foi divulgado pela mídia brasileira”. Na ocasião, apontamos que era mero jogo de cena, pois Ibaneis não era uma peça chave no caso, ao contrário do alto-comando militar. O recuo de Moraes mostra que o governador do DF foi apenas usado temporariamente para saciar a sanha repressora da esquerda pequeno-burguesa.
O prazo inicial do afastamento seria de 90 dias, o que manteria o governador afastado até o meio de abril. Pouco mais de dois meses após a decisão, o ministro escreveu que “os elementos coligidos até o momento não permitem inferir que o retorno de Ibaneis Rocha ao cargo de Governador do Distrito Federal impeça o curso da colheita de provas, obstrua as investigações em andamento, coloque em risco a ordem pública ou a aplicação da lei penal”. E no melhor estilo de justiceiro de toga, Moraes mantém o acusado sob seu regime de terror: “a medida cautelar poderá, de ofício ou a pedido das partes, voltar a ser decretada, se sobrevierem razões que a justifiquem”. Ou seja, independentemente do que acontecer, se ele quiser, o afastamento pode voltar a valer. Em outras palavras, não tenho nenhuma prova contra você, mas posso te punir novamente se achar que você merece. Uma formulação que passa muito longe do mito do tal “Estado democrático de direito” que a pequena-burguesia adora exaltar.
Fica bastante claro que o STF não depende de fatos concretos para decidir o que quer que seja. E isso não é um problema do Ibaneis, que é um político da direita, um serviçal da burguesia. Esse autoritarismo, esse atropelo dos direitos democráticos, é um baita problema para a população mais pobre, os trabalhadores, para a esquerda de conjunto. Sem nem ao menos olhar feio para os chefões das Forças Armadas, o ministro taxou os manifestantes de “terroristas”, sendo ecoado pela imprensa golpista e até por parte da esquerda. Como alertamos na ocasião, os “terroristas” de sempre dentro do regime capitalista são os trabalhadores, e fortalecer esse mecanismo de repressão se voltará, sem qualquer sombra de dúvida, contra eles quando forem lutar por melhores condições de vida.
Se mesmo um bode expiatório como Ibaneis já foi inocentado, a chance de qualquer um dos grandes responsáveis ser punido pelo que ocorreu em Brasília é igual a zero. Quem deposita fé no STF e nas tais “instituições democráticas” vive de perigosas fantasias. O alto-comando militar faz o que quer e não responde a quaisquer dessas instituições.